UM PÁSSARO EM MINHA JANELA.

Um pássaro pousou em minha janela.

Quisera eu ter a paz e a tranquilidade da pequena ave que pousou em minha janela na tarde desta bela sexta-feira. Quisera eu ter as suas asas e voar livremente pelo imenso azul celeste, entre fogosas nuvens, brincar alegremente, ver o mundo lá de cima, ter a liberdade brincando com o vento em minhas asas. No entanto, é dolorida a realidade em que percebo não ser tal como o pássaro, de não ter asas, de nunca ter sonhos, de nunca poder voar, de não ser livre. Talvez a imaginação me crie asas, ainda que essas, antes mesmo da existência tenham sido cortadas pelos homens, ainda que sejam as asas de Ícaro.

Um pássaro pousou em minha janela.

Quisera eu ser esse pássaro de penas reluzentes, com o bico afinado, cantando suave e harmonioso — eu não sou este pássaro, pelo contrário, eu sou o poeta da melancolia e tristeza, bêbado de solidão no meio da multidão, desajeitado com as palavras, tropeçando vez ou outra aqui e ali em alguma desavisada rima que passa, acenando de uma janela triste. A liberdade que eu sonhei, imaginei, voou nas asas do pássaro que estava preso na minha imaginação, estava preso... Agora não mais.

Um pássaro pousou em minha janela.

Outro dia veio em minha janela esse pássaro diferente de todos os outros que já pousou por outras vezes. Esse tinha as asas coloridas, mais longas, com o bico também alongado. Contudo, a sua canção parecia a viva entonação de meus versos tristes e melancólicos. Não consegui determinar que ave era aquela, nem entender a sonoridade quase fúnebre de seu canto. Sei que ela causou-me grande admiração, medo e espanto. Uma vez mais faço-me repetir… Quisera eu ser aquela ave, ou qualquer outra a propósito, conquanto que eu tenha asas e possa voar, que tenha a liberdade novamente. Liberdade essa roubada por mercenários do pensamento, da ideologia de que não teremos nada e seremos felizes... Eu não sou esse pássaro, talvez no passado eu tenha sido, porém, até mesmo as lembranças do meu passado foram roubadas de mim.

Um pássaro pousou em minha janela.

Quisera eu poder ser todos os pássaros do mundo, pelo menos um de cada nação

— que fosse apenas um dia — e ter a mais bela canção, ainda que não lírica. Quisera eu ser esses pássaros todos e ganhar todas as nuvens e todas as liberdades em cada céu de cada lugar, e poder voar sempre mais alto possível até quase desmaiar, e ter a liberdade e a solidão entre minhas asas.

Quisera eu…

Ser apenas uma vez na vida, um pássaro qualquer. Entretanto, me oferecem as asas de Ícaro e um céu terrivelmente ensolarado, me vendem a ideia de que eu posso sim voar perto do sol, que o mito de Ícaro é uma ilusão, afinal, não existem perigos. Os mercenários do pensamento plantam nas mentes essas e outras ideologias mentirosas. Não sou um pássaro, aliás, não somos pássaros, a única certeza de que tenho é a de estar preso numa gaiola, suspensa no mundo, a porta está aberta, ao lado, ( as asas de Ícaro ). A falsa sensação de liberdade chamando do lado de fora.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 08/09/2024
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