FALA O DIABO - XXV
Bem, resolvi sair da caverna, após meses de desânimo e de alguns e-mails carinhosos de leitores. O fiz apenas para expressar meu desprezo com o “espírito do fim de ano”, de modo geral, e especificamente com o espírito do Natal. Na realidade, pensava em escrever outra coisa, um conto talvez, mas quando acessei a página do Recanto e me deparei com um “Feliz Natal”, uma raiva súbita me veio à mente. Vamos lá. Serei breve.
Eis o que penso do Natal: uma farsa superficial e fajuta, acompanhada de uma alegria forçada nos lábios, de votos insinceros de felicidade, de desejos tolos de aconchego e diversão.
É curioso que apenas no fim do ano as pessoas se lembrem dos pobres e necessitados, das crianças que passam fome todos os dias, dos pais que não têm a mínima condição de alimentar decentemente seus filhos, ainda mais de comprar os presentes propagandeados pela mídia.
Apenas um pouco de senso crítico seria necessário para desprezar essa mídia, que, ao mesmo tempo em que volta o olhar para estes carentes, lança a sua campanha ao Papai Noel e ao consumismo, e às festas suntuosas que sempre têm lugar nesta época do ano.
Não posso suportar o barulho das palavras de pessoas com quem não tenho o mínimo contato, me desejando muita paz, alegria, amor etc. Não consigo conceber como o coração humano seja tão hipócrita a ponto de dizer “Feliz Natal” pra uma criancinha que se alimenta apenas de arroz na imensa maioria de seus dias, sendo que não a considera no decorrer do ano.
Isso me entristece. E muito. É como a campanha que se fez aos desabrigados pelas enchentes em Santa Catarina: vamos ajudá-los, vamos ter um espírito de caridade! E como ficam os flagelados todos os anos pela seca no Nordeste? Deles ninguém se lembra! Como é possível?
O espírito do Natal é muito mesquinho. Acredito que a grande maioria das pessoas só faça estes gestos de “caridade” para se livrar de todos os pecados que cometeram no ano todo, apenas para ficar com a consciência tranqüila. Pensando desta forma, se chega à conclusão que não se importa, realmente, de ajudar os pobres; não se trata deles. Trata-se, isto sim, de um coletivo que se sente pequeno e avaro, com a consciência pesada, e utiliza-se dos menos favorecidos para se “purificar”. E isto, definitivamente, é demasiadamente... demasiadamente... Não consigo pensar em outra palavra que não seja “escroto”!
Fico por aqui. Minha tristeza e raiva me impedem de escrever mais. E eu nem disse nada sobre o hipócrita espírito cristão...