Lembranças de Natal
Não conheço Karine. Talvez eu nunca a encontrarei na vida. Mas o que me importa saber a cor dos seus olhos, cabelos, o que gosta de fazer, os seus sonhos de menina... Ela me apareceu por acaso. Alguém me disse que ela é uma menininha de quatro anos, alegre, bonitinha. Tem dois irmãos gêmeos, de dois anos, uma irmã de oito e outra de 11. Se for lourinha ou moreninha, não me importa. Alguém me disse que ela nunca teve uma árvore de Natal. Isso ficou em meu pensamento...
... lembrei-me que a primeira árvore de Natal que eu tive já era mocinha e devo isso à minha irmã número dois. Um dia, essa mulher guerreira pegou uma plantinha, colocou 6 bolinhas e, com elas, algumas fitinhas vermelhas e a colocou na mesinha de nossa pequena sala.
... a arvorezinha da minha irmã tinha um cheiro tão especial que eu o sinto até hoje. No dia 13 de dezembro, dia de Santa Luzia, era dia de ganhar doces. Minha irmã dizia que se eu colocasse um pratinho vazio perto da plantinha, quando eu acordasse, no dia 13, ia encontrar balinhas bem gostosas. E como as encontrei! Cada uma delas tinha um gosto maravilhoso...
...nossos pais eram pobres, mas nunca faltou sopa nas noites de frio, onde usávamos pijamas de flanela, todos do mesmo tecido. Cinco filhos, cinco pijamas! Eu gritava, da pequena cama, encolhida no meu pijama : “ Bença, Mãe, Bença, Pai” ... às vezes demorava um pouco e eu tinha que insistir, mas logo vinha a resposta – “Deus te abençoe!”.
... nossa mãe não colocava menos emoção em tudo que o nosso pequeno pai., mas dele herdei essa capacidade de olhar as pessoas por dentro, com um amor que nem sei mais o que é!
... os anos passaram e a abundância chegou em nossas vidas. Das sopas das noites frias surgiram macarronadas, frangos assados, maionese, saladas deliciosas e guaraná aos domingos. Nosso pai era um sonhador e vivia esperando a véspera de Natal, onde inventamos um tal de “Amigo X” - um ritual lindíssimo que nos acompanha há anos e anos. Antes de começarmos a trocar os presentinhos, nós nos dávamos as mãos e rezávamos pelo aniversariante, o Menino Jesus.
Nosso pai dizia as mesmas palavras : - Estamos aqui reunidos para desejar um feliz aniversário ao Menino Jesus e convido vocês a rezar um Pai-Nosso, e que Ele proteja a nossa família... e a de todos. Ele nunca se esquecia de mencionar “ a de todos”. Pena que este ano papai não estará presente, mas nós faremos o ritual, sim...
Mas, e a Karine? Comecei hoje o Natal desta menina. Tomei chuva e fui naquela loja que vende só enfeites de Natal. Comprei uma árvore de tamanho médio, um monte de bolinhas coloridas. Que sabe de mim a Karine? Nada! Mandei entregar a pequena árvore para ela, através deste amigo, com um boné de Papai Noel.
O natal ainda não chegou, Karine... nem sei onde você mora, mas tem um cantinho do meu guarda-roupas que está acolhendo uma boneca, roupinhas, sapatos, balinhas...
Meados de Novembro, 2007.
Ilustração : Praça de Santa Teresa - ES (Natal de 2006)
(Muita saudade de Nosso Pai, Primo Fiori Sancio)