Sou estradeira e o pó da estrada

Setenta anos. Há centenas de horas venho percorrendo a estrada da vida;

paisagens urbanas e rurais,

acompanhada e muitas vezes carregando o fardo sozinha.

Na bagagem, dezenas de sonhos realizados ou pendentes. Uma batalha para atingir o objetivo, os desafios e a superação das etapas vencidas ou vencedoras.

Assim somos nós, seres humanos. Assim tenho sido eu. Por mais que saibamos escolher as estradas, pegamos atalhos que nos impedem de seguir adiante. Quisera saber qual o caminho mais suave! Nessa caminhada, amei e fui amada. Desiludi e fui desiludida. Errei tentando acertar.

Sou estradeira. Não posso parar, apesar da idade. Hei de colher ainda o perdão daqueles que se sentiram magoados por minha atitude. Hei de colher ainda os frutos das sementes lançadas em solo fértil. Hei de colher ainda os resquícios de uma vida inteira dedicada ao próximo e à família. Hei de colher ainda a oração de um coração compadecido igual ao meu. Hei de encontrar-me com a fé e a paz procuradas.

Sou viajante do tempo. Quero carregar no embornal somente aquilo que me torna uma pessoa melhor; meu tempo de caminhada já se avizinha do final. Quero ir distribuindo ao longo da estrada as últimas colheitas guardadas para saciar a fome e a carência de alimento físico e espiritual aos necessitados.

Espero receber a graça de terminar minha romaria com saldo positivo e com o corpo e mente aliviados pelo peso deixado na expiação de minhas faltas.

Sei que ao final me restará somente o pó da estrada. Serei leve e vou pousar em campo distante. Sem cheiro, sem cor, sem peso. Apenas pó, livre!

Estela Maria de Oliveira

26/10/2024

Estela Maria de Oliveira
Enviado por Estela Maria de Oliveira em 26/10/2024
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