JULIANO DO BAIÃO
Senhores, muita atenção!
Uma história vou narrar,
E também versos cantar,
Nascidos da Inspiração
Sob o sol do meu sertão!
Vou versar em linha reta
E de uma forma discreta,
Neste primeiro momento
Eu canto o meu cumprimento:
– Boa noite do poeta!
Para começar a história
Apresento o nosso herói:
Juliano, de Totói
E de Maria da Glória.
Neto de Dona Vitória,
Na meninice infantil,
Juliano um dia ouviu,
Numa cantiga de roda,
Um baião que era moda
Lá nos sertões do Brasil.
Foi como um sino tremente
Que moveu seu coração!
Despertou para a canção
Que nascia livremente...
Mas ele era somente
Semente de nordestinos,
Igual a outros meninos
Na secura da caatinga.
– Semente que pouco vinga
Plantada em outros destinos.
Mesmo assim essa criança
Ao ouvir Luiz Gonzaga
Sente que a sorte lhe afaga
E lhe enche de esperança!
Guarda, então, na lembrança
Aquela sanfona branca,
Contando que a sorte franca
Venha um dia lhe buscar
Para que possa voar
Nas asas da Asa-Branca.
Corre o tempo, corre ano,
O ideal não se esquece,
A ciranda permanece
Na canção de Juliano,
Que já compõe e faz plano:
Como um poeta veneto
Quer tocar em outro gueto
Trovas de um cantador,
Cujos versos, meu senhor,
Tem a dor do Assum-Preto.
Chega o dia! Nasce a aurora!
“Benção mamãe e papai,
O pau-de-arara já vai
Levar o seu filho embora.
É para São Paulo agora
Que segue este seu menino
E se não der desatino
Na sorte que me sustenta,
Lá pelos anos setenta
Eu mudo o nosso destino!”
Corta o sertão, desce serra,
O caminhão pau-de-arara.
Prende sua rede na vara,
Solta o olhar sobre a terra
Como quem parte pra guerra
Para nunca mais voltar.
Lembra da mãe a chorar...
Do pai, a imagem calada
Mistura no pó da estrada
Em cada sacolejar.
São Paulo do Bandeirante!
(Três semanas, mais um dia...)
Depois de muita agonia
O nosso herói retirante
Pisa esse chão confiante,
Onde, com garra e vontade,
Quer lutar nesta cidade,
Trabalhar, suar, sofrer...
Semear dons e vencer
Pra colher felicidade!
Mas a tal felicidade,
No concreto e no asfalto,
Custa um preço muito alto,
Rimando com realidade
No poema da cidade:
Não basta o som do baião
Cantado com o coração
E nem ter carta na manga
Nos bares da Ipiranga
Ou da Avenida São João.
Juliano retirante
Olha pro céu, pensa a vida...
“Será que a sorte esquecida,
Esqueceu-me nesse instante?”
Sem rumo nem horizonte,
Mais idade, alma vazia,
Nas vagas da nostalgia
Retrata o solo sagrado
Do seu Nordeste velado
No verso da poesia!
Nasce, então, do sofrimento,
O seu baião – obra-prima!
Fruto da dor e da rima,
Revela brio e lamento,
Traduz alma e sentimento
Do valente nordestino.
Tem, assim, nosso menino
O seu ponto de partida;
Ganha cores sua vida
Nos matizes do destino.
...E assim era uma vez
Um pequeno retirante,
Da música, um amante
Que na música se fez.
E pra contar pra vocês
O epílogo da história
Do filho da Dona Glória
E do “seu” Mané Totói,
Meu pensamento constrói
O seu cenário final:
Numa Escola Musical
Juliano se formou,
Criou versos e gravou,
E cantou num recital.
...E além de tudo isso
Encerrando o compromisso
Da minha composição,
Revelo, de coração,
Que o nosso herói encantado,
Ao cantar o seu sertão,
Deixou seu nome gravado:
Juliano do Baião!
S. Garcia Vilches (SGV)
(Buritis, 26/02/2012, ...lá pela madrugada
adentro, na hora da poesia)