A fila do Céu
Uma vida é pouco pra que tudo seja feito.
Dizem, e eu acredito fazendo o sinal da cruz,
Que para ter outra não precisa dois corações no peito.
Basta conhecer os tais Mandamentos e deles fazer jus.
Dito assim parece fácil como acender e apagar a luz.
O “além” é tema polêmico e sempre causa intriga.
Imaginem o furdunço na recepção do Céu.
São Pedro que o diga!
A fila é enorme e muitos dormem ao léu,
Mas todos se dirigem confiantes à divina Portaria.
Ocorre que Pedro e seus assessores, todos cansados,
Já não concordam em punir certos pecados.
Dizem até que ele pediu transferência de secretaria.
E a oposição logo comemorou a especulação,
Espalhando o boato de que um terceirizado,
Ligado à bancada evangélica o substituiria.
Coitado do pobre ancião!
E olhe que ele foi indicado por Maria!
O que Pedro quer é fazer a fila andar.
Ele acha que com rigor poucas almas irão se safar.
Que é melhor fechar os olhos e deixar a boiada passar...
Mas o risco com essa liberação geral
É que Pedro, mesmo bem-intencionado,
Mas estressado e enxergando mal,
Deixe entrar o cabra errado.
Aí vai sobrar para o Todo-Poderoso,
Que é misericordioso, mas muito criterioso,
Ele sabe, sim, quem merece nova oportunidade.
Do pecador Ele analisa os fatos e a intenção,
Em seguida confronta com a idade,
Para saber se o cabra estava ciente ou não.
Depois aplica as regras, que são simples e claras:
Amor, perdão, fé e pouco pecado,
Está escrito na faixa bem no meio da recepção.
Sem esse kit as indulgências são raras.
Não quero me meter, mas SIMPLES não são, não!
Quem é que destina amor sem segunda intenção?
Quem revela fé em quantidade
A ponto de só pregar a verdade?
Fora isso, são raros os que perdoam com facilidade!
E pecados? Quem os tem em dedos de uma só mão?
Olha, a coisa tá feia e muitos serão sentenciados.
Alguns podem até ter seus processos revisados,
Porque seus causídicos apelarão:
“Deus sempre prometeu o perdão! ”
Malandros, sabem que seus ‘clientes’ são culpados,
Mas, como de hábito, se fazem de pobres coitados,
E recorrerão: “As regras antigas caducaram e as novas não foram publicadas.
Portanto, não podem ser aplicadas muito menos cobradas! ”
Ah, os rábulas de almas, acham que perdão é recurso final,
Insistem que só se deve usá-lo no purgatório,
Perante o Divino Tribunal,
E agravarão: “os que acusam gostam mesmo é do falatório,
E nem sabem o que é perdão! ”
Caras de pau!
Até na hora crucial
Esses picaretas usam a tapeação
Para revestir o pecado de razão,
Dando-lhe até jurisprudência.
Quanta bestialidade!
Pois é aí que O Homem surge outra vez, com altivez e sapiência,
Para dizer que o perdão é caminho obrigatório,
O único que leva ao Reino do Céu e à Eternidade.
Que acolherá seus filhos pecadores,
Mas muitos passarão uma temporada no purgatório.
Os que desprezaram Sua palavra, se arrependidos, voltarão.
Desta vez para pregá-la com humildade, fé e solidariedade,
Valores indispensáveis à humanidade.
Renunciarão à soberba, à vaidade e à luxúria,
Seguirão regras simples, possivelmente em outro ambiente,
Onde irão combater a mentira, o ódio e a injúria,
E lá deixarão exemplos de uma vida digna e descente.
Portanto, moçada, vai aí um conselho de irmão:
Um dia todo mundo vai ter que descascar seu pepino,
O sujeito pode até pecar, mas não pode rifar o destino.
Vamos entrar na fila precisando de um simples perdão,
Nada que tire a paciência do Divino.