O Dia da Árvore

#Memorial Recantista# [4] Aécio Flávio#

 

O calendário a mim diz:

-Escritor, hoje é o Dia da Árvore! Você não vai homenageá-la com um belo poema! – dissera-me ao mesmo tempo em que a mim questionava!

 

Abro a minha janela na frenética luta de busca a uma árvore para inspirar-me. Árvores não havia, fumaça, sim! Sinto os meus olhos arderem forçando as foças lacrimais a trabalharem para lavá-los da fuligem que, pela aberta janela, penetravam na minha sala. Fecho-a e vou até à mesa do meu computador, onde me assento.

 

Pela vidraça, vejo todas as desgraças causadas pela Apocalíptica Besta Humana que de humanidade nada tem. No céu não há nuvens das sonhadas e esperadas chuvas que viessem minorar a sanha assassina dos pirotécnicos de plantão que – por serem possuidores de uma muar mente – estão incendiando as florestas ou o que delas restaram.

 

As lágrimas que, agora, despencavam dos meus olhos trazendo-me até a boca o seu salgado sabor, eram de revolta por ver que o Brasil está em chamas, que o mundo em chamas está, mas – e mesmo assim – a Besta do Apocalipse não para para pensar (A propósito, seria pedir muito à besta para que pensasse um pouco. Não há nada dentro daquela caixa craniana.) que ao incendiar uma árvore sequer, ele está se suicidando porque quando árvores não mais restarem, ele e toda a humanidade já deixara de, há muito, existir!

 

Em minhas elucubrações, imagino-me conversando com uma árvore, filha única que restara. Dela ouço os seus lamentos:

-Não consigo entender a humanidade. Eu – que a ela dei tudo de mim – não merecia um tão triste fim. A ela ofereci de bom grado a minha fresca sombra, para que pudesse sob ela refestelar-se. A ela ofereci os meus saborosos frutos dos quais ela deles degustava e o puro oxigênio, que é a essência da vida para ela e todos os demais seres que pululam neste planeta doente.

 

O que mais dói em mim é ver que o machado que mortalmente a mim fere, tem um cabo de madeira. Tenho um dó do machado – não o culpo, mas não posso ter o mesmo sentimento pela besta humanidade que o manuseia. Ela para... está cansada. Tenta refazer-se, a custo consegue e volta a relatar:

O que estão fazendo comigo é o mesmo que fizeram com o Filho do nosso Criador ao assassiná-Lo fria e covardemente! Sem nada poder fazer por Ele – o assassinado – ofereci o madeiro no qual fora imolado, antes de retornar ao Pai!

 

Há inúmeros Pilatos lavando as sujas mãos como se culpa não têm pelo o que, comigo, estão fazendo. A ganância impera na ávida ilusão do mais ter que ser. Produzem com a minha morte imensas fortunas que, para a humanidade, de nada servirá. Comem-se as frutas que produzo, mas não se come o dinheiro que a minha morte trará. O dinheiro, para os sábios, não é respirável como o oxigênio que ofereço, mas para os avaros, o dinheiro é tudo!

 

Sinto pena – um verdadeiro dó – por ver os inocentes animais que tinham em mim o seu habitat que, ora, fora destroçado pela Apocalíptica Besta que se julga ser um humano ser – não é! Os ninhos que havia em minha copa foram devorados pelas chamas. Os animais – inocentes animais – estão tentando fugir, mas... fugir para onde se para donde ir não há! No Pantanal, onde as águas abundavam, os peixes estão morrendo no lodaçal: água não há mais!

 

Calado ouço-a! Sinto-me como um Pilatos fosse – e sou – por nada poder fazer. Sussurrei buscando ouvir novos sussurros em defesa das moribundas e desprotegidas árvores – do meio ambiente em si! Outros sussurros não consegui ouvir, porque não existiram. Pensei que dos meus sussurros pudesse surgir unzinho grito que, somado, causaria um furor ao estourar os tímpanos dos irresponsáveis homens, mandatários da nação brasileira e de todas as demais nações deste nosso (?) moribundo mundo, que arde em chamas clamando por socorro! Enquanto por socorro o mundo chama, a chama arde matando o mundo!

A árvore de mim se despede não sem antes – dando um vingativo sorriso – a mim dizer:

-Em meu canto do cisne doarei as tábuas que servirá de caixão mortuário para a Besta Apocalíptica!

Ria a árvore, ria eu, ressorríamos nós!

 

Epílogo:

 

Hoje deveríamos estar comemorando o Dia da Árvore, mas – e pelo óbvio motivo da inexistência da homenageada – a todos ouso pedir Um Minuto de um Triste Silêncio. Então – e parodiando Drummond – digo que árvores não há mais, José! E agora? E agora, nós Josés? E agora omissos Pilatos? E agora? (...)

 

Perdão lhe peço amiga Árvore por não poder lhe homenagear. As chamas que deveriam estar devorando as velas comemorativas ao seu dia, estão – sem dó e sem piedade – devorando-a!

 

Os clarins estão entoando o Toque de Silêncio. Silente ouço-o! Esta é a minha homenagem a você neste que deveria ser um Feliz Dia da Árvore!

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Imagem: Google

Altamiro Fernandes da Cruz
Enviado por Altamiro Fernandes da Cruz em 22/09/2024
Reeditado em 22/09/2024
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