AS NOITES TÊM SIDO LONGAS
Que momento ruim é aquele que passa rapidamente? Perguntei-me observando aquela minúscula boca se mexendo, enquanto segurava um copo com uma bebida envelhecida pelo tempo que tentei manter essa conversa. Era apenas quando eu me via preso em alguma conversa que tomava ciência do tempo passado; ou, para ser mais dramático à minha maneira: do enorme e vagaroso espaço entre o compasso que marcava os minutos.
“Vou lá fora fumar,” falei para a mulher que conversava comigo.
Embora eu sequer fumasse, tendo em conta a abominação por devido vício, já não conseguia mais suportar aquelas palavras vazias que via saindo de sua boca. E a junção de todo aquele barulho; a voz da pessoa com todas as outras e a música alta, uma terrível MPB, estavam me dando vontade de vomitar. Tive que sair para tomar um ar. E agora, observando as estrelas, notei a ironia de minhas palavras. A vida, se é que houve, estava longe de minhas mãos e de minha garganta; pois a voz eu prendia até, pelo menos, oito horas da manhã toda segunda-feira. A companhia da lua me deu essa inexplicável e imensa vontade de falar. Mas não dizer qualquer coisa, e sim gritar todas as minhas dores desde o parto; o trágico momento que abri meus olhos a este cenário de dementes. Eu quis confessar todos os meus pecados à mediocridade de quem pudesse me ouvir. Os cães poderiam latir, os gatos sairiam correndo com o susto, e os motoboys tampouco me dariam atenção. Os vizinhos, bom, esses certamente me xingariam; como se já não estivessem fazendo isso. Devido aos ossos do sentimento que guardo a sete chaves dentro de mim, eu sofreria demais no dia seguinte, na semana seguinte, no ano seguinte, se não fizesse aquilo que meu coração tanto mandava.
“Calma,” tive que falar comigo mesmo.
E menti, como em todas as vezes anteriores.
Como eu poderia fazer isso? Passei quarenta anos tentando medir o risco de todas as minhas decisões. Deixando as escolhas mais interessantes de segundo plano. Quantas vidas eu guardei nos campos da imaginação? Quantas vezes fui levado a cenários completamente diferentes da minha vida atual em meus sonhos? Até aqui, um glorioso momento na sacada deste quarto que eu contava as horas para ir embora, eu aguentei todo adjetivo humilhante a respeito de minha pessoa. E sem sequer dar um único e insatisfeito grito.
Olhei para baixo, para aquela quantidade absurda de luzes em meio a chuva que caía.
Respirei fundo.
Desci meu olhar de novo.
E respirei fundo outra vez.
Então, finalmente, notei a chuva em minha pele.
Eu conseguia ver o brilho do nervosismo nos olhos das pessoas. E talvez fosse por isso que eu sempre deixei ditarem o ritmo da conversa. Vamos conversar sobre o que você gosta de ouvir nos momentos de solidão. Quais são as músicas que você gosta de escutar, mas não conta pra ninguém? Qual foi o último filme que você assistiu e sentiu vontade de mudar as decisões do protagonista? Se você descesse um ponto no meio do caminho pra casa, quanto tempo andaria pra caso pegasse o ônibus seguinte? Em que momento de sua vida você se sentiu tão conformado ao ponto de perder a curiosidade em experimentar um sabor diferente de sorvete? Por que você não se sente confortável em falar sobre os pontos negativos do seu autor favorito? Que mundo é esse, que você vive, em que tudo precisa ser minimamente perfeito? Infelizmente, não consigo aceitar a exata perfeição de todo ar que entra em meus pulmões. Alguma coisa precisa estar estragada. Alguma coisa precisa mexer, bagunçar meu sistema imunológico, minha cabeça. Algum acontecimento. Que seja um pesadelo tão pesado ao ponto de me despertar uma hora antes do relógio ou meu cachorro idoso tossindo às quatro da tarde em pleno verão. Pode ser que hoje o gás acabe e eu tenha que fazer alguma dívida, como também um vizinho possa acabar escorregando enquanto pula a grade de uma casa abandonada e rasgue o pescoço e sua mãe grite meu nome desesperadamente procurando ajuda.
“Merda,” eu disse baixinho, para apenas meu eu interior. E sorri, como todas as vezes anteriores.
Merda, eu continuo sorrindo debaixo da chuva.