O DOIDO DA PEDRA
As inseguranças do adulto
e as feridas da sua alma,
Muitas de ambos têm sua raiz
na infância que foi atacada;
Pelas atrocidades do destino
que através do algoz do menino
dilacerou a sua alma.
Um dos meus algozes era
conhecido por Arthur de Preta,
Jovem alto que morava
no município do Teixeira;
Ele era um rapazão alto
dentuço e de corpo claro
e cara não muito feia.
Arthur de Preta porque sua mãe
a senhora Preta era professora,
Mulher de caráter e assertiva,
tinha a índole batalhadora
Quanto ao filho, não se podia
dizer o mesmo dessa pessoa.
Arthur era um cara folgado
e também perspicaz,
já que não tinha a coragem
de se meter com qualquer rapaz;
Ele escolhia as suas vítimas
e não as deixava mais em paz.
Toda vítima era esguia e baixa
e não sabia se defender,
Quem tivesse esse perfil
não poderia pagar pra ver;
Pois se o Arthur a pegasse
era certo que lhe causasse
um mal impossível de esquecer.
O problema era que eu e meus amigos
tínhamos em comum esse padrão,
Por isso quando estávamos brincando
tínhamos que manter a atenção;
Direcionada para o ambiente envolta
caso o Arthur aparecesse na hora
pudéssemos fugir de antemão.
Mas quando não era esse o caso
o Arthur nos pegava em cheio,
Fazia bullying com sua vítima
despertando no pimpolho sujeito,
Choro, raiva e vergonha
constrangimento e muito medo.
Num dia eu tava na Lan House
em pé vendo duas meninas jogar,
Até que Arthur apareceu
e puxou com toda força que há,
Meu short e minha cueca pra baixo
e as risadas subiram no ar...
...que era das duas meninas e das outras pessoas
que estavam no estabelecimento,
Vendo-me pelado da cintura pra baixo
apontavam a todo momento;
Pro meu pinto, enquanto diziam
que até aquele ponto da vida
nunca viram algo tão pequeno!
A maioria das agressões do Arthur
nesse lugar tinha se passado,
Você verá que esse pervertido
é uma sombra do meu passado;
E se este cordel escrevo
é para me libertar desse pesadelo
que meu insconciente tem carregado.
Outro dia eu tava sentado
na Lan House jogando,
PlayStation 2 e senti
nos meus ouvidos penetrando,
Algo viscoso e bem molhado
e rápido me mexi pro canto.
Era o desgraçado do Arthur
que tinha cuspido nos dois dedos,
Como sempre ele deu risada
ao invés de remorso pelo sujeito,
Ele mostrava sentir prazer
pelo seu perverso feito.
Noutro dia eu tava conversando
na calçada sentado,
Com Fábio até que Arthur
passou bem ao meu lado;
Ele tirou o meu boné todo
e o jogou sobre um toldo
deixando-o engalhado.
Baixar minhas calças e colocar
dedo cuspido no meu ouvido,
Além de engalhar meu boné
o Arthur muito fez comigo;
Sempre demonstrando prazer
ao manifestar no seu ser
comportamento pervertido.
Assim como muitos assistiam
ao que ele fazia comigo,
Também pude presenciar
ele agredindo meus amigos,
Fazendo algo que os deixava
completamente enraivecidos.
Um lugar que era comum
nas épocas de chuva sedenta,
Era irmos pro Açude Velho
afim de tomar banho apenas,
Pulávamos do calçadão
pra dentro da água barrenta.
E pro flecheiro ser bonito
o moleque tinha que correr,
Pra ele alcançar a parte funda
do açude e assim não bater;
Na parte rasa que ficavão
bem abaixo do calçadão
que era sete de você.
Uma vez Neném Gordin
tava em cima do calçadão,
Até que de dentro do açude
vi atrás dele uma aparição;
Lhe alertei mas não deu tempo
e eis que um acontecimento
deixou todos na aflição.
Arthur de Preta tinha aparecido
e empurrou ele na água,
Fazendo com que Neném Gordin
caísse na parte rasa,
E o grito agoniante dele
preocupou a molecada.
