Ponto a Ponto, Verso a Verso
Numa tarde qualquer, daquelas que o sol só aparece depois de um banho de nuvens, ela se senta no velho sofá, agulha em uma mão, linha na outra. A trama vai surgindo ponto a ponto, como uma poesia silenciosa entrelaçada pelos dedos.
O crochê, quem diria, é poesia que se faz sem pressa, e cada ponto é uma palavra. Ali, enquanto o fio se desenrola, o tempo parece se ajeitar ao ritmo dos sonhos e das lembranças, num vai-e-vem de pensamentos que aquecem o coração.
E como quem declama versos ao vento, os dedos dela ganham vida própria, criando flores de linha, bordando estrelas de algodão. Entre um ponto baixo e um ponto alto, surgem as rimas, escondidas entre as voltas da linha e o som leve do “click” da agulha. É a dança do silêncio, a poesia das mãos, que sussurra segredos de quem já viu a vida de todos os lados.
E o poema, que ali se esconde, vai tomando forma até virar uma peça final, delicada e única, como toda boa poesia. Ponto e verso, linha e estrofe, arte e alma.
Helena Bernardes
05 nov 2024