O MENINO DE MARIA
O Menino que Maria tem em seus braços não é apenas imagem de seu Filho Jesus Cristo, é também todo aquele que, por viver a nova realidade evangélica se torna como uma criança. Na mensagem de salvação, a participação do homem na realidade do Reino dos céus tem como expressa condição “receber o reino de Deus como uma criança”(Lc 18,17).
Ser cristão é ser criança, é sê-lo no mais puro sentido da palavra. Não é, no entanto, cair num grotesco infantilismo, ou ter atitudes tolas diante de situações em que se exige toda a gravidade da idade adulta, e menos ainda ter um comportamento pueril. O cristão é aquele menino que quando seu coração lhe indaga, angustiado pela fadiga ascética: “por que fazes assim comigo?, é capaz de ter coragem de responder-lhe:”Não sabes que devo ocupar-me das coisas de meu Pai?”
O cristão é aquele menino que, sem prejulgamentos nem convencionalismos, nem temor servil, se aproxima do Deus encarnado, com fé, e sentado em seus joelhos, sem ligar para suas vestes amarfanhadas, sabe que ninguém o separará do amor de Deus, nem a morte, nem os inimigos escrupulosos que o interpelem: “não incomodes o Mestre”.
O cristão é aquele homem que voltou a entrar no seio de sua mãe – a inocência original – e tornou a nascer como um homem novo.
Quando nasce um cristão pode-se dizer: “um menino nos nasceu, um filho nos foi dado” e até com insólita audácia pode-se dizer: “se chamará Emmanuel, que significa Deus conosco”, porque o cristão é aquele menino que se deixa conduzir pelo cajado e pelo bordão de Deus com a mesma confiança com que um menino se atira nos braços de sua mãe e em paz fica em seu colo, como essa infinidade de imagens que conhecemos do Menino nos braços de Maria, e que sendo Ele “Aquele que É”, pode ser também qualquer um que queira como Ele – e como o cristão quer também – aparecer ante os homens nos braços de sua Mãe celestial, a Mãe de todos os homens, que, como ao seu menino, esse Menino Divino, carrega-o nos braços conduzindo sua vida a um destino eterno.
Jesus Cristo é o menino por antonomásia; é o eterno nascente, o eterno engendrado, o eterno rebento que o Pai se alegra em criar de Si. E o cristão que pelo batismo consagrou sua vida em transformar-se “de claridade em claridade” na imagem de Deus pela contemplação de amor, e porque o amor torna iguais aqueles que se amam, se converte nesse fragmento de eternidade temporalizada que é a carne purificada e transcendida de divindade pelos votos de castidade, pobreza e obediência, que fazem dele imagem do Cristo pobre, obediente e casto. O cristão é um menino em permanente primavera do Espírito, que não permite vislumbrar o passar do tempo e da idade.
O “Menino-cristão” é conhecido pelo sorriso, esse sorriso que só é possível aflorar nos lábios de uma criança pura, limpa de tudo o que não seja amor puro, desinteresse, sinceridade e que, no entanto, tantas vezes aparece marcado por rugas, o que torna ainda mais paradoxal o seu aspecto.
O mistério da infância é paralelo ao mistério do cristão (não o monge encapuzado, novelesco, oculto entre vetustos ciprestes ou escondido em inacessíveis coros), mas sim o mistério do homem que foi capaz de arrancar do seu corpo as vestes do homem velho, para converter-se num homem novo, nova criatura. Criatura, menino recém-nascido: “e Deus viu que era bom”. Menino eterno, menino que faz da sua trajetória por este mundo uma projeção da infância eterna que é um mistério mais insondável ainda, que se vive no seio do eterno Logos ( Verbo) a Palavra de Deus, que se encarnou e que como um menino, chorou. 
 
                                               Fr. Luís Maria Merton, Monge Cisterciense
                                                                         Traduzido by Amorinn
                                               Vie Consacrée – La Pierre-qui-Vire 2011