Cordel de Adauto Paiva
Falo sobre Adauto Paiva
No poema popular
Com mais profundo respeito
Passo a historiar
O passado de Mari
E as lendas do lugar
Adauto Paiva nasceu
Em um dia seis de julho
No ano de trinta e oito
Chegou sem fazer barulho
Sua vida especial
Neste cordel eu debulho
Todos falam com orgulho
Deste nobre conterrâneo
Dono de grande talento
E carisma espontâneo
Folclorista de valor
Muita lucidez no crânio
No mundo subterrâneo
Dos canais inconscientes
Não se sabe o que se passa
Nos neurônios das mentes
A gente pode te ver
Mas não sabe o que sentes
Atuando em muitas frentes
No mundo emocional
Adauto Paiva viveu
Com um certo baixo austral
Acabou por se matar
Encerrando o carnal
Mas o espiritual
Continua entre nós
Orientando seu povo
Através de sua voz
Reiterada por irmãos
No meio do mundo atroz
O tempo corre veloz
Depois que muito brilhou
Há quarenta e quatro anos
Adauto desencarnou
Essa estrela cintilante
Fatalmente nos deixou
Enfim, o que nos restou
Foi sua rica memória
Sua fé e esperança
E a vida meritória
Em defesa da cultura
Meta civilizatória
Para contar sua história
Com honradez e apreço
Temos o Ricardo Alves
Que muito bem eu conheço
Homem distinto e capaz
A quem eu muito agradeço
Por produzir sem tropeço
Este livro com louvor
Falando de Adauto Paiva
Que foi músico e pintor
Dramaturgo, folclorista
Decorador e ator
Seja em que área for
Sempre muito competente
Foi também tabelião
Auxiliava o carente
Porque a filantropia
Nele estava latente
Ajudava aquela gente
E pouca coisa deixou
A senhora Doralice
Que com ele trabalhou
Desse lado humanitário
Deveras testemunhou
Escreveu algumas cartas
Antes do autoextermínio
Tentando explicar o ato
Com um forte tirocínio
Sem, no entanto, se abalar
Mantendo o autodomínio
Mesmo em pleno declínio
Fez toda preparação
Disse como desejava
Ser enterrado e o caixão
Deveria ser modesto
Sem nenhuma ostentação
E o velório seria
Na igreja Santo Antônio
Capelinha que ele fez
Pra o santo do matrimônio
Onde rezava pra Deus
Enxotar todo demônio
Doou todo patrimônio
Até uma bicicleta
Vendeu até o cartório
Preparando sua meta
Sem demonstrar o desgosto
Da sua alma inquieta
Em atitude discreta
Mandou fazer uma toga
Deixou vela e caixão pagos
E carta que homologa
Seu catastrófico gesto
Ato que ninguém revoga
A família se afoga
Em tristeza e desalento
O irmão João faleceu
Em um trágico momento
Acidente de automóvel
Com profundo ferimento
Mataram Zezinho Paiva
Na cidade de Cajá
Adauto suicidou-se
Confirmando a sorte má
Fato muito divulgado
De Mari a Taumatá
Mas, sempre um dia virá
Que tudo se desvanece
A vida segue em frente
O destino a teia tece
Hoje lembramos Adauto
Neste cordel como prece
Sua irmã nunca esquece
De Adauto tão gentil
Ainda quando criança
Brincava no Pastoril
Se apaixonou pelas artes
E a cultura do Brasil
Sua alma pueril
Na folia era brincante
Do folclore nordestino
Foi conhecedor brilhante
Colecionava bonecas
Das quais era fabricante
Antes de seguir adiante
Na estrada do decesso
Doou 300 bonecas
Com o desejo expresso
De preservar seu acervo
Mas não viu o retrocesso
Porque quem teve o acesso
À incomum coleção
Foi a UFPB
Que, por falta de atenção,
Deixou que se extraviasse
Todo o esforço foi vão
No ano 51
Foi apresentado um drama
Adauto com 13 anos
Participou do programa
Fazendo Carmem Miranda
Com entusiasmo e flama
Ele canta e declama
Dando show de rebolado
Depois daquele papel
Foi bastante criticado
Apelidaram “Baiana”
Um preconceito danado!
Mas era um ser muito amado
Com a luz que sempre emana
Das pessoas reluzentes
Que têm um pé no nirvana
Na plenitude da paz
E da grandeza humana
No ano 52
Houve outra exibição
Adauto promove evento
Em cima de caminhão
Lá no pátio da Igreja
Com total animação
Apresentou a canção
“O calango chorador”
Sendo muito aplaudido
Como entoado cantor
Da ciranda e do coco
Era vibrante cultor
Carregando o andor
Dos santos da sua igreja
Foi católico fiel
Dessa fé que até flameja
Estudou para ser padre
Mas desistiu da peleja
Aonde quer que esteja
Adauto será lembrado
Como um ser especial
Pelo fadário marcado
Radiante anjo terrestre
Pelo Senhor foi chamado.
Querubim iluminado
Da luz um trabalhador
Que veio em missão à terra
Para ensinar o amor
Como ser evoluído
Um celestino condor.