O Bom do Silêncio
Escutei dizer um dia
Uma frase verdadeira
E a peguei como ladeira
O mote da poesia.
Em procura da água fria
Fiz chegar a sua vez.
Vem com grande rapidez
O verso da letra santa:
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez.
É tão verdade, de fato,
Que eu ligeiro recordei
De uma passagem que eu sei
Que aconteceu lá no mato
Sobre a língua e o palato.
Numa época de aridez,
Secura extrema na tez,
Não se molhava a garganta.
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez.
Pra fome de gente ruim,
Sempre com barriga cheia,
Na merenda, almoço e ceia,
Minha vó sempre deu fim,
Mas ela odiava, sim,
Gente com a cinidez.
E quem não espera a vez
Já ficou até sem janta.
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez.
E o causo foi o seguinte:
Um tropeiro andava errante
Com sua tropa adiante
Até que na hora vinte
De comida foi pedinte.
De agrado, minha avó fez
Os pratos sem mesquinhez
Sem barulhos que se espanta.
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez.
Enquanto fazia o trato,
Escutava da cozinha
A voz que da sala vinha
Perguntando sobre o prato.
“Eita, mas que bicho ingrato!”
Foi grande a insensatez,
Cozinhou um goro indez
E jogou ao sicofanta.
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez.
Quando provou do banquete,
Cuspiu fora e se zangou
Pelo manjar que chegou.
Arrastou o tamborete
Dizendo sujo verbete,
Mas vovó com rigidez,
Rebateu sem timidez:
“Reclamar não adianta.
Silêncio é uma manta
Que protege a estupidez”.