POR DENTRO DO JOGO
Sempre gostei de assistir ao bom futebol, como botafoguense convivi nas últimas décadas numa espécie de deserto técnico, o que restava era saudade de um passado rico de craques, tive a felicidade de vivenciar partidas em que o alvinegro de General Severiano só encontrava um solitário rival a altura, a equipe praiana do Santos capitaneada pelo rei do futebol.
Um ou outro clube esporadicamente conseguia formar um time competitivo, mas nunca apresentando um futebol vistoso, para isso precisava mirar a câmara para a Espanha onde os dois gigantes da terra de Cervantes, disputavam a hegemonia do centenário esporte inglês do Velho Mundo, que importava e continua a ser o sonho de consumo de todo atleta tupiniquim.
Esse ano de 2024 veio presentear não apenas os 12 torcedores que lotam a Kombi da estrela solitária, mostrando que é ainda possível formar uma equipe que preza o bom futebol. Tanto no Brasileirão, como na Libertadores da América o time tem feito apresentações memoráveis.
Não vou aqui abordar as mudanças advindas da venda de clubes para corporações internacionais, apenas falar da competência do staff que incorporou o Botafogo de Futebol e Regatas.
O foco deste passeio pelo esporte mais popular no Brasil foi provocado por três partidas que tive o privilégio de assistir. Os dois jogos do Flamengo, e o primeiro tempo do Botafogo contra a tradicional equipe uruguaia do Peñarol, dava a impressão que o anti futebol voltaria a prevalecer, e o catimbeiro time passaria literalmente aos trancos e barrancos para mais uma final da Libertadores da América com um plantel limitado, mas que a sua maneira, dificulta a vida de equipes muito mais estruturadas.
Interessante constatar que esse tipo de atuação baseada na estratégia de travar o jogo, ainda sobrevive ao sul do Equador.
Claro que arbitragem sul-americana coopera muito para isso, permitindo que performáticos atletas esqueçam que a partida é de futebol, passando a fazer saltos e rolamentos seguidos de uma sofreguidão incompatível com o choque ocorrido.
A popular cera, ou interrupções ampliadas, que começam com o goleiro que habitualmente gosta de ser focado pelas câmaras das TVs, embora com pouco tempo de ação, cria subterfúgios para atrasar ao máximo a devolução da pelota ao jogo. Como sabe que precisa estar de pé para o jogo prosseguir, se choca propositadamente com algum zagueiro e em seguida despenca no chão, e sempre que possível lá inerte permanece, esperando a entrada da equipe médica. E o cronômetro do árbitro continua a deixar o tempo escorregar pelas mãos.
Laterais, escanteios e faltas são sempre cobrados pelo jogador que estiver mais longe do fato e sem nenhuma pressa, assim os primeiros 45 minutos desceram ralo abaixo, e claro a arbitragem não incorpora as interrupções simuladas ao tempo de acréscimo.
Essa estratégia deu certo, e o time do Flamengo, com elenco muito superior, foi devidamente eliminado da competição.
No primeiro tempo do jogo com o Botafogo, a mesma estratégia funcionou a contendo, e o árbitro venezuelano atuou como mais um uruguaio, permitindo que a partida não tivesse sequência, permitindo ao Peñarol usar e abusar do anti jogo.
Fiquei apreensivo com o que assistia pela TV, começava acreditar que a estratégia uruguaia sairia vencedora desse confronto também.
Não sei o que foi conversado no vestiário, mas a equipe voltou com outro astral, enfim resolveu levar adiante o que faz muito bem, trocar passes rapidamente acompanhado por deslocamentos incisivos. Aí os gols passaram a brotar descontroladamente.
E a equipe que hoje indiscutivelmente joga o melhor futebol do país foi impiedosa, deixando a equipe uruguaia desnorteada dentro de campo.
Pronto, em 34 minutos o placar eletrônico do Engenhão mostrava números de uma goleada histórica no famoso tapetinho: Botafogo 5 x 0 Peñarol.
Semana que vem, o jogo a princípio servirá apenas para cumprir a tabela, enquanto aguarda o parceiro da final. Que a estrela solitária conduza o alvinegro para um título ainda inédito.