QUÊNIA NO CANGAÇO

Havia há muito tempo

No sertão paraibano

Uma mulher tão forte

Que enfrentou o desengano

Era Quênia o nome dela

Filha de um pernambucano.

Morava em Conceição

E trabalhava no roçado

Nunca teve coisa com homem

Chamava tudo de abestado

Foi assim que Dona Quênia

Viveu assim o seu passado.

O seu pai pernambucano

Lhe deu boa educação

Mandou cedo pra escola

Com toda satisfação

Sabia ler e contar

Isto só foi a lição.

Na escola onde estudava

Uma aula nunca perdeu

Tirava tão boas notas

Sempre dez ela mereceu

O valor daquela aluna

A professora reconheceu.

Era uma boa aluna

Da Escola Municipal

Com o título de campeã

Se botou o Juvenal

Um aluno muito chato

Que veio então se dá mal.

Quênia lhe deu uma tapa

Que a sala quase cai

Recebeu advertência

Foi chamado o seu pai

Ficou dois dias em casa

E depois pra escola vai.

O aluno Juvenal

Era mesmo o capeta

Quando Quênia voltou

Ele trouxe uma marreta

E gritava feito louco:

- Você é uma caceta!

Este aluno recebeu

Uma grande suspensão

Ficou uma semana

Dentro daquele casarão

O cabra era o filho

Mais novo de Sebastião.

Sebastião era o dono

Das terras daquele povo

Chamou o pai de Quênia

E deu ordens de novo

Que se ele brincasse

Melaria ele de ovo.

O velho pernambucano

Ficou só escutando

Disse então para a filha

Que ela estava lhe matando

Criando muita encrenca

E ele se acabando.

Quênia ouvindo aquilo

Ao pai pediu perdão

Disse com todas as letras

Que seguiria a lição

Que Juvenal não se metesse

Em mais uma confusão.

O menino Juvenal

Voltou para estudar

Desta feita não zombou

E foi direto ao beabá

Atrasado na cartilha

Tinha que se adiantar.

Quênia já tinha nota

Era certa a aprovação

Mas estudava muito

Mesmo sem precisão

No recreio da escola

Deram nela um empurrão.

No meio daquela gente

Foi difícil perceber

Três meninos de outra turma

Quis então lhe bater

Ela partiu pra briga

E quase veio morrer.

Quando ela deu uma tapa

Recebeu uma de volta

O sangue logo saiu

E correram pela porta

A Quênia toda doída

Parecia que estava morta.

A diretora escolar

Pediu assim ao inspetor:

Vá buscar o aluno

Que tudo começou

Prepare uma suspensão

Que hoje mesmo eu dou.

A sala da direção

Ficou bastante lotada

O aluno da outra turma

Tinha o apelido de Lapada

Era magro que só vendo

O jeito do camarada.

Ele disse sem medo

Que ele não era Juvenal

Que se Quênia se metesse

Ia com ele se dá mal

Porque ele era na escola

Quem mandava coisa e tal.

A diretora não gostou

Daquilo que estava ouvindo

Da boca de um moleque

Que estava se assumindo

Mandou chamar seu pai

E este ficou sorrindo.

Neste instante a Quênia

Olhou meio desconfiada

Pediu até desculpa

Ao dito cujo Lapada

Mas este não ouviu

Como se não fosse nada.

Lapada era um menino

Que no olho não encarava

Só falava olhando pra baixo

E pra ninguém ele olhava

Quando era do interesse

Ele de longe espiava.

Todo mundo ali dizia

Que parecia um cangaceiro

Só faltava botar a roupa

E ter o título de bandoleiro

Mas não foi seu destino

Deste cabra desordeiro.

Chegou o final do ano

E Quênia toda feliz

Ia pra outra turma

Que sempre ela quis

Foi gozar as suas férias

Na cidade de São Luiz.

O pai todo contente

Este presentou lhe ofertou

Uma viagem ao Maranhão

Conhecer o seu avô

Que ao receber a neta

Muito surpreso ficou.

A avó tinha morrido

Há dois anos atrás

Da doença tuberculose

Que matou gente demais

E Quênia em São Luiz

Só queria era a paz.

Um rapaz desta cidade

Ficou logo lhe paquerando

Ela deu um belo sorriso

E foi ali se chegando

Quando o avô foi na sala

O casal estava se atracando.

Quênia ficou morta

Com aquela situação

Pediu desculpa ao avô

E queria a permissão

Pra namorar com o rapaz

Que estava se beijando.

As férias terminaram

E Quênia depressa voltou

Queria encontrar o pai

Mas veja só o que encontrou

A roça pegando fogo

E o pai nela entrou.

Foi o capanga que teve

Do dono a permissão

Estas terras pertenciam

Ao Coronel Sebastião

O pai do Juvenal

Que gostava de confusão.

Quênia sabendo disso

A cabeça logo ferveu

O sangue subiu ligeiro

Quando o pai dela morreu

Incendiado na roça

O mundo pra ela escureceu.

O Coronel Sebastião

Que era um ricaço

Disse para a menina

Que deixasse aquele espaço

Foi aí que Quênia entrou

Tão depressa no cangaço.

A primeira providência foi

Naquele primeiro inverno

Mandar aquele coronel

Diretamente pro inferno

Montado em seu cavalo

Com seu valoroso terno.

BENTO JUNIOR
Enviado por BENTO JUNIOR em 21/05/2023
Reeditado em 23/09/2024
Código do texto: T7793359
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