LÁPIS DE POETA

Sou um lápis de poeta

Mas, eu não sei até quando

Pois é só ele dá na telha

de sair multiplicando

os versos que sai da mente...

Faz-me refém e simplesmente

passa a noite e o dia me usando.

E usa e abusa de mim

rabiscando os seus versos

quando começam brotar

de infinitos multiversos

que é sua imaginação

Ficamos, nós dois, então

na poesia, submersos.

E desenho as emoções

- todas que o poeta sente -

e outros tantos sentimentos

que só nascem em sua mente

Se o poeta ri, se chora;

se clama, se chama e implora

Lá estou eu, obediente.

Quando lhe bate a insônia

no meio da madrugada

e a inspiração lhe sopra

uma estória inesperada

O poeta, que é meu dono

me rouba o melhor do sono

sem hora-extra, nem nada.

E interpreto os seus incômodos

e como um melhor amigo

acolho suas confidências

Não reclamo do castigo

Traduzo sua emoção

Dou voz ao seu coração

Quando quer dizer, eu digo!

Conheço os seus devaneios

Me embrenho além das retinas

E quando da alma brotam

as visões, das mais divinas

até aquelas mais terrenas

Sou eu quem transformo as cenas

em sonetos e sextinas.

E traço seus versos livres

E aprisiono no papel

para toda a eternidade

redondilhas em cordel

Tercetos e aldravias

Trovas, glosas, poesias...

No atacado e a granel.

E se o poeta entristece

Se por acaso ele chora

E se relembra da infância,

das vivências de outrora

Das paixões, dos seus amores

Os seus sonhos, suas dores

é meu traço que elabora.

Quando diz do amor em versos;

sou eu quem rabisco “amor”

Quando se sente sozinho

e o vinho lhe traz calor

sem ter calor de verdade

Sou eu que escrevo “saudade”

Onde rasurou-lhe a dor.

E quando num big-bang

num orgasmo, num espanto

fica, então, pronta a poesia...

Tomado por um encanto

o poeta faz a escolha:

enamora-se da folha

e deixa o lápis num canto.

E como vocês já sabem

é um paradoxo essa vida

Quanto mais me dou, eu morro

- é a minha contrapartida

Pereço, lanho por lanho

diminuindo meu tamanho

Morro perdendo a medida.

É porque quanto mais risco

mais eu me arrisco a morrer

E o incansável poeta

não tem mais o que fazer

E à medida que eu me empenho

vai sumindo o meu lenho

para a ponta aparecer.

E é bem aí onde mora

o que mais me desaponta

Se eu nasci para tecer

versos a perder de conta

Se a ponta é para escrever...

Por que tenho que morrer

quando apontam minha ponta?

E sobre a minha estrutura

dá até pra filosofar

Meu corpo é só o invólucro

No centro é que vai encontrar

a coisa mais importante

parente do diamante

e que mais faz rabiscar.

É o tale do grafite

Que, mais tanto que tampouco

dá vida aos seus pensamentos

do mais sensato ao mais louco

E mesmo em sua dureza

vai modelando a beleza

do poema, pouco a pouco.

E o tempo do meu descanso

é entre um e outro verbete.

Só pra apontar minha ponta

depois volto ao tirinete.

E é por isso o meu desgosto,

vou ficando descomposto

na lâmina do estilete.

Você pode até dizer

que eu não tenho paciência

Que sou muito exagerado

que vou ter longa existência

e a recompensa devida

Que né a hora da partida

e que irei ter sua clemência.

Mas, digo: como almejar

algo que não essa sorte?

Como esperar que um lápis

tenha senão esse norte?

Pois, sou lápis de poeta

e essa sina a mim decreta

escrever até a morte!

Acaso se não se morre,

Ainda assim é funesta.

a vida. Pois, dele usar

fica pequeno e não presta

E não cabendo em sua mão

pra um toco, sem servidão

só o abandono lhe resta.

Pois, pra um lápis de poeta

cujo destino é contar

as estórias, suas vidas

sonhos, glórias e pesar

Delatar seus pensamentos

traduzir seus sentimentos

não cabe o dom de sonhar,

Vez que aquele que não morre

não vai ter melhor saída.

Pois de tanto ser rasgado

e perder sua medida;

não servirá mais pra nada.

Tem sua pena selada:

morrer ou perder a vida.

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POEMA 3.º COLOCADO NO FEPI – FESTIVAL DE POESIA DE IBOTIRAMA, 2023.

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MARCELO VALOIS
Enviado por MARCELO VALOIS em 29/09/2024
Reeditado em 11/10/2024
Código do texto: T8162509
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