O homem que comeu sal a mando de Lampião

Começando esse cordel

em um dia de mormaço,

peço encarecidamente

um pouquinho de espaço

pra contar ao meu leitor

mais um caso do cangaço.

Ouvia desde pequeno

em caso de contação,

sentado numa calçada

com o meu prato na mão

uma história malvada

do temido Lampião.

Esse causo ocorreu

em um pequeno canteiro,

onde se abancou o bando

do tirano cangaceiro

que desceu do seu cavalo

dando ordem no terreiro.

Na porta duma tapera

que estava castigada,

Lampião muito temido

numa sombra escorada,

chamou por uma pessoa

e a viu pela entrada.

Suado de corpo quente,

com o sorriso fajuto

conversou bem educado,

mas tinha fama de bruto

e mandou fazer comida

para o bando resoluto.

“Mande matar o carneiro,

na mesa quero fartura,

se puder traga refresco

porque penso na quentura”.

Disse alto o bandoleiro

com a arma na cintura.

Lampião foi convidado

para sentar na varanda,

porque o vento do norte

batia nele de banda,

enquanto isso a comida

guisa na pobre quitanda.

A comida foi servida,

mas a mulher assustada

cozinhou tanta fartura

pois estava apressada,

nem sequer verificou

se estava temperada.

O guisado do carneiro,

acabou rapidamente,

Lampião muito faminto

sentou-se logo na frente

e comia tão ligeiro

que batia no seu dente.

Todo mundo almoçando

e na hora um atrevido,

reclamou naquela mesa

do farto lanche servido,

porque estava insosso

quase não tinha comido.

Lampião ficou irado

pelo que aconteceu,

o cabra havia cuspido

na cumbuca que comeu,

falando da refeição

que a todos fortaleceu.

A senhora preocupada

com aquele comentário,

foi correndo pra cozinha

buscar no velho armário

o tempero que esqueceu

devido a todo cenário.

Uma vergonha daquelas

Lampião nunca passou,

pegou o quilo de sal

e na mesa o colocou,

apontou o cabra nele

e comer tudo o obrigou.

O cabra se arrependeu

do dia que foi nascido,

com a língua já cortada

mal havia percebido

a quantidade de sal

que já tinha ingerido.

Começou a passar mal

na metade da comida,

já não aguentava mais

a pena já decidida,

começou estrebuchar

com a barriga doída.

Não queria ali morrer,

estava desesperado

começou ver tudo preto

com o olho arregalado,

não tinha tempo de vida

já estava condenado.

Na secura do torrão

depois de muito penar,

embaixo de uma sombra

não conseguiu suportar,

e o suspiro derradeiro

foi no tristonho lugar.

Vou parar minha caneta,

nessa estrofe do papel,

outro dia venho aqui

fazer um outro cordel

sobre o cabra que capou

um coitado tabaréu.

Alagoas, 17/10/24

João Pedro Vitorino
Enviado por João Pedro Vitorino em 18/10/2024
Reeditado em 19/10/2024
Código do texto: T8176330
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2024. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.