PADRE ABILOLADO - PRIMEIRA PARTE

Se você guarda consigo

Histórias do seu passado

Destrave todas elas

Como fez o Zé Machado

Entregou de mão beijada

A Luta de Noca Abilolado.

E assim o Zé Machado

Que conheceu o cidadão

Um caderno entregou

E foi dando a permissão

De escrever este drama

Com bastante gratidão.

O escritor ali estava

Sem nenhuma inspiração

Foi pegando de Zé Machado

Nesta grande ocasião

Um drama bem engraçado

Que falar faço questão.

Noca era um rapaz

Que muito tinha estudado

Fugiu de um convento

Sem ter se formado

Seria um futuro padre

Mas ficou abilolado.

Por onde Noca andava

Um livro ele levava

Sabia de muita coisa

E sempre questionava

Quem nunca tinha estudado

E uma lição ele dava.

Pois não é que o Noca

Pela família que tinha

Não via a boa hora

De comer uma galinha

Comemorar a chegada

Ao chegar naquela linha.

Naquela época o trem

Era o grande transporte

Que levava e trazia

Gente de muita sorte

Pra visitar as cidades

Do Sul e do Norte.

Toda aquela família

Tinha um filho preparado

Pra ser médico ou engenheiro

Ou mesmo um advogado

Muitos poucos para padre

Na terra de Noca Abilolado.

Noca era abilolado

Filho de João do Armazém

Vendedor daquela gente

Que não tinha nenhum vintém

Mas comprava assim fiado

Ultrapassando mais de cem.

Sua mãe era professora

Daquele grupo escolar

Que ensinou a tanta gente

E viu ela se formar

E pensava assim pro filho

Quando o dia fosse chegar.

Mas o dia não chegou

E foi grande o sofrimento

Noca saiu correndo

Daquele grande convento

Com medo das pregações

Do padre por nome Bento.

Naquele convento sagrado

Bento de tudo cuidava

Pedia ao filho do João

Que sempre lhe escutava

Atenção na lei divina

Nas lições que ele dava.

Noca Abilolado ficava

Sem nada entender

Baixava a sua cabeça

E não procurava saber

O que dizia aquele padre

Que o fazia tanto sofrer.

Tinha algo estranho

Nas palavras do Bento

Que Noca sempre chorava

E só tinha arrependimento

De ficar contrariando

As leis daquele convento.

Foi aí que começou

A loucura no seminarista

Que pensou um dia fugir

Pra ser bem longe artista

Olhando aquela paisagem

De tão bela era a vista.

Cada aula recebida

Tinha muita cobrança

Noca ia aos poucos

Perdendo a esperança

De se formar em padre

E ajudar muita criança.

O tempo se passava, porém

Noca queria logo fugir

Ir para bem longe

E precisava escapulir

Daquele convento maldito

Que começava o Noca sentir.

Certa feita no jantar

O padre Bento falou

Que Noca tivesse calma

E num instante se levantou

Dando nele um grito

Que muito triste ficou.

Depois daquela ceia

Ele foi inquieto se deitar

Naquela cama tão fria

Noca começou a chorar

Lembrava da sua infância

E do seu jeito de brincar.

Depois de grande o menino

Ser padre foi a questão

De ir cedo ao convento

Pra o batismo e comunhão

Mas era triste o momento

Implorava de Deus o perdão.

Naquele grande convento

Um amigo ele encontrou

Por nome de Leocárdio

Tão depressa lhe ajudou

E Noca queria tanto

E tudo se concretizou.

Na meia noite de setembro

Noca foi se preparando

Arrumou a sua mala

E tudo foi ajuntando

Quando estava fugindo

O padre ficou olhando.

Noca foi pro castigo

E um mês de penitência

Sofreu todas as dores

E ficou na indulgência

Não teve sequer visita

Mas guardou a paciência.

O amigo Leocárdio

Que tinha grande simpatia

Depois de uma longa aula

Que houve naquele dia

Tentou visitar o Noca

Mas ninguém lhe permitia.

Quando Noca saiu

Daquela grande prisão

Teria que dar uma aula

Sobre o apóstolo João

E depois só se ausentaria

Quando fosse a refeição.

No outro dia o Noca

Danado como ele era

Falou de toda Bíblia

De forma muito sincera

E uma voz lhe dizia:

- Leocárdio te espera!

Noca era inteligente

E o padre lhe atacava

Sempre pedindo coisa

E ele logo arrasava

Falava de Martim Lutero

E isto nunca agradava.

Todo tema que dessem

Ao Noca como estudo

Depressa ele estudava

De juízo grande e sortudo

Dava gosto de ouvir

Ele falar daquilo tudo.

Leocárdio num dia de sol

Foi a Noca explicando

Que sentia algo estranho

E dele estava gostando

Lhe pediu um beijo

E foi ali se chegando.

Noca ficou muito vermelho

E na cabeça deu um nó

Olhava pra Leocárdio

E pediu pra ficar só

Naquele instante o Noca

Entrava numa pior.

Além do padre Bento

Que tanto lhe perseguia

Leocárdio não dormiu

Naquele singelo dia

Rolando naquela cama

Pouca coisa lhe restaria.

