É NATAL E EU...
Não poderia deixar de escrever sobre ...”era uma vez”.
É de manhã, antevéspera de Natal, quando aqui volto pelas ruas tranqüilas do entorno que me trouxe até o colégio para saber se tudo correu bem no meu desempenho letivo.
Confesso que minha euforia maior é, de novo, adquirir meus cartões natalinos, aqueles pequeninos, nos quais a gente escreve “de...para...” em minúscula cartonagem com ilustrações maravilhosas e com os quais, todos os finais de ano, presenteio meus amigos com alguns dizeres escritos por mim.
Faço a lista de todos eles e percebo que, nessa hora, como são infindáveis...os meus tantos e queridos amigos, então, deduzo que precisarei de muitos cartõezinhos.
Quando se é adolescente nenhum amigo fica de fora das nossas listas...
Sinto uma aura luminosa que não sei explicar donde vem, como uma alegria incontida sem destino certo.
Tão mágica, que peço qual “em oração” do pensamento, para que não se perca de mim esta tamanha sensação de plenitude natalina quando eu, daqui, vier a percorrer os caminhos da vida vindoura.
Plenitude...eu ainda não sei muito bem denotar o todo amplo dessa palavra.
Acabei de encontrar com a professora Gisela, a de matemática, aquela que eu tanto temia e a quem dei um trabalhão na álgebra.
Na secretaria da escola peguei meu boletim liberado: Uffa, minhas notas anuais foram todas verdes, a professora me sorriu, então, me sinto no direito de viver meu Natal conforme me foi prometido, como um presente pelo tudo de bom de ter podido aprender algo novo.
Há presentes que infinitamente são natais para sempre...
As notas são símbolos só de praxe, e, mesmo adolescente, eu já aprendi que o importante mesmo é a nota que trazemos dentro dos corações: no da gente e no das nossas gentes.
Meu pai todo dia me diz que aprender é caminhar para algum lugar melhor e eu acredito no meu pai.
Já saindo pelo portão da entrada, acabei de encontrar com o professor de literatura , que me enlaçou num abraço natalino!
Embora, insisto, seja eu adolescente, já pulso uma vontade de “brincar com as letras” e tal me foi ratificado neste ano letivo, assim que ganhei uma concurso de redação da escola promovido por ele, o professor Rivail, o de literatura geral. O tema: SER ADOLESCENTE.
Rebusquei no texto apenas para lhe informar que seria mágico se ser adolescente para sempre.
Deve ser porque a gente balança na dúvida entre continuar sendo sempre a criança (sem já o querer ser) ou assumir caminhar sozinho para aonde não sabemos. Esse tema será para toda a vida...eu já o pressinto, só não sei o porquê.
Senti que o professor gostou do e aprovou o meu sentimento literário.
Ele que é algo sisudo, e afinal, minhas letras o fizeram sorrir para mim a me mostrar que letras são tesouros de encontros de vidas, desde o primórdio delas.
Também lhe mostrei minha primeira poesia, “A VOLTA”, uma poesia cristã escrita quando perdi um amigo para o céu, ao que dele ouvi: “hum...muito bonito, não pare nunca mais”.
Lá na frente, rumo a esse tempo que ainda desconheço e que o chamam de ”nunca mais”, alguém já me avisou que eu nunca pararei de escrever: é que já entendi que escrever poesia é muito fácil simplesmente porque é só se viver a vida de coração aberto.
Então, agora já alforriada das horas preenchidas com tantos estudos, e na certeza de ter feito o meu melhor, conto meus trocados retirados do cofre do ano e entro no bazar da Angela, aquele ao lado do colégio.
Ali, um pinheirinho natural piscante e cintilante, o mesmo de sempre da minha infância escolar, me recepciona com alma de “Boa Nova’, dentre suas coloridas luzes que iluminam minúsculas bolinhas natalinas de vidro decoradas com algodão de farmácia.
Aqui a lição que nunca esquecerei: NATAL É SIMPLICIDADE DE ALMA.
Compro uma embalagem fechada de cartõezinhos “de...para...” e um conjunto daquelas canetinhas hidrográficas de doze cores, as que minha mãe houvera me prometido caso tudo corresse bem com as minhas notas. Deu certo.
Uma alegria me invade: se trata do meu presente que tão logo eu o colocarei sob a minha árvore junto aos demais, a que eu mesma farei, depois de injuriar meu irmão para que me pegue galhos secos pelas florestas da redondeza do bairro.
Ele sempre “chia” mas de pronto me obedece...e já me trouxe o galho mais alto que encontrou, claro, bem maior do que eu, e o largou lá no quintal.
Quando somos adolescentes todo entorno é maior que a gente.
Então , aqui, já estou a alguma horas a pensar numa frase de efeito: “do ...meu, para...o coração dos meus amigos”.
Depois pendurarei todos os cartõezinhos na minha árvore e os distribuirei pessoalmente um a um, como bolinhas natalinas cheias de presente ao futuro, cartões que já enxerguei pelos livros que, lá na frente, serão cartões de "natais high tech”, substituídos por cartões corporativos e tecnológicos, por mensagens frias do Whatsap, por emails protocolares, por mensagens de vozes mudas, por propagandas vazias, que não me dirão absolutamente nada deste Natal mágico que levarei comigo pela vida.
Sei que meus cartões, e para sempre, se dependurarão nas "árvores de vida" dos meus amigos.
'Para sempre" um lugar que também ainda não o conheço e que não saberia dizer se, de fato, ele existe.
Então, de antemão, já blindo meu peito "para sempre" do tudo que possa macular meu perene e legítimo Espírito de Natal.
Surge uma idéia frasal: Monto a minha frase como quem monta a vida.
"Hum, árvore da vida..."
“O Natal é um fértil terreno de cintilantes árvores de luzes, cujas raízes se nutrem apenas dos corações regados de amor”.
Letras bem pueris para este meu presente e eterno momento adolescente.
Dentre os cartões, atravesso o tempo pelas letras e, mais uma vez, já adentro a Véspera Natalina.
Subo as escadas do mezanino para a noite maior, encantada, a admirar minha pequena grande obra de Natal, a que deixei piscando lá embaixo, iluminando todas as noites do mundo.
Adormeço na opção de criança repleta de doces expectativas.
E no meu sonho aguardo, impaciente, pelo dobrar do sinos da minha “árvore da vida” que sei que me florescerá viçosa num resiliente verde esperança...
Quando desperto... É Natal!
Rezo:
Que o mundo jamais nos ceife... às nossas interiores árvores natalinas.
Nota da autora : em homenagem aos amigos e aos professores citados nessa história real.