AS BRAVURAS DO VAQUEIRO CHICO RUFINO
Chico Rufino vaqueiro
Da Fazenda Dalemar
Tinha fama de doutor
Isto eu posso sublimar
No tempo do meu avô
Não é somente pra rimar.
O fato é que o Chico
Sempre foi um bom vaqueiro
A fazenda sempre gostou
Desse antigo pipoqueiro
Vindo das terras dos móveis
Do famoso petisqueiro.
Quando vendia pipoca
Na venda de seu Tomé
O dono de Dalemar
O famoso Jô Filé
Ficou de olho em Chico
Dali não arredou o pé.
O vendedor de pipoca
De porte avantajado
Fora convidado por Jô
E ficou desajeitado
Um convite daquele faz
O cabra ser desejado.
Deixou a pipoca de lado
E partiu para a fazenda
Pra ser vaqueiro dali
Ganhando uma boa renda
Não sabia Chico Rufino
Que ia dar conta da venda.
Além de ser o vaqueiro
Teria também que dá conta
A venda daquela fazenda
Que todo dinheiro se monta
Jô Filé já bem cansado
Pra Chico tudo se apronta.
Chico Rufino se engraçou
Com a dona Mariquinha
Prima do finado Juca
Dono duma fazendinha
A Dalemar quando soube
Quis com ele uma conversinha.
Chico Rufino se casou
E tentou ficar feliz
Mariquinha dava nele
Que lascou o seu nariz
O delegado Juvenal
A chamou de meretriz.
Chico Rufino não gostou
Quis bater no delegado
Aquela tremenda confusão
Para aquele povo abismado
Que parava naquela praça
Como um bando de bestado.
Chico Rufino ficou puto
E falou pro cabo Tota
Que dissesse pro delega
Aquele cara de bota
Que respeitasse Rufino
Pagador de tanta cota.
O vaqueiro então sumiu
No mato foi se esconder
Aquele jeito valente
Começava a se perder
Mariquinha em casa rindo
Sem saber o que fazer.
Juvenal ficou sabendo
Isto tudo, claro, acredito
Mandou logo um destacamento
Pra resolver o conflito
O vaqueiro se armou todo
Mas não quis fazer delito.
Veio Tota, o cabo firme
Pra tentar intermediar
Chico olhou, pensou melhor
Preferiu não mais brigar
Mas deixou claro a todos
Que ele não ia se calar.
Mariquinha, ao perceber
Que a coisa ia apertar
Foi falar com Juvenal
Pediu pro caso encerrar
Mas o delegado riu
Não quis conversa aceitar.
O vaqueiro então voltou
Pro trabalho no sertão
Guardou as mágoas no peito
Mas não baixou a mão
Esperava outra chance
Pra livrar-se da pressão.
No campo ele era rei
Daquele gado todinho
Nenhum boi se perdia
Com Chico no servicinho
Mas em casa, pobre homem
Lhe faltava carinho.
Jô Filé já mais cansado
Viu o Chico estressado
Resolveu chamar o amigo
Para um papo mais calado
E pediu que ele cuidasse
De um dinheiro mais guardado.
Agora era vaqueiro
E contador da fazenda
Chico viu que sua vida
Tomava outra contenda
Precisava resolver
Pra Mariquinha uma emenda.
Mariquinha por seu lado
Quis a vida melhorar
Foi buscar na capital
Alguém pra lhe arrumar
E o vaqueiro na roça
Sem saber o que contar.
A mulher mudou de rota
E começou a investir
Abriu loja de tecidos
E começou a fingir
Que gostava de Rufino
Mas só queria partir.
O boato então correu
Por todo aquele sertão
Que Mariquinha fazia
Um grande alvoroço em vão
E Chico ficou sabendo
No meio de uma reunião.
Com o gado ali em ordem
Chico não queria briga
Mas o sangue ferveu logo
Quando ouviu a intriga
Resolveu ir à cidade
Pra tratar com sua amiga.
Ao chegar, encontrou ela
Com um rapaz do lugar
Chico não acreditou
No que estava a presenciar
Mariquinha rindo alto
Do pobre vaqueiro a chorar.
O Rufino decidiu
Que não ia mais calar
Foi até a delegacia
Pra Mariquinha acusar
Mas o delegado riu
Não quis nada registrar.
