MALÉVOLO SER

Você que ler este cordel

Sente-se bem confortável

A história a seguir é forte

De algo assim tão memorável

Vai descobrir nas entrelinhas

Que isto não é saudável.

Tenho em mãos a ideia

E jogo ao leitor sua visão

Um assunto comentado

Entrelaçado de maldição

O menino por nome Joaquim

Vinha lá da escuridão.

Seu coração era frágil

De bondade nenhum pouco

Era cretino e perverso

Ficava surdo e mouco

Gritava tanto na vida

Obscuro feito louco.

Pois neste exato momento

Vamos traçar este drama

Joaquim Praxedes de Oiticica

Depois caía na cama

No outro dia mais tédio

Entrava direto na lama.

O menino era maldito

E não tinha filiação

Chegou naquele orfanato

Usando só um calção

Trazia no pescoço sujo

Um grande medalhão.

Uma medalha de Jesus

Que ele chamava de Noé

Enrolava todo mundo

Dizendo ter muita fé

Um dia seria gente

Ao lado de uma mulher.

Joaquim foi adotado

Pela família Oiticica

De gabarito na Espanha

Por ter posse e ser rica

Mas só teve desgosto

Desabafava a Dona Lica.

Dona Lica, mãe adotiva

Daquele menino Joaquim

Chorava quando lembrava

Daquele peste ruim

Que matou seu sobrinho

E lhe cobriu de capim.

Este fato foi notícia

Em toda terra espanhola

O menino Joaquim

Apelidado gogó de sola

Fugiu numa embarcação

Que exportava bola.

Dentro daquele navio

Logo ele foi descoberto

Levaram de volta ao país

Que estava bem perto

Ao chegar no seu abrigo

Lhe mandaram ao deserto.

O passado deste menino

Ninguém quis pesquisar

Até mesmo o pai adotivo

Até que foi tentar

Mas nenhum sucesso

Tinham para explicar.

No deserto do Saara

Joaquim muito aprontou

Vendeu um camelo

E muito dinheiro ganhou

Deu surra em turista

E um pequeno ele matou.

Fugiu dali depressa

Não podia ser detido

Levou tanta porrada

Que ficou sem sentido

Esqueceram este Joaquim

Que era o diabo prometido.

Num jipe de um guarda

Que protegia a floresta

Joaquim montou no bicho

E fez uma grande festa

Levou uma cacetada

Que quase quebrou a testa.

Tinha treze anos de vida

Tinha aquele infeliz

Andou por muita estrada

E conheceu muito país

Por onde ele passava

Vidas ficavam em triz.

No oceano pacífico

Ele tentou mergulhar

A água estava gelada

Ficou só a observar

Um menino nadando

Ele quis logo assassinar.

O bicho era nó cego

E vivia tão bem sozinho

Roubava o que é dos outros

E falava bem de mansinho

Enganava um monte de besta

E saía tão de fininho.

Segundo alguns estudos

Dizem que ele era o cão

Não tinha pai, nem mãe

Vivia em contradição

Matava e matava

Era essa a sua religião.

Com Jesus no pescoço

Dizendo que era Noé

Aprontou tanto na vida

E estragou todo café

Plantado por Inocêncio

Na Fazenda da Boa Fé.

O rastro deste menino

Era só visto pelo pecado

Caminhava pelo mundo

Falando meio compassado

Não tinha futuro o dito

Muito menos o passado.

Joaquim era o cão tinhoso

Em figura de boa gente

Matava e enfolava

E cobria com aguardente

Depois botava capim

Com isto ficava contente.

Você pode até pensar

Que não viu coisa pior

O danado de Joaquim

Fez um velho cheirar pó

Bateu assim com força

Que ele ficou cotó.

Era um grande viajante

Que nunca fez o bem

De onde veio este menino

E se foi filho de alguém?

Segundo aquele povo

Ele veio lá do além.