Levamos ele pro hospital Sancho Leite
e de lá ele foi pra Patos,
No dia seguinte eu o vi
ele com o pé engessado,
Isso porque o seu calcanhar
havia sido fraturado.
Cheio de raiva, Neném Gordin dizia
que ia pedir pro seu irmão,
Se vingar pelo que o Arthur
lhe fez sem remorso no coração;
Mas essa vingança prometida
até hoje não ganhou vida
morrendo na sua imaginação.
Ninguém gostava do Arthur
essa é a verdade da história,
Quem era do tamanho dele
era agredido de outra forma;
Geralmente com piadas
mas quando o outro não gostava
descontava da mesma forma.
Só que descontava de um jeito
que o Arthur por ali parava,
Quando ao invés de se resignar
o agredido contra-atacava,
Revelando o verdadeiro Arthur:
um covarde e um panaca.
Um exemplo dum caso desse
foi na festa do São João na praça,
Quando Arthur de Preta cometeu
o erro de fazer pirraça,
Dum rapaz chamado Cobra
Alérgico a palhaçada.
Cobra tinha acabado de sair da prisão
acusado de tráfico de entorpecente,
E o Arthur de Preta cometeu
o erro de aturdir a sua mente;
E tentou desonrar o cara
deixando-o com muita raiva
diante de muita gente.
Me lembro como se fosse ontem
quando o Arthur alto falou:
“Fiquei sabendo que lá na prisão
a putinha dos presos Cobra virou.”
Nessa hora o Cobra ficou rubro
e deu um chute com tudo
no chão o Arthur desabou.
Essa piadinha custou ao Arthur
um mês andando de muleta,
que encheu de alegria
os moleques do Teixeira,
Que torciam pra que o aleijar
durasse a vida inteira.
Só que o Arthur tinha a bença
dos poderes do capeta,
com o tempo se curou
abandonando as muletas,
E voltou a atormentar
aos moleques do Teixeira.
O que já vi Arthur fazendo com suas vítimas
a memória nunca abandonou,
Como catarrar na cabeça
e de ponta cabeça já colocou;
Um menino num tambor de lixo
e que fedia a merda e micho
quando nós o resgatou.
Um dia de manhã quando acordei
soube que Arthur havia sido assassinado,
Isso me deixou muito feliz
mas logo fiquei desanimado;
Ao saber que o Arthur morto
era um casto moço
e não O depravado.
Não eram só os moleques
as vítimas desse algoz,
A sua mãe Preta infelizmente
também estava entre nós,
A maior desonra dela creio
foi ter parido esse atroz.
A ficha que o Arthur acumulava
do tamanho dum rolo de papel era,
No conselho tutelar do Teixeira
devido às merdas que fizera,
De tão conhecido por isso
ganhou a fama de “Doido da Pedra.”
Porque na maioria dos casos
uma pedra o Arthur usava,
Pra quebrar vidro de carro
e outras coisas vandalizava;
também as usava pra lançar
em quem logo estaria já
com a cabeça enfaixada.
Todo mundo acreditou
que o capeta nele ia ser exorcizado,
Num dia que o Arthur
foi pra FEBEM do estado,
Após um caso que revoltou
os Teixerenses que ficou
completamente indignados.
Fiquei sabendo num dia
que após o recreio da escola,
A professora de Ciências, Jô Castra
entrou na sala e caiu na hora,
Após se sentar na cadeira
o assento desabou na hora.
O pior era que ela tava grávida
de sete meses era o barrigão,
Foi levada pro hospital
e a diretora na obrigação,
Inferiu que a cadeira foi trocada
após uma breve investigação.
A diretora pressionou os alunos
e finalmente um passarinho cantou,
E disse que foi o Arthur
que de propósito trocou;
A cadeira e após serem pressionados
muitos outros repetiram o relato
e a verdade se firmou.
Expulsão e ficha no conselho tutelar
pro Arthur deveria ter custado,
Se não fosse a tragédia
que logo teria se revelado;
A tragédia que viemos a saber
foi a perda do bebê
devido ao acidente causado.
