A Fila do Banco
Vinícius estava na fila do banco há duas horas. “É um recorde”, pensou. Estava cansado e com sono em meio a monotonia bancária a qual se submetia. A burocracia do lugar o entediava, mais que a rotina do escritório. De repente, o som de vozes acaloradas o fez levantar a cabeça para prestar atenção. Ali na fila, um lugar onde a paciência é posta à prova e as mais diversas personalidades se encontram, dois indivíduos estavam em um duelo verbal digno de um ringue de boxe. De um lado, Carlos, um jovem empreendedor, camisa social impecável e relógio reluzente, vivia o mantra "tempo é dinheiro". Do outro, Maria, uma funcionária CLT aposentada, com a expressão carregada de desilusão, trazia consigo a convicção de que o sistema sempre se aproveitava dos mais simples. A discussão começou com um simples comentário de Carlos sobre a importância de investir o tempo de forma produtiva. “A vida é curta demais para desperdiçá-la em filas”, declarou ele, consultando seu relógio de pulso a cada instante.
Maria, porém, não se intimidou. “Ah, é? E o que você faz com todo esse dinheiro que você ganha? Mora em uma ilha paradisíaca? Não me faça rir! O sistema é feito para uns poucos se enriquecerem às custas do trabalho de muitos”, rebateu ela, com a voz carregada de ressentimento. Carlos, visivelmente irritado, retrucou: “Minha senhora, o mercado é livre! Quem trabalha duro, consegue progredir. O problema é que as pessoas não querem mais se esforçar”. Maria, com um sorriso irônico, respondeu: “É claro, a culpa é sempre nossa, né? Se você nasceu em uma família rica, é claro que vai ter mais oportunidades. Mas e quem nasceu em um berço de palha? Vai ficar eternamente à margem?”. A discussão se acalorou cada vez mais, com os dois defendendo suas posições com fervor. Carlos, o capitalista convicto, acreditava que o sucesso era fruto do esforço individual e que a pobreza era resultado da falta de iniciativa. Maria, por sua vez, via o mundo como um lugar injusto, onde os ricos exploravam os pobres e os poderosos oprimiam os fracos. Ao final da fila, ambos se despediram com um aceno de cabeça, cada um mais convencido de sua própria verdade. Carlos, para si mesmo, pensou: “Essa mulher é uma alienada. Não entende nada de economia”. Maria, por sua vez, suspirou e murmurou: “Mais um alienado que acredita no conto de fadas do capitalismo”. Enquanto isso, Vinícius, que estava ainda mais cansado após tanta discussão à toa, sussurrou para si mesmo: “Que ridículo”.
A fila do banco, naquele dia, havia se transformado em um microcosmo da sociedade, onde as diferentes visões de mundo colidiam de forma irônica e, ao mesmo tempo, trágica. Na opinião de Vinícius, ninguém estava certo. Nem Carlos, com sua fé inabalável no sistema, tampouco Maria, com seu profundo desencanto pelo mundo. “Talvez a resposta esteja em algum lugar no meio, em uma complexa teia de fatores sociais, econômicos e históricos que moldam nossas vidas”, pensou em voz alta, enquanto chegava em casa. As horas de fila e a discussão que escutou, enquanto julgava toda a conversa como uma perda de tempo, cansou Vinícius de tal maneira, que ele queria dormir por 12 horas. Cíntia, sua esposa, se preparava para o trabalho. Era início da tarde e ele queria aproveitar o resto do dia para descanso, quando escutou a mulher dizer: “Preciso que cuide do Bernardo, a babá vai demorar, está esperando a mãe chegar do banco, disse que ela discutiu com um cara na fila e perdeu o ônibus”. “Que ótimo”, murmurou Vinícius, ao que Cíntia retrucou: “Nem é tão ruim assim, sai com ele para algum lugar, onde ele possa gastar energia”. “OK”, pensou ele. “Vou levá-lo ao banco”.