Só ele.
Numa tarde ao ar livre, caminhava e observava o céu que me cercava e as pessoas ao meu redor. Contemplava o lago e as plantas. Avistava um jogo de futebol, um grupo de amigos, um conjunto de crianças interagindo entre si, uma família servindo-se do tempo em alienação dos problemas cotidianos, casais flertando e rapazes e moças vadiando. Optei, primeiro, por seguir o sentido horário do passeio; via ovelhas peregrinando pela direção oposta à minha; elas percorriam e paravam para se alimentar das relvas, bem perto da lagoa. Conheci o dono delas há alguns anos, e ele nunca demonstrou receio de que um jacaré pudesse atacá-las, nem de que seus cavalos estivessem em perigo. Escorei-me na grade para vê-las melhor; notava os seus olhos baixos. Ao fixar o olhar, percebi que suas pupilas eram retangulares; aparentavam ser mansas.
Depois de encará-las, segui o percurso pela calçada dupla: de um lado, as pessoas podiam caminhar; do outro, as bicicletas transitavam. O que me intrigava era que os ciclistas sabiam dessa divisão e, ainda assim, preferiam pedalar pela vereda dos pedestres para depois desviar para o caminho correto e voltar à parte dos andantes novamente; acho que eles se sentem sós do lado certo ou, então, gostam de ter as pessoas como barreiras a esquivar. Mudei de ideia e escolhi prosseguir no caminho anti-horário. Avancei até o ponto de partida anterior, vendo as mesmas pessoas. Fui em direção à nova arena construída, um espaço mais amplo e regular onde as pessoas podem vender e as crianças se divertirem. Havia muita gente. Passei por uma caminhonete onde eram vendidos pastéis e por um casal de jovens: a moça estava sentada de pernas cruzadas no banco; seu cabelo era longo, liso e castanho. Ela falava em um tom mais alto para o outro lado, chamando a atenção do parceiro, que estava com o filho deles — um menino de um ou dois anos, com cabelo cacheado e loiro. Riam e apreciavam o momento em família.
Adiantei o passo, e o som da música ficou mais evidente: dois homens sentados em um banco, com uma caixa de som tocando reggae, bebendo cerveja e mirando o pôr do sol e o céu alaranjado. Mas, antes disso, identifiquei um rapaz, um jovem na faixa dos vinte anos, talvez. Ele era pardo, tinha cabelos cacheados e escuros, usava óculos redondos e estava sério, fixando o olhar no céu, apenas, e nada mais. Segui o caminho, cheguei à arena e observei a movimentação. A batida de reggae ficou mais distante e, naquele momento, ouvia a intercalação de vozes de teor indecifrável; gritos alegres de tamanha ingenuidade; observava olhares estranhos, furtivos, indecentes, vagos, quentes e frios.
Voltei ao caminho em direção à música; meu trajeto quase se encerrava. Notei o mesmo jovem ainda a contemplar o céu e o lago em silêncio; parecia não estar acompanhado; estava sozinho. Fui para o carro e sentei no banco de trás. Minha família e eu ficamos ali a admirar o firmamento, assim como o jovem que identifiquei. Distrai-me por um instante; tinha até esquecido dele ao observar os transeuntes. Observei-o de novo, bem de longe; estava só, apenas ele. Devia estar olhando para o céu ou então reparando nas pessoas que passavam por ele; não dava para saber. Depois, perdi-o de vista, mas rapidamente avistei-o andando sobre o alto relevo em grama em direção ao passeio que circunda o local. Andou um pouco mais; pensei que ia atravessar a rua, mas não. Saiu da calçada, deu a volta no carro para ir ao banco do motorista, entrou, ligou o carro e ficou um tempo lá com o motor ligado, sem engatar a marcha. Pensei na possibilidade de ele ainda estar mirando o céu e a agitação. Por fim, moveu o carro e seguiu pela estrada, só.