Não sei como foi o processo
da vara da infância e da juventude,
Que culminou na prisão do Arthur
após ser tomada uma atitude,
Ele passou um tempo na FEBEM
e eis que de repente surge...
Eu vos adoraria falar
que o Arthur estava transformado,
Que tinha deixado de ser perverso
após deixar a FEBEM do estado,
Mas ele logo voltou a agir
como se nada tivesse mudado.
O único momento que pensei
que o Arthur havia mudado,
Foi anos após em que a escola
ele já tinha abandonado;
Caí na onda da maconha
cujo estado de lombra
me deixava anestesiado.
Fui eu, Arthur, Pompom e Daniel
fumar maconha no mato,
E durante a experiência
o Arthur tinha me respeitado;
Ele disse: “Nos meus tempos de escola
levava menina toda hora
pra foder dentro do carro.
Se lembram do carrão de mãe?
aquela Hilux bem luxuosa?
Nele fudi muitas novinhas
nos meus tempos de escola.”
Arthur ali me fez acreditar
que a mudança chegava na hora.
Mas logo fiquei decepcionado
ao ver que o Arthur não mudou,
Um dia ele beliscou a costeleta
Do meu cabelo e senti uma dor,
Tão forte que quando olhei pra ele
sorrindo do prazer que lhe causou.
Carlos Aleijadin era um cara
que tinha o juízo meio apertado,
Ficou aleijado de uma mão
após pular lá do alto;
Da Pedra do Cruzeiro
e cair de corpo cheio
dentro de um poço raso.
Em troca dessa façanha
ele ganhou uma motocicleta,
Até que um dia tava na praça
do Teixeira pilotando ela;
E ele ouviu a provocação
dum bando de beberrão
induzidos por Doido da Pedra.
Carlos Aleijadin foi tirar satisfação
e a quebradeira começou,
Socos, pontapés e cadeira voando
até que o Arthur golpeou
Carlos com uma barra de ferro
que caiu no chão e desmaiou.
O tempo foi se passando
e os moleques inda mais crescia,
Enquanto isso ia acontecendo
o Arthur atazanava nossa vida,
Até que um dia tomei coragem
e decidi agir com valentia.
Eu tava jogando videogame na lan house
já tinha dezoito anos de idade,
Eu tava bonito e arrumado
e perfumado por toda face;
Até que o Arthur começou a falar
que havia um cheiro de bosta no ar
e disse alto e com vivace:
“Aposto que é Iva!”
isso o meu ser ignorou,
Mas logo a fronteira
dos meus limites o Arthur ultrapassou;
Quando na perversidade dele
cuspiu no dedo indicador dele
e no meu ouvido penetrou.
Dei um murro na cara do algoz
e a peste deu um na minha cara,
Deixando o meu olho roxo
mas nesse ato a história acaba,
porque deixei de ser vítima
finalmente enfrentar o cara.
Ele não mexia mais comigo
vez e outra eu via essa alma perdida,
E as constantes observações que fiz
me levou a pincelar o quadro da sua vida:
Um vagabundo de autoestima frágil
viciado em drogas, cigarro e bebida.
Nenhum ser humano é perfeito
já que faz parte da natureza humana,
Oscilar entre atos de crueldade
e atitudes de bonança;
Mas o Arthur era uma exceção
já que pôr o mal em cada ação
era a sua aventurança.
Pra você que leu até aqui
pode até achar que esse relato,
Não se refere a um ser humano
mas a um personagem rotulado;
Mas entenda que no mundo real
pessoas que só fazem o mal
elas existem de fato.
Se o Arthur tinha ou não traços de psicopatia
não sou psiquiatra para julgar,
Mas como um medíocre pensador
lançarei uma questão no ar:
Se o mal é relativo
todos sabem relativizar?
Por mais que eu estivesse feliz vendo
a alma do Arthur sendo castigada,
Numa vida de vícios e inseguranças
se afogando na desgraça,
No fundo eu torcia pra que esse verme
se transmutasse em uma águia.
