O CABRA AZARADO
Um cordel desajeitado
Conforme cabra azarado
Que nunca fazendo nada
Tentou ser domesticado
Não teve sucesso nisso
Nesse sonho realizado.
Se tudo que escrevo valesse
Esse assunto renderia mais
O cordelista não pode ficar atrás
Mesmo que ele não merecesse
E a leitura acontecesse
Me viro em dois e quero paz
E recitando amplio os polegais.
Se o cabra nunca teve sorte
Não tenho como explicar
É lua nova que vai chegar
É espera que tarda a morte
O cabra tem que ser forte
Tudo na vida espantar
E não tem o fruto de Alá.
A religião congrega o trabalho
E na força a luz nasce da escuridão
E do nascimento a procriação
É como do tecido o retalho
Às vezes com um costurar falho
Aperta o cinto e a emoção
Brota o silêncio e a solidão.
Meu prezado leitor
Queira me presentear
O documento assinar
E viver sem ódio e sem rancor
É assim que se vence a dor
Nos raios de cada passear
Nas prosas desse pesar.
O cabra azarado está chegando
Trazendo na bisaca muita esperança
Matar a sede de toda criança
Sublinhar o que se está gostando
E se gosta porque está pecando
É viver sem arte e confiança
E mesmo assim estou cantando.
O azar do cabra em pauta
Entristece ao cidadão
Envaidece a ocasião
Congestiona e não mata
E cada canto que se cata
O mundo inteiro é solução
E não há mais salvação.
O cabra azarado quer respeito
Sente-se inútil e nada faz
Já é quase um rapaz
E nunca na vida teve direito
De ver da moça o peito
Era donzelo não adianta mais
Viver assim feito satanás.
Por mais que viajasse
O cabra só tinha azar
E cada vez açoitar
A dor que lhe maltratasse
No sonho de quem lhe amasse
Assim é o cabra de tanto penar
Na vida e em qualquer lugar.
O cabra azarado é pecado
E de tanto andar sofrendo
Apelou pra quem tá vivendo
E por cima ainda é abestalhado
Do amor sempre acabado
E na onda da água fervendo
Ferve a dor de quem vem perdendo.
O cabra azarado não acerta nada
Vive perdendo e diz querer ganhar
E quando ganha quer logo parar
Vive dando em si muita pesada
Chorando calado e dando mancada
Não há como definir esse cabra azarado
Tudo que faz dá na certa errado.
O cabra sem sorte é um infeliz
Que sonha alto e nada faz
E sempre, mas sempre se satisfaz
Com o erro do outro e ainda diz
Que fazer tudo certo sempre quis
Não faz porque o mundo é assim
Não tem nada bom, tudo é ruim.
Mas que coisa sem lógica
Uma definição de azar
É que esse cabra vai se lascar
Porque sua vida pedagógica
É viver na coisa patológica
Tudo na vida uma leseira
Abre a boca e só sai besteira.
Namorou e levou um fora
Voltou lá e se lascou
Uma tapa da ex levou
Dá um riso e o resto chora
Sua mãe uma jovem senhora
Dá conselhos ao cabra
Mas este é vida macabra.
Faz vestibular e zera a prova
Faixa de pedestre não respeita
Passa por fora e não aceita
Diz que tudo não passa de uma ova
De hoje por diante só mulher nova
Poderá dar seu amor a esse azarado
Fugiu da igreja com casório marcado.
Se a gente parar pra falar
Em tudo desse cabra
O mundo todo desaba
Não há como explicar
Tanta burrice praticar
Esse cabra de azar vive cheio
Falar de coisa boa tenho até receio.
Uma menina de olho no azarado
E ele fazendo de conta que não via
Ela foi lá e tacou-lhe uma putaria
E ele todo vermelho e encabulado
Não acreditou e saiu avechado
Com vergonha de tudo aquilo
Depois disse que estava tranquilo.
O cabra azarado é mesmo caso perdido
Arruma emprego e não segura
Fala do sal e esquece a doçura
Da vida e tudo nela sentido
É que o cabra vive escondido
Não se esforça pra vencer
Arranja encrenca e só vive a perder.
O azar bate à sua porta
E ele por sua vez nada impede
Um só pulsar de vida não concede
É sua vida em si quase morta
E nada, mas nada lhe conforta
A leitura, a televisão e o turismo
Tudo não passa de puro neologismo.
Temos até piedade desta criatura
Que não vive, apenas vegeta
Não gosta de baile, nunca foi à festa
É um tanto sinônimo de loucura
O cabra que é pra lá de frescura
E assim vai vegetando no tempo
Seu viver é um eterno contratempo.
Por mais que viajasse
O cabra só tinha azar
E cada vez açoitar
A dor que lhe maltratasse
No sonho de quem lhe amasse
Assim é o cabra de tanto penar
Na vida e em qualquer lugar.
O cabra azarado é pecado
E de tanto andar sofrendo
Apelou pra quem tá vivendo
E por cima ainda é abestalhado
Do amor sempre acabado
E na onda da água fervendo
Ferve a dor de quem vem perdendo.
O cabra azarado não acerta nada
Vive perdendo e diz querer ganhar
E quando ganha quer logo parar
Vive dando em si muita pesada
Chorando calado e dando mancada
Não há como definir esse cabra azarado
Tudo que faz dá na certa errado.
O cabra sem sorte é um infeliz
Que sonha alto e nada faz
E sempre, mas sempre se satisfaz
Com o erro do outro e ainda diz
Que fazer tudo certo sempre quis
Não faz porque o mundo é assim
Não tem nada bom, tudo é ruim.
Ele na vida é morto nas calça
Não faz nada por merecer
E quando merece não quer receber
Num velório quis pegar numa alça
A família do morto um tanto sem graça
Mandou o cabra se afastar
E ele ficou somente a rezar.
Cabra azarado toma jeito na vida
Não vive assim desse jeito
Eu sei que é teu direito
Mas por favor cura essa tua ferida
Nas águas sãs dessa corrida
Resolver ser gente e busca a sorte
Porque teu final será a própria morte.
Seu prumo é por demais incerto
E afasta sempre o bem de si
Congrega forças para bulir
Feito sombra recuada no deserto
Não encontra ninguém por perto
E se encontra nada oferta
É um sem futuro que nos empesta.
Como ganhar na vida sem perder
Um instante de insatisfação?
Não sei qual é a condição
Mas o cabra um dia quer vencer
E assim nunca mais padecer
É um ser que te esconjuro
Espanta a luz, mora no escuro.
O cabra nasce sem sorte
Não tem por onde ir
Quer correr, quer fugir
Nessa ideia vem a morte
E ele que não é forte
Fica plantado, chorando
E o diabo lhe atanazando.
Se tudo que faz não é direito
Se pensa o corpo todo amolece
E nenhum cidadão lhe conhece
É que esse cabra tem defeito
São tantos que bato no peito
Se ele vai viver muitos anos
Porque na vida não tem planos.
Melhor como todos falam
Deixar sua vida sem dar a mínima
É coisa totalmente íntima
Eu imploro e eles se calam
O azarado e outros se abalam
Com a situação imposta
É assim que o fuxico gosta.
Assim chego ao fim deste cordel
Torcendo pra esse cabra azarado
Ser feliz e ter muito cuidado
Quando sair na rua, olhar o céu
Ao entrar, tirar o seu chapéu
Aprender com os erros ditos
Não dar vez nem voz aos malditos.
F I M
João Pessoa-PB, 12 de março de 2000.