Tomou o café da manhã

E Leocárdio por perto

Tentava dizer a Noca

Que ele estava certo

Que os dois podiam fugir

Até para o deserto.

Neste momento o miolo

Foi jogado fora

Noca ia se perdendo

Pensando ir embora

E o padre Bento

Lhe deu um grande fora.

Noca foi para o quarto

E nada quis entender

Pensou em se matar

Mas não quis isto fazer

Ficou ali chorando

E foi procurar saber.

O juízo já em decadência

Noca ia se debatendo

Só fazia ler grandes livros

E somente sofrendo

Mas estava perto o dia

Leocárdio se oferecendo.

O seminarista só queria

Ter um caso com Noca

E chamava o menino

Pra brincar de toca

E dizia seu apelido

Na infância era o Doca.

O nome Leocárdio era

Diferente dos demais

Mas o apelido de Doca

Pegava bem pro rapaz

Naquele momento de guerra

Noca pensava na paz.

Noca era um apelido

Dado por um irmão

O seu nome de batismo

Era Pedro Sebastião

O filho do meio

Do senhor chamado João.

Chegou o grande dia

E Noca ali se formou

Faltava muito pouco

E tudo se confirmou

Ele saiu correndo

E Doca triste ficou.

Noca deu meia volta

E aplicou logo um beijo

Na testa do jovem Doca

Que tinha ali um desejo

E o padre Bento fedia

Tal qual um percevejo.

O convento todo fedeu

Com aquela suave cagada

O padre Bento se cagou

Vendo a testa beijada

Daqueles dois jovens

Que saíram em disparada.

A família daqueles meninos

Ficou se perguntando

O que tinha acontecido

E nada foi achando

O jovem Doca escondido

Com Noca ia se beijando.

Todo mundo ali ficou

Bastante envergonhada

Vendo o sonho de padre

Ali não dar em nada

Saiu dali confuso

Numa grande disparada.

O padre Bento sofria

Com aquela caganeira

Saiu do sanitário

Falando muita besteira

Estava louco o padre

Vivendo a sua leseira.

As irmãs do convento

Que distante moravam

Consola as famílias

Porque todos choravam

E naquele salão sem roupa

Os dois ali pararam.

Foi grande a decepção

E ninguém quis olhar

O pai de Noca queria

Com o filho falar

Mas pela mãe impedido

Só fizeram caminhar.

A mãe de Doca, coitada

Com isto tudo desmaiou

Foi acudida pela filha

Que até se conformou

Dizendo em alta voz

Que isto era amor.

Neste instante na sala

Algo estranho aconteceu

O padre Bento sofrendo

Deu um chilique e morreu

E Noca deu logo um grito

Que o convento estremeceu.

Doca chegou ali bem junto

E deu um beijo no Bento

E gritava pro povo

Que ele estava fedorento

E Noca por outro lado

O chamava de nojento.

Foi um dia terrível

No Convento São José

Todo mundo queria

Esculhambar com a fé

Ficava horrorizado

O povo que dava no pé.

No fundo da questão

Alguma coisa estava louca

Noca e Doca desnudos

Só beijavam na boca

E botava na cabeça

Do padre Bento a touca.

Os dois se afastaram

E começaram logo a brigar

Queriam despir o padre

E só faziam chorar

A família então voltou

E seu filho foi abraçar.

O padre Bento despido

E a irmã safada espiando

O tamanho do falo

E foi ali se chegando

O pessoal do convento

Foi aquele corpo tirando.

A família de Doca saiu

E não quis o filho levar

Enquanto isto o Noca

Queria somente gritar

Pegou a sua Bíblia

E começou a pregar.

A família de Noca pegou

O filho pelo braço

Pegaram o seu transporte

E deram um grande abraço

Dizendo que o filho era padre

E não houve nenhum fracasso.

Noca era inteligente

E daquilo nada sabia

Esqueceu seu passado

E de toda melancolia

A família foi importante

Lhe dando muita alegria.

Doca ficou hospedado

Naquele grande convento

Substituiu logo depois

O famoso padre Bento

É isto que tenho agora

Por este exato momento.

Noca ficou tão doido

Que esqueceu o pai João

Quando o pai entrava em casa

Ele falava da maldição

Gritava com aquele homem

Que ficava só na aflição.

A família chorava calada

E a Deus tudo entregava

O filho fazia só ler

E muito ele estudava

Era um crânio de inteligência

Mas nada se aproveitava.

Noca não soube mais

Controlar sua mente

Ficou ali tão doido

Visto por muita gente

Com um livro na mão

E boca na aguardente.

O filho de Seu João

Do grande Armazém Lotado

Ficava ali conhecido

Como o Padre Abilolado

Que dava missa ao povo

De todo aquele povoado.

E assim o Zé Machado

Viu o Cordel se publicar

Com o drama que ele tinha

Que era tema popular

O leitor então agradeceu

E vai a todo mundo contar.

FIM

João Pessoa-PB, 18 de junho de 2019.

BENTO JUNIOR
Enviado por BENTO JUNIOR em 31/08/2024
Código do texto: T8141181
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