Com raiva no coração
Chico Rufino jurou
Que ia tomar providência
E o sertão abalou
Foi até Jô Filé
Pra contar o que passou.
Jô ficou pensativo
E decidiu intervir
Chamou o delegado
Pra o caso discutir
Juvenal, sem opções
Foi forçado a desistir.
Mariquinha foi embora
Pra capital se mudou
Deixou Chico no sertão
No peito que destroçou
Mas o vaqueiro aos poucos
Sua vida consertou.
Voltava a cuidar do gado
E a fazenda prosperava
Sem Mariquinha no pé
Sua mente já clareava
E o povo dali dizia
Que Chico de novo mandava.
Agora o vaqueiro firme
Sem mulher pra atrapalhar
Cuidava de todo o campo
Sem nada a contestar
Jô Filé feliz da vida
Nem precisava falar.
O tempo passou ligeiro
E Chico se recompôs
Achou outra companheira
Muito mais de seus avôs
E o sertão ouviu a história
De como ele se impôs.
Chico agora sossegado
Na fazenda a trabalhar
Cuidava do seu gado
Sem nada mais reclamar
Mas Mariquinha de longe
Ainda o queria ferrar.
Na capital, ela tramava
Com amigos poderosos
Arranjou uns documentos
Com senhores criminosos
E começou a planejar
Muitos planos ardilosos.
O delegado Juvenal
Ainda estava ao seu lado
Aceitou a proposta
Num acordo bem fechado
Prometendo a Mariquinha
Acabar com o desgraçado.
Chico, longe desse enredo
Vivia com sua amada
Uma mulher simples, forte
Do sertão abençoada
Sem saber que o destino
Lhe guardava uma cilada.
Certa noite de lua cheia
Numa calma sem igual
Chico estava na varanda
Observando o animal
O gado quieto, tranquilo
Tudo parecia normal.
De repente, uma sombra
Aproxima-se no escuro
Era o delegado Juvenal
Com olhar muito duro
Chico sentiu um arrepio
Pressentiu o tempo futuro.
O delegado chamou
Disse que era só conversa
Chico, desconfiado
Sentiu uma dor dispersa
Mas Juvenal sorria
De forma bem perversa.
Puxou o revólver lento
E apontou pro vaqueiro
Disse que era o fim
Por ordem do fazendeiro
Mas Chico, no último gesto
Não implorou por dinheiro.
Isso é coisa de Mariquinha
Chico Rufino gritou
O delegado calado
Apenas a arma apontou
E, num tiro certeiro
Toda vida ele levou.
A lua cheia brilhava
Naquela noite cruel
Chico Rufino caía
Sob as luzes do bordel
E a fazenda Dalemar
Cobria o corpo fiel.
O gado continuava
Sem saber o refletir
A morte de um vaqueiro
Que só queria resistir
Mas a ganância de muitos
Levou seu fim a partir.
Mariquinha na cidade
Recebeu a notícia fria
De que Chico havia ido
De forma tão sombria
Mas ela apenas riu
Sem mostrar melancolia.
O povo da região
Ficou todo a murmurar
Como pôde um vaqueiro
De repente se acabar?
Sabiam que ali havia
Mais coisa pra se contar.
Mas o tempo foi passando
E a história se apagou
Mariquinha viveu bem
Mas sozinha terminou
Enquanto o nome de Chico
O sertão todo guardou.
Dizem que nas noites claras
De lua cheia no sertão
Pode-se ouvir o gado
E um suspiro de solidão
Como se o vaqueiro morto
Guardasse a plantação.
O delegado Juvenal
Nunca teve paz, enfim
Morreu anos depois
Num final bem ruim
Assombrado pelos fantasmas
Que a justiça tem por fim.
A fazenda Dalemar
Ficou rica de uma vez
Mas quem mora por ali
Ainda lembra com altivez
Do vaqueiro que um dia
Mostrou sua honradez.
Chico Rufino se foi
Numa noite de lua cheia
Levado pela cobiça
Num fim de alma alheia
Mas sua história é eterna
Por todo esse sertão sem meia.
E assim termina a saga
De um vaqueiro tão forte
Que lutou, amou e sofreu
Até encontrar sua morte
Mas seu espírito vagueia
Nos campos do gado norte.
FIM
João Pessoa-PB, 17 de março de 2020.