SEU ZÉ DO FITEIRO
É importante dizer
Nessa não vou me calar
Vou botar neste papel
E vai ser bem popular
Este Cordel Brasileiro
Dum tal de Zé do Fiteiro
Que não pode macular.
Neste cordel vou falar
Daqueles que são manés
Desses que vivem batendo
Nos fiteiros que são chalés
Eu vou começar falando
Se me lembro vou anotando
Aqui dentro dos cabarés.
Conheço tantos Josés
José de modo festeiro
Nome, como sobrenomes
Gente que foi carpinteiro
No meu tempo de menino
Já traçando meu destino
Conheci Zé do Fiteiro.
De produto barateiro
Seu José tinha de tudo
O fiteiro sempre limpo
Daquele senhor sortudo
Com sorriso no seu rosto
Vendedor pra tanto gosto
Bem me lembro dum cascudo.
Foi na cabeça de Mudo
Que de fato sucedeu
Só porque Zé do Fiteiro
Tão depressa respondeu
As lorotas do sujeito
O Mudo ficou sem jeito
Veja só como se deu.
Mudo todo se mordeu
E foi contar pra Raimundo
Este era o pai do Mudo
Que nutria um amor profundo
Seu Zé com bastante medo
Pensou que fosse segredo
Mas caiu na boca do mundo.
O valente Seu Raimundo
Não gostou da situação
Pegou Seu Zé pelo braço
E foi jogar maldição
Seu Zé tremia tanto
Rezava por todo santo
Mas não teve salvação.
O Mudo na devoção
Bate palma pro papai
Que dos braços dele
Este cabra nunca sai
O fiteiro todo sujo
Foi tapa no dito cujo
E lá na frente o bicho cai.
Seu Zé do Fiteiro vai
Pegar tudo que restou
Sobraram foi pouca coisa
E a molecada gostou
Mudo tomou guaraná
E o resto por onde está?
A meninada degustou.
Zé no canto se postou
Chorava feito menino
Mudo ficava imitando
Dizendo: - Tome cretino!
Raimundo todo no brilho
Não mexesse com seu filho
Pois, sofrer era o destino.
Zé do Fiteiro sem tino
Sem saber o que fazer
Nunca mais deu cascudo
Acabou com esse prazer
De Raimundo só lembrança
Chorava feito criança
E nunca mais fez lazer.
O que eu posso te dizer
É algo que não se faz
Zé trabalhou com vontade
Só falava fazer paz
Ficou sempre revoltado
Quase sendo atropelado
Pelo carro de seu Braz.
Brabeza não satisfaz
O Seu Zé depois falou
Enxugando seu nariz
Pelo um tempo se calou
Mas teve que dizer tudo
Já amigo daquele Mudo
Uma trama ele bolou.
Mas nada disto colou
Porque somente temia
Mentindo pra meninada
Se mostrou ter anemia
Tudo criação do Zé
Que nisto levando fé
De nada o sujeito sofria.
Depois uma pneumonia
Foi criando pra todo mundo
Não sabendo que já era
Procurado por Raimundo
Seu Zé começou mentir
E tudo fez refletir
Quando quis ser vagabundo.
Naquele gostar profundo
Pelo resto do fiteiro
Seu Zé procurou Raimundo
E se passou por barateiro
Para o fiteiro vender
A quem fosse pretender
E quis voltar ser porteiro.
Seu Raimundo bem ligeiro
Foi dizendo que não quer
Duma forma tão grosseira
Para tristeza qualquer
Do fiteiro só a saudade
Daquela grande maldade
Pode contar quem quiser.
Nunca teve uma mulher
Na vida desse senhor
Tinha dinheiro em conta
Numa caixa de penhor
Uns trocados que ele tinha
Comprou terra em Costinha
E foi doar por Monsenhor.
Seu Zé não quis ser terror
Mas foi beirando caminho
Sido desmoralizado
No coração criou espinho
Se fazendo de bondoso
Se mostrou habilidoso
Com traje todo de linho.
A voz toda de carinho
Seu Zé logo foi construindo
Com o dinheiro do Monsenhor
O cabra ficou sorrindo
Um fiteiro muito melhor
Comprado com o suor
Um novo ser foi surgindo.
Seu legado de mentira
Fez de Zé um bandoleiro
E passou a dizer que era
Devoto de cangaceiro
Os moleques sem saber
Jamais iam perceber
A maldade do trapaceiro.
Numa noite de janeiro
Seu Zé quis e planejou
Um incêndio terrível
E ele nem pestanejou
Raimundo quase tem morte
O Mudo não teve a sorte
E as chamas não manejou.
Seu Zé tanto ódio esbanjou
Vendo Mudo todo queimado
Naquele chão descoberto
O seu corpo tão marcado
O pai Raimundo chorava
A Seu Zé ele implorava
Deixasse o filho sentado.
O fogo todo pesado
As chamas por toda casa
Deixava o Mudo gritando
Com o corpo todo em brasa
Seu Zé virou uma fera
Destas que ninguém espera
E na desordem ele arrasa.
O Mudo nas costas tem asa
Que sai voando da sala
O pai não consegue entender
E no canto apenas se cala
Seu Zé matava um anjo
Que tocava num banjo
Recuperando sua fala.
Raimundo saca uma bala
Que bate direto no peito
Seu Zé sem vida no chão
As chamas fazem o efeito
Naquele dia tão triste
Raimundo ainda insiste
Ver Mudo de qualquer jeito.
Guerra não será meu pleito
Gosto de paz e ternura
Aquela dupla de seres
Causaram muita amargura
Seu Zé morrendo de arma
Uns disseram ser seu carma
Se vender por tanta loucura.
Seu Zé, que vil criatura
Aquele criador de história
Dono dum grande fiteiro
Que só resta a memória
Seu Raimundo também se foi
Numa chifrada de um boi
Foi direto pros braços da Glória.
Foi no tempo da palmatória
Bem antigo por sinal
Esse fato melancólico
Dum cabra quase animal
Construiu a sua vingança
Matando uma criança
Lá pras bandas de Sobral.
Naquele simples jornal
Estampava bem na capa
Notícias daquele crime
Cravado dentro do mapa
Zé do Fiteiro assassino
Também teria o destino
Só por causa de uma tapa.
Dois seres daquela lapa
Se passando por ruindade
Matando um ao outro
Mas que baita crueldade
Zé do Fiteiro de bala
Seu Raimundo sem fala
No terror duma cidade.
Vou terminar de verdade
Este singelo cordel
Feito pra Zé do Fiteiro
Que fez da vida bordel
Morreu sem deixar saudade
O que fez foi só maldade
Com Seu Raimundo bedel.