Só que essa metamorfose não ocorreu
tudo ainda mais piorou,
Na época lá no Teixeira
em que a epidemia do crack estourou;
Os noiados agiam em bando,
de casa em casa iam roubando,
e o Arthur de fora não ficou.
O tempo todo o pessoal comentava
que roubaram a casa de fulano,
Até que um dia
de repente fui passando;
No muro da vizinha Dona Graça
e ela de pé tava
ouvindo a outra mulher falando:
“Foi Arthur de Preta e outra pessoa”
ouviu Dona Graça achando absurdo,
Como alguém tinha a audácia
de quebrar a parede de seu muro,
Para roubar um tambor d’água
em pleno dia e não no escuro.
Dias após essa ocorrência
eu me mudei da Paraíba pro Sudeste,
Enquanto minha cidade Teixeira
estava em estado de S.O.S.
Devido à epidemia de drogas
que vitimava adultos e moleques.
Desde quando vim pra cá
passei a saber sobre o Arthur de Preta,
Vinha da boca dos meus irmãos
Que vez e outra iam a Teixeira;
E quando chegavam lá
eles começavam a comentar
sobre a realidade cabreira.
“Eu ia passando em frente de um bar”
meu irmão tinha comentado,
“Até que Arthur de Preta me convidou
pra eu me sentar ao seu lado;
Pra tomar uma breja com ele
e eu perguntei para ele
onde vendia cigarro.
‘Aqui nesse bar tem,
mas droga é só comigo’,
Na hora dei um corte no Arthur
vendo ele se fingir de amigo,
Só sendo idiota pra cair
na malícia do inimigo.”
Meu sobrinho mais velho do que eu
também não ficou de fora,
Um dia após chegar do Teixeira
no jantar começou a fofoca:
"Quando cheguei lá o filho do Assis
tinha acabado de sair pra fora...
...da prisão e o Assis me falou
que o seu filho morando tava,
Com o Arthur de Preta
numa pequena casa;
Lá no balde do açude novo
Assis foi nesse fundo do poço
e sua alma ficou chocada.
Porque na casa não tinha chuveiro
nem cabo de energia permaneceu,
Tomada, pia e torneira
tudo isso desapareceu;
Aqueles dois são noiados
e venderam desesperados
pra sustentarem o vício seu."
E o final desse cordel chega
no dia que eu tava em São Paulo,
E a minha irmã perguntou
se eu conhecia Gustavo,
De apelido Guguinha
e não o conheci de imediato.
Mas ela deu mais detalhes
e me lembrei dessa alma,
Um rapazinho delicado
de sensibilidade afeminada;
Que eu o via frequentemente
quando no Teixeira morava.
“É esse mesmo!”
a minha irmã me falou
E logo em seguida
o seu relato começou:
“Ele tocou fogo no próprio corpo
e no hospital se internou.
Antes dele fazer isso
o Guguinha falou pra mãe dele,
Que se ela não lhe desse dinheiro
ele queimaria o corpo dele,
Ela disse que não tinha
e o filho cumpriu a palavra dele.
O irmão do Guguinha disse
que se ele não sobreviver,
Vai se vingar de quem foi
responsável por isso acontecer;
Que é o Arthur Doido da Pedra
por quem Guguinha tinha uma queda
amor que não veio a corresponder.”
Três dias após essa notícia
a minha irmã, que redes sociais tem,
Deu-me a notícia
e na internet conferi também;
Que o Guguinha não resistiu
e dessa vida partiu
indo pro mundo do além.
Havendo o dia seguinte chegado
Eu fui na internet ver o local jornal,
Lendo a notícia ela dizia
Estava o Arthur de Preta no hospital
Na UTI internado após levar três tiros
I não descobriram o autor dos tiros e
Logo me veio uma reticências
Sobre a sina do Doido da Pedra:
O Deus errou ao escrever suas linhas tortas, ou
Nisso o Diabo acertou nas linhas retas...
Santo André, 13 de Junho de 2024