Sem Árvore
No Natal da minha infância não tinha uma árvore cintilante, carregada de luzinhas-que-piscam, atraentes e frágeis bolinhas coloridas, sininhos de fino cristal, estrelinhas, algodão servindo de neve e demais enfeites...
Mas tinha a alegre bagunça que fazíamos na cozinha, para desespero da minha mãe, no seu esforço e carinho para produzir, mais saborosas que nunca, as rabanadas, as orelhas de abade, a aletria doce, o inesquecivelmente delicioso leite-creme! Quebrávamos e comíamos nozes e amêndoas e, atrevidos, ousávamos enfiar os dedinhos nas tijelinhas onde estavam já cortadas as frutas cristalizadas para o bolo-rei! Ah! Como eu adorava o nosso Natal sem árvore!
Enfim, chegada a noite e a hora da consoada, com todas aquelas incríveis e coloridas gostosuras ali expostas ao regalo dos nossos olhinhos e apetite, não tardava porém muito tempo para que os efeitos da intensa movimentação do dia aflorassem com aquela soneira irresistível à mesa! Meu pai então mandava que vestíssemos os pijamas, escovássemos os dentes e colocássemos, muito alinhadinhos, nossos sapatinhos sobre o fogão, bem no meio da chaminé, para que o Pai Natal pudesse vê-los...
“Acorda, maninha! Acorda, que já é de dia!”, chamava eu em voz sussurrada, enquanto abanava a minha irmã! Ainda ensonada, ela me seguia descendo as escadas até à porta da cozinha, de onde espreitávamos ainda receosos, até confirmar-mos que sim! Pai Natal não nos esqueceu e lá estavam um reluzente automóvel de corda vermelho, um caminhãozinho de madeira, uma boneca grande e linda com cabêlo e uma mobilinha!
As recordações do Natal da minha infância não incluem a árvore, mas contêm a mais pura alegria, doçaria de montão e muito, muito amor no coração...