Mimos refinados

História tão fantástica nem Sherazade inventaria:

Retornando a comitiva do longínquo oriente

Trazendo do rei saudita valiosíssimo presente

Que exclusivamente à Primeira-Dama se destinaria

Sendo portador o ministro, fato que ninguém contraria

Relógio, anel, brincos e colar: mimos deveras refinados

Em surreais dezesseis milhões e meio avaliados

Não declarados na alfândega de forma oficial

Retidos em pleno aeroporto pela Receita Federal

Em outra “lembrança” engenhosamente ocultados

Pra escapar do imposto milionário se valeram de tramoia

Fosse consignada ao país - como apregoa o bom senso - a oferta da preciosidade

Do recolhimento de tributo nenhum haveria necessidade

Mas pra burlar o fisco lembraram da Guerra de Troia

Aproveitando o presente dos árabes criaram o “Cavalo de Joia”

Alladin e Ali-Babá, ante tal astúcia, decerto sentiriam no rosto o rubor

Envergonhados, em disparada partiriam no tapete voador

Jamais se igualariam suas peripécias aos tupiniquins disparates

Afinal, de brilhantes dados não se olham os quilates

Mormente quando já sabido seu estratosférico valor

Muita calma nessa hora, pra não levantar acusação exagerada

Troca de "regalos" é praxe em viagens ao estrangeiro

E sendo anfitriã a Arábia, há de parecer, a qualquer cidadão brasileiro

Que a recordação oferecida se revele por evidente desmesurada

Ocorre que, no caso, deve ser obrigatoriamente considerada

A distorção de valores decorrente da riqueza descomunal

Da monarquia proprietária da maior reserva de petróleo mundial!

No popular: o que a gente só compraria se vendesse um rim,

Pra eles não passa de um trocadinho, simples assim!

Preço que pra nós é absurdo, pra eles é trivial...

Já os mais impiedosos vão lembrar do velho ditado:

"Quanto mais se tem mais se deseja"

E não é que o rico mais facilmente a fortuna fareja?

Se deu presente caro, por algo do amigo com certeza está interessado

E teve mesmo um acontecido que não pode ser ignorado:

Em outubro foi ao Oriente Médio o Ministro de Minas e Energia

Em novembro foi vendida aos Emirados uma refinaria na Bahia

Seria a proximidade das datas mera coincidência?

Ou seriam as tais joias retribuição por favorecimento na concorrência?

Corre que a planta foi vendida pela metade do que realmente valia...

Pior que não tâmo falando de qualquer usina

Foi a primeira do país a entrar em funcionamento

Hoje é a segunda em capacidade de processamento

E não produz só gás, lubrificante, diesel e gasolina

Acabâmo privatizando uma legítima mina

A única que faz a tal da food grade, parafina alimentícia

Indispensável pra indústria do chocolate, que delícia!

E também a N-parafina, de características sustentáveis

Usada na fabricação de detergentes biodegradáveis

O Tribunal de Contas da União não viu nenhuma malícia...

Logo que fechado o negócio, já mudaram a denominação legal:

De Landulpho Alves pra Mataripe foi rebatizada

É que não deu mais liga manter a personalidade homenageada

Porque o tal doutor era ferrenho defensor do monopólio estatal

Continuar com o nome do cara pegaria bem mal...

A real é que venderam da Petrobrás uma joia de esplendor inigualável

Achando que levariam de brinde adornos de brilho admirável

Mas subestimaram dos agentes a inteligência e a integridade

Que, fiéis aos Princípios da Legalidade e Moralidade

Suportaram oito "carteiradas", com firmeza nada menos que louvável

E que agora, em estrita observância à pertinente legislação

Sejam os presentes ao patrimônio da União devidamente incorporados

Pra que por todos nós, seus donos, possam ser apreciados

Por serem bens de valor inestimável, que pertencem à Nação

E que seja, vez ou outra, permitida sua utilização

Por Presidentes e Primeiras-Damas, em eventos extremamente relevantes

Ocasiões em que se exigem produções excepcionalmente elegantes

Sejam quantas forem, desde que façam uso autorizado e correto

E sejam eleitas ou companheiras de mandatários escolhidos pelo voto direto

Porque eternos são somente os diamantes!