O TIRADOR DE COURO
Manué era conhecido
De toda redondeza
Amava o que fazia
E fazia com beleza
Tinha um defeito puro
Contarei com certeza.
Arrancava todo couro
Do seu pé e da sua mão
Era sangue pela casa
A família em aflição
Manué não tinha jeito
Tome couro pelo chão.
A mulher de Manué
Não aguentava mais
As tiradas de couro
E chamava por satanás
Manué não tava aí
Dava pena aquele rapaz.
Certo dia na cidade
Manué foi visitar
Um parente amigo
E quis se consultar
Contou todo problema
Depois couro foi arrancar.
O dono da casa, veja
Ficou muito revoltado
Chamou Manué de seboso
E disse: “ tá dispensado”
O arranca couro saiu triste
E falou: “fui humilhado”.
Por onde ele passava
Era couro que só vendo
Sua mão já calejada
E Manué pobre sofrendo
Quando menos esperava
O cabra quase morrendo.
Tudo por causa de couro
Da insistência de Manué
De manhã a mulher varria
Os pedaços de sua fé
Cada couro encontrado
Era grito por Lúcifer.
Não tinha jeito mesmo
O pé vivia sangrando
A mão que coisa feia
Era Manué se matando
Gostava ele de sofrer
E mais couro ia botando.
Manué andava triste
De arranca-couro conhecido
Por onde ele passava
O couro era varrido
Virou sem vergonha
E chamado de atrevido.
Ninguém não mais queria
O arranca-couro por perto
Se benzia a população
Era um ato bem correto
Porque Manué não deixava
O que não era correto.
O couro de Manué
Com sangue era arrancado
Envergonhando a família
Que pagava o pecado
De ser gente de Manué
No sangue derramado.
Cada couro que caía
Uma lágrima acompanhava
O dono do pé sofria
Apenas só reclamava
Botava remédio no pé
Mas depois couro arrancava.
A vida de Manué
Virou uma grande confusão
O couro que ele tirava
Jogava tudo no chão
Não tinha o que fazer
Naquela distinta ocasião.
O seu corpo vivia
Entregue ao deus dará
Sangue por todo ele
Ninguém podia aguentar
Como era que um Cristão
Preferia se arrebentar?
A judiação era tanta
Que dava pena no povo
Implorava a Manué
Que não fizesse de novo
Mas ele sempre dizia
- Assim que é saboroso.
Era couro que só a gota
E haja couro pra tirar
Manué era teimoso
Nenhum minuto ia aguentar
Era uma terapia
Como podia sossegar?
O flagelo deste Ser
Incomodou muita gente
Não houve uma só pessoa
Que ficasse contente
Com atitude de um cabra
Que não era nada decente.
O vereador da cidade
Querendo contribuir
Prometeu dar título
Mas Manué quis foi fugir
Arrancar bem longe os couros
E o chão da casa poluir.
Estava ficando difícil
Esta singela demonstração
Manué não queria nada
Que falasse em obstrução
Preferia botar remédio
Pra sarar o buracão.
Que buraco que ficava
A família sofria tanto
Coitado daquele homem
Que enchia tudo de pranto
No sangue das suas mãos
Ele limpou foi com o manto.
Era o manto da família
Que vivia bem escondido
O cabra deu de garra
E veja só o acontecido
Não ficou um só lugar limpo
Sujou todinho o tecido.
Este pedaço de carne
Da pele viva ele tirou
Um gato que ia passando
Com ela se alimentou
Manué brigou com o gato
E logo à frente chorou.
Gostava ele, meu Deus
De brincar com aquele couro
Era uma diversão das grandes
Como a formiga e o besouro
Manué era insistente
Dizia – isto é um tesouro.
Não entendo como era
Que vivia o tal Manué
Arrancando cada couro
Deixando sangue no pé
O couro que ficava
Ele saía dando olé.
Coitada da sua mãe
Não tinha como impedir
Do filho deixar daquilo
Mas era difícil resistir
Era o rosto de Manué
Nunca falava em desistir.
Meu Deus como podia
Tanto couro pra tirar
Por tudo que ele fazia
Mas nada lhe fez gostar
Somente arrancar couro
Só isso podia lhe alegrar.
O povo todo agitado
Dizia – deixe dessa história
E ele todo contente
Se sentia a própria glória
Sentado numa cadeira
Merecia uma boa palmatória.
Certo dia foi ao médico
Até que ele gostou
Na farmácia ia passando
O remédio ele comprou
Somente uma semana
Ele botar aguentou.
Cada dia que passava
O caso se complicava
Tanto couro de Manué
Ele sozinho raspava
As sobras eram tantas
Ele logo aproveitava.
Comprou pequeno depósito
Queria o couro botar
A vasilha encheu de couro
E fedeu de amargar
Todo mundo se entristecia
Em ver Manué se acabar.
Deixe o couro de lado
Dizia a Tia Joaquina
Ele não dava ouvido
E nem tampouco a Setembrina
Uma velha de cem anos
Que lhe apontava a sina.
Eita cabra teimoso
Desses que a vida tem
Se fechava para o mundo
Só couro e mais ninguém
Se você viver de couro
Pelo tanto ia se dá bem.
Até que num belo dia
Caindo aquela chuva fina
Foi direto ao consultório
Do famoso doutor Ibiapina
Lá resolveu seus problemas
E deixou aquela sina.
O doutor lhe consultou
E falou de homeopatia
Os couros deram um tempo
A mão ficou muito macia
Estava bem satisfeito
E deu riso de alegria.
Até hoje este infeliz
Fala daquela ocasião
Do gasto com consulta
E nada de solução
Só mesmo Ibiapina
Pra limpar a sua mão.
Manué é muito teimoso
Fala com liberdade
Faz questão desta história
Mas é esta a verdade
Ele ainda arranca couro
Só porque lhe dá saudade.
Meus amigos finalizo
Este cordel com gratidão
Reze um Pai Nosso a Manué
E lhe ame de coração
Ele não tem culpa de nada
Foi clara a sua opção.
FIM
João Pessoa-PB, 09 de dezembro de 2011.