CENA EM ESPELHO: O MEU PRESENTE DE NATAL

ERA ANTEVÉSPERA DE NATAL...

e o dia começava apressado e já marcado pela agitação dos preparativos para a linda festa que se aproximava.

Para mim seria um dia normal, eu estava no mesmo lugar de anos a esperar pelas pessoas que ali chegavam em busca de qualquer tipo de ajuda, embora fossem muitas as que não estavam ao meu alcance de resolução.

Só percebi que fazia algum tempo que ela não aparecia por lá no instante em que a vi, algo bastante abatida a despeito da idade de poucos anos passados além da sua pobre e sofrida adolescência.

Sei que ela morava e trabalhava por ali, às vezes eu descia a pirambeira de carro e a via iniciar o seu trabalho sob o escaldante sol que aquecia o asfalto que a levava à sua comunidade tão carente, logo depois que chegava esbaforida da escola.

Sempre que podíamos batíamos longos papos sobre tudo da vida, me contava dos planos, porém confesso que por vezes eu evitava saber dela algo mais que me colocasse em reflexão inconformada sobre os porquês do seu todo tão complexo.

Antes de nascer fora vítima de "falta de oxigênio" em decorrência do "cordão enrolado", contava, aquela situação que os médicos a chamam de "hipóxia perinatal" e assim, nasceu sequelada com paralisia de alguns movimentos da fala e dos pés que, todavia, nunca lhe paralisaram a vida.

Duma esperteza e força de vontade invejáveis!

Cuidava duma mãe alcoolista e duma avó debilitada pela senilidade.

Quando eu a vi ali, me aguardando tão placidamente, senti que era ela merecedora de tudo que os Natais deveriam proporcionar para sempre na vida da gente . Oxalá Papai Noel existisse e ali estivesse entre nós para que pudesse nos presentear com presentes essenciais.

Foi quando interrompeu meu pensamento a me surpreender com seu gesto que esticava em minha direção um pequeno pacotinho brilhante arrematado com um caprichado laço de cetim vermelho.

"Trouxe pra você...o meu presente de Natal..."

Recebi o pacote meio sem graça porque justamente acabara de imaginar aquela cena ao contrário.

Abri o pacote e brilhei meu par de olhos impressionados: ali encontrei um pequeno par de sapatos claros que encaixavam perfeitamente nos meus pés. Desviei o olhar para a menina que nele leu o meu curioso questionamento.

"Ganhei da dona Zefa da loja e trouxe pra você...obrigada por tudo."

Bem silenciosamente lhe arregalei meu olhar questionador.

" São bem pequenos, só servem em você, e também, não conseguiria andar de saltos, Feliz Natal".

Ali entendi que apenas o essencial nos é absolutamente imprescindível.

E depois ainda dizem que Papai Noel não existe...

***

Nota do meu "reconto", que acho que aqui já contei:

VERÍDICO