Desperança da Castanha.
Eu amava simplesmente tudo que tinha castanha. Desde que eu me entendo como moleque encrenqueiro. Doce ou até puro mesmo. O singelo fato de sentir o odor da castanha fazia-me salivar.
Lá na minha casa, tinha um bolo delicioso com cobertura de chocolate com pedaços de castanha por cima, o meu favorito. Obviamente eu foi come-lo, já que eu estava com uma baita fome. Me deliciei por alguns bons minutos naquele bolo, mas, depois de um tempo, comecei a sentir os meus lábios incharem e arderem, parecia que apliquei ácido hialurônico de forma bem errada. Chamei minha mãe entre fortes espirros que dava. Mãe viu e estranhou, me levando pro hospital o mais rápido que conseguiu.
Chego no hospital sentindo tanta náusea, sentia quê iria desmaiar. Lá era tão claro quanto as portas do céu. A recepcionista avisou-nos que seriamos atendidos pelo doutor alergologista. Nome estranho para uma profissão estranha. Nem minha mãe tinha noção do que esse profissional fazia.
Dr. Jikan atendeu-me. Ele não fez muito suspense, já disse que eu poderia ter anafilaxia. Eu não estava entendendo nada: o nome dessa doença, o nome da profissão dele e seu nome. Eu estava tão confuso, nada mais fazia sentido na minha cabeça. Queria entender o por que eu fiquei tão mal do nada. Será que foi algo que eu comi? Fui rever meus passos para tentar a compreender a situação. Será que foi quando comi aquele delicioso bolo com cobertura de chocolate e castanhas por cima? Tinha uma suspeita em mente, talvez eu poderia ter me tornado alérgico a castanhas.
Meu mundo caiu. Como poderia algo que eu amava tanto causar-me tão mal? Algo que sempre esteve em minhas mãos, será, agora, mantido tão longe de mim? Ela fazia-me tão bem, por que agora ela quer machucar-me?
Dr. Jikan disse que era necessário fazer um exame, até que exorbitantemente caro, para que fosse confirmado essa tal alergia. Passou alguns medicamentos para diminuir minhas náuseas, inchaços, entre outros sinais e sintomas que sentia.
Parece uma espécie de amor tóxico; eu continuo querendo-a, desejando-a, amando-a, mesmo fazendo-me sentir o pior. Qual foi o pecado, qual foi o erro que cometi para merecer tamanha punição? Eu era apaixonado por castanha também... É a dor de um amor platônico. Ela usou-me e, no final, machucou-me. O que eu fiz para perder o teu bem-me-querer?
O doutor disse que não deveria comer mais nenhuma oleaginosas (castanhas, avelãs, amendoim etc) até os exames chegarem, para evitar mais problemas. Deu-me forte agulhadas que doeu até na alma e, finalmente, fui para casa. Depois de alguns dias o resultado também chegou e o que eu li era o que eu mais receava. Chorei tanto. Parece que perdi alguém. Sinto que estou de luto. Meio que perdi algo que me deixava bem. Deixava-me tão tranquilo. Como pode: eu sempre adorei comer castanha, mas eu pego a alergia e não posso nem mais entrar em contato com ela, mas pessoas que nunca nem imaginaram a sua existência podem comer, e eu não? Pessoas que não entendem sua magnitude e seu verdadeiro sabor que comem de qualquer forma, mas eu não? A vida não é justa, nem essa angústia e desperança que castanha deu a mim.