Foi um além muito triste

Que Joaquim foi enviado

Chegando aqui na terra

O mal por ele foi praticado

Matou muito menino

Dentre eles, um afogado.

Pegou uma linda criança

E do colo da mãe retirou

Meteu ela numa piscina

E ela tão depressa se afogou

A coitada da humilde mãe

Ali mesmo desmaiou.

A polícia quando soube

Tentou ele logo prender

Mas ele estava tão longe

E nunca quis se arrepender

Foi direto numa pensão

E isto veio, enfim, acontecer:

A senhora que era dona

Era uma mãe solteira

Tinha um filho pequeno

Com uma pessoa estrangeira

Joaquim ficou olhando

E puxou uma peixeira.

Partiu a criança em duas

E botou numa sacola

Fugiu mais que ligeiro

E foi assim pedir esmola

Sintam o mal espírito

Que de ruindade se assola.

É um demônio dos grandes

Que veio no mundo habitar

A mãe que era adotiva

Foi no orfanato para adotar

Gostou muito dele

E de Joaquim foi batizar.

Joaquim não gostava

De quem fosse menino

Odiava todos eles

Escreveu com isto o destino

Já crescido de idade

Foi trabalhar com Justino.

Era um nobre alfaiate

Muito bem considerado

Costurava para padres

E era pra lá de conceituado

O seu figurino por todos

Sempre era aprovado.

Certa feita trabalhando

E comendo numa bandeja

Teve a seguinte ideia

Que pra ninguém se deseja

Matar Solano Pestana

O coroinha daquela igreja.

A roupa de Solano estava

Pronta e engomada

Joaquim botou veneno

E ela foi procurada

O Padre Matos Bondade

Tinha a mente preocupada.

O coroinha se parecia

Com Joaquim quando pequeno

Mas não sabia o menino

Que morreria de um veneno

Posto na sua roupa branca

Que se firmou no sereno.

Solano Pestana morreu

E ninguém soube o porquê

Joaquim foi pro enterro

E agora vocês vão ver

O que ele aprontou

Com aquele querido Ser.

Ele colocou gasolina

Dentro daquele caixão

Tocou fogo na hora

E foi grande a multidão

Mas ninguém viu a cena

E ele fugiu com precisão.

Deixou aquele emprego

E já se encontrava em Portugal

Foi naquele belo País

Que ele fez muito mal

Matou o príncipe herdeiro

Enchendo o bucho de sal.

Ninguém percebia o ato

Que Joaquim praticava

Eram tantas mortes

Só menino ele matava

Não se sabe até hoje

O que tanto lhe atanazava.

Só sabemos que Joaquim

Não era deste mundo de Deus

Ele veio lá das trevas

Dos infernos de Zebedeus

Era frio e calculista

Nas palavras dos ateus.

Com todas as mortes

Que Joaquim já praticou

Por nenhuma foi preso

E nunca nada pagou

A justiça dos homens

Com ele sempre falhou.

Era preciso um jeito

Pra tudo isto acabar

Porque ele já crescido

Muito mais ia aprontar

Foi quando voltou à Espanha

E quis a família encontrar.

Chegando em Barcelona

Ninguém ali encontrou

Foi no antigo orfanato

E as portas pra ele fechou

Ficou perambulando

E numa grande ponte se jogou.

O pescador Matias Donato

Quis o bandido socorrer

Com mais de vinte anos

Só deixou gente sofrer

O coitado do pescador

Viu algo estranho acontecer.

Quando ele pulou da ponte

Deu um intenso trovão

Ouviu-se um berro tão alto

Que não tinha definição

Era a figura do diabo

Subindo à escuridão.

Cada letra se sensibiliza

Com você caro leitor

Sei que está pensando

Quem foi que me contou

Uma tragédia deste tipo

Que este cordel publicou.

FIM

João Pessoa-PB, 30 de setembro de 1998.

BENTO JUNIOR
Enviado por BENTO JUNIOR em 18/09/2024
Código do texto: T8154384
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