UM PAVÃO MISTERIOSO NO BAÚ DA MINHA VÓ
Quando nós somos pequenos
Ouvimos lindas histórias
Ler romance é bonito
De tantas dedicatórias
Um pavão misterioso
Fica nas nossas memórias.
Na lembrança de menino
Das brenhas do rococó
Histórias eram contadas
Pra cabeça dá um nó
Um pavão misterioso
Vem pro baú de vovó.
Nesse baú literário
Tanto drama popular
Donde chegou tal pavão
A vovó quis completar
- Um pavão misterioso
Espere que vou contar!
Minha vó bem educada
Senhora de grande fé
Sentada num tamborete
Presente de seu Mané
- Um pavão misterioso
Quem escreveu foi José!
No pirralho bem traquino
O José ficou gravado
Sabendo daquela trama
Se sentindo contemplado
Um pavão misterioso
Lhe deixava mais vexado.
Querendo saber depressa
No seu pensar infantil
Viajou com as palavras
Por todo nosso Brasil
Um pavão misterioso
Neste céu de cor anil.
Tudo que vovó falava
Na mente tinha festança
Vislumbra cada detalhe
No riso duma criança
Um pavão misterioso
Numa casual herança.
De tão guri me perdi
Lembro toda nostalgia
É que distante da gente
Lugar chamado Turquia
Um pavão misterioso
O que mesmo se fazia?
Um velho turco ricaço
Viúvo cheio de grana
O pai de dois solteirões
Gente feliz e bacana
Um pavão misterioso
De plumagem soberana.
Evangelista mais moço
Quando velho pai morreu
Na fábrica de tecidos
Sozinho permaneceu
Um pavão misterioso
Tanto voo conheceu.
Este viúvo morrendo
Filhos dividem riqueza
Os dois querendo casar
Buscam moça de beleza
Um pavão misterioso
Enfrenta tanta proeza.
Da Turquia para Grécia
Tantas léguas percorrer
O ricaço viajou
Querendo desparecer
Um pavão misterioso
Num sutil acontecer.
Tanto capital na mão
O coração sem guarida
Na Grécia, João Batista
Sonhava com nova vida
Um pavão misterioso
É causa de despedida.
Pensando no bom irmão
Este mais velho Batista
Na Grécia comprou retrato
Pro jovem Evangelista
Um pavão misterioso
No solo capitalista.
Daquele simples retrato
Fez fluir a compaixão
No país chamado Grécia
Tinha nele só paixão
Um pavão misterioso
Para caber num caixão.
Evangelista feliz
Vai para terra do conde
Encontrar-se com a moça
Que seu pai tão mal esconde
Um pavão misterioso
Pras soluções já responde.
Como cabra corajoso
Fizeram grande viagem
Adentrando no sobrado
Encontraram tal imagem
Um pavão misterioso
Que dupla pra ter coragem.
Quando falamos de dupla
Me permitam ir mais fundo
Quem fez este tal invento
Chamava senhor Edmundo
Um pavão misterioso
Maior achado do mundo.
Um pássaro colorido
Este, talvez raptador
Pra dar garra da condessa
Nesses momentos de dor
Um pavão misterioso
Precisei ser um condor.
Sem ser avião noturno
A máquina bem voava
Chega naquele telhado
Bem milagrosa pousava
Um pavão misterioso
Numa descida pulava.
Mais de quatro vezes, sim
Pilotando maquinário
Evangelista lutando
No fiel imaginário
Um pavão misterioso
Não fez ninguém ser otário.
O conde já derrotado
Vendo Creuza, sua filha
Nos braços daquele turco
E seu comando não brilha
Um pavão misterioso
Voa numa sutil ilha.
O casal segue viagem
Pra Turquia vão voando
Creuza com Evangelista
Brevemente se casando
Um pavão misterioso
Cem anos vão se passando.
O conde triste morreu
Viúva fez um pedido
Quisera filha de volta
Com genro desconhecido
Um pavão misterioso
Assim fez o prometido.
Com olhos arregalados
Quis saber desse final
Minha vó sempre com calma
De forma bem magistral
Um pavão misterioso
Vai ser tudo natural.
Dos folhetos do baú
Este por fim me fascina
Ave de tão belas cores
Grandes metas se destina
Um pavão misterioso
Numa gentil oficina.
A minha vó caprichava
Nesta palavra – donzela
A filha daquele conde
Que comecei gostar dela
Um pavão misterioso
Xilogravura de tela.
Ser ouvinte é saber
Se ver como caminhante
O romance marca cena
Neste trilhar fascinante
Um pavão misterioso
Faz leitor ser elegante.
Vivendo num cativeiro
Condessa quis liberdade
Inspirou todo poeta
Pra dizer que tem saudade
Um pavão misterioso
Voa no céu da verdade.
Esse gentil empolgado
Cabisbaixo, sem alcance
Estudando lá na frente
Da criança do romance
Um pavão misterioso
Surge, porém, grande lance.
Tinha também o folheto
Do Melquíades Ferreira
Camelo não publicou
O seu cordel de primeira
Um pavão misterioso
No plágio à brasileira.
Deixando de lado, sigo
Sem pensar nesses autores
Ambos são bons cordelistas
Nestes versos são doutores
Um pavão misterioso
Arestas de tradutores.
Cem anos deste romance
Zé Camelo fez primeiro
Quem publicou foi João
Sem ser autor verdadeiro
Um pavão misterioso
De vovó se fez parceiro.