HOJE, INDA USO A PANELA / DEIXADA POR MINHA AVÓ
HOJE, INDA USO A PANELA
DEIXADA POR MINHA AVÓ
Autor: Evaristo Geraldo
Quando vovó Joaninha
Fez da sepultura o teto,
Deixou um baú repleto
De utensílios que ela tinha:
Louça, panela, quartinha,
Um surrado paletó,
Rosário de conta e nó,
Brincos que ela usou donzela.
Hoje, inda uso a panela
Deixada por minha avó.
Mamãe ganhou por herança
Dos seus adorados pais
Objetos pessoais
Como lenço e aliança,
Presilha de pôr em trança,
Monóculo duma lente só,
Argolas de um caritó,
Trinchete e par de fivela.
Hoje, inda uso a panela
Deixada por minha avó.
Inda lembro a vez primeira
Que eu vi o velho baú
Ornado com couro cru,
Tábuas de nobre madeira,
Broches na parte traseira.
Baú grande, igual trenó.
Dizem que ele era o xodó
Da vovó, mulher singela.
Hoje, inda uso a panela
Deixada por minha avó.
Quando na saudade esbarro,
Pego coisas do baú...
Na cuia boto beiju,
Coalhada em prato de carro.
E de um cordel clássico narro
História de homem bocó;
Depois, João Grilo e Chicó,
Também Valentão Vilela.
Hoje, inda uso a panela
Deixada por minha avó.
Mamãe guarda com carinho,
Do baú, as raridades.
Pra fazer suas vontades,
O que restou dele, alinho.
Hoje, esse baú de pinho
O cupim fez virar pó,
Então mamãe diz: “Faz dó
Perder relíquia tão bela!”
Hoje inda uso a panela
Deixada por minha avó.
Com outros itens, porém,
Uma panela ficou.
Da herança que deixou
Vovó, que eu quis tão bem.
A saudade logo vem
Se preparam um bobó,
Um cozido, um mocotó
Ou outra iguaria nela,
Na tão antiga panela
Deixada por minha avó.
FIM