O GALEGO DO SACO
Este Cordel Brasileiro
Também pode divulgar
Histórias que são contadas
No mundo tornam vagar
É Antônio Serafim
Que fez isso propagar.
Em Cruz das Armas viveu
Pelo povo sonegado
Naqueles longos cabelos
Pelo tempo castigado
Esse popular Antônio
É o tal saco rasgado.
No saco de tantos sonhos
O Galego foi papel
Da peça sem diretor
Do time sem ter plantel
Antônio depois de tudo
Pensou servir o quartel.
Dessa face mal tratada
Seu saco criou buzina
Andando pela cidade
Nunca tocou concertina
Seu saco foi motorista
Na direção fedentina.
Os ônibus da cidade
Só causaram confusões
O fedor daquele Ser
Lacraram os empurões
Que ninguém mais aguentava
Brigas e muitos sermões.
Passageiros pessoenses
Só falavam no fedor
Daquele senhor queimado
Que sem ter nenhum pudor
Quer descer da Lotação
E seguir a própria dor.
Chamado de sobrenomes
Sete Capas, Rasga Rua
Esmoler, Velho do Saco
Ou Papa-Figo da lua
Também de Bicho Papão
Vestido de pele nua.
Em Oitizeiro se via
Aquele cabra com saco
Que carregava nas costas
O que não valem um caco
Papelões e bugigangas
Debaixo do seu sovaco.
Trafegando pelas ruas
Antônio foi personagem
Nesse Jardim das Acácias
Fez nascer tanta paisagem
Dormindo dentro de Banco
Tentou se ver em miragem.
Lembro-me bem pequenino
Um senhor passando rindo
Eu sem nada perceber
Bem calado me sentindo
Depois de grande já vi
O meu sentir insistindo.
Insisti diversas vezes
Pensando ser um perigo
Saber por onde passava
O famoso Papa-Figo
Que no passado deixei
Naquele grande jazigo.
Pensei tivesse morrido
O cabra que dava medo
Pelo papo de família
Esse não é um enredo
Antônio vivia solto
Era pra mim um segredo.
Segredo que me causou
Bastante contemplação
Já grande tentei rever
Singela recordação
Daquele senhor do saco
Que não tinha maldição.
Antônio é um andante
Pelas ruas da cidade
Se postando nas igrejas
Pra contar tanta verdade
Com o saco sob as costas
Pensando na caridade.
Homem do Saco tem fama
Nobre figura folclórica
Toda cidade conhece
Esse Ser de vida histórica
Que nunca quis se casar
Nessa senha metafórica.
Quem nunca soube do fato
Por favor pesquise certo
Tem documentos gentis
O segredo vem de perto
Antônio tem saco cheio
Do seu viver tão deserto.
Passando por tantos bairros
Antônio não quis festança
Só quis ser reconhecido
No silêncio da criança
De falatório pequeno
Jamais pensou na vingança.
Os nobres contemporâneos
Sabem que falta respeito
Gente que falha constante
Adepta do preconceito
Não consegue ver a vida
Faz tudo de qualquer jeito.
Discórdias familiares
Pesa numa consciência
Em Antônio floresceu
Perdendo vã paciência
Pensou viver nesse mundo
Usando da inteligência.
Antônio rasgando ruas
Nesse pomar dos jardins
Desbravando sentimentos
Das flores rosas jasmins
Com tantas roupas sob outras
Foi folclore curumins.
Por decepções amorosas
Tantos deixam de viver
Preferem fugir do tempo
Não querem mais conviver
Se debandam pelo mundo
Pro povo se comover.
Antônio figura simples
Com tantas coisas expostas
Cabisbaixo perambula
Com grande saco nas costas
Nunca foi bicho papão
Foi gente das mais dispostas.
As histórias desse velho
Dessas questões financeiras
Tantas mentiras faladas
De mulheres cangaeiras
Antônio foi passageiro
Nunca foi das bebedeiras.
No decorrer dessa vida
Antônio não falou mais
As suas desilusões
Foram visões anormais
Segredos dentro do saco
Ninguém saberá jamais.
Antônio é andarilho
Das ruas sem documento
Não quer endereço certo
Nem precisa fingimento
Seu comparsa é um saco
Pra livrar seu sofrimento.
Com cabelos cacheados
Nesse corpo dolorido
Toinho do Saco descobre
O que tem lhe permitido
Caminhar pelas estradas
Sem sinal e sem sentido.
Antônio velho do saco
Morador frágil do mundo
Habitante dessas praças
No seu viver tão profundo
Rasga Rua caminhando
Nunca foi ser vagabundo.
Seguindo por tantas vilas
Num olhar que sempre brilha
De um acidente é vítima
A moto cruza sua trilha
Nos seus últimos instantes
Surge porém a partilha.
Uma sobrinha do velho
Leva seu tio pra cuidar
Antônio não vai pra rua
Tem tanto sonho pra dar
Naquela nova morada
Higiene não vai descuidar.
Unhas, cabelos e barba
Para passar o Natal
Antônio vai tomar banho
Tudo se fará vital
Saúde não tem mais saco
Que quase lhe faz letal.
Comentários desse povo:
- Por onde passas Antônio?
Naquele saco pesado
Terá sido matrimônio?
Perguntas desta maneira
Instigam seu patrimônio.
Afastado por dois anos
Dessa rua tão brilhante
O velho dessas andanças
Tem infarto fulminante
Com seus oitenta e dois anos
Foi morar num lar distante.
FIM
João Pessoa-PB, 22 de agosto de 2024.