O rei sob o cajueiro
Toda tarde, eu me abrigava na sombra, debaixo do velho cajueiro. Com um frágil graveto, rabiscava frases soltas na areia fina que circundava seu tronco. As palavras nasciam e morriam ali, sob meus pés descalços, como uma dança efêmera entre criação e esquecimento. Eu era rei de um reino sem sentido, senhor de frases que o vento logo apagaria.
Mas toda realeza tem seu preço. Assim como as palavras se desfaziam, também meus pés, outrora livres, traziam de volta algo que se recusava a partir. No lugar do graveto apagador, um pontinho preto se instalava. O 'bichinho de pé' encontrava morada, lembrando-me que até a liberdade de um rei tem suas pegadas a carregar.