Dialeto Nordestino
No dialeto Nordestino
Haja coisa pra inventar
A quem diga o Nordestino
Cada um no seu lugar
Gente que não afina
Vai seguindo a sua sina
Pra seu destino chegar
Pois não me ‘arrego”
Na hora de improvisar
Falo e não ‘nego’
( 1 )
Defendendo meu lugar
Pois todo cabra medroso
É um cabra que ‘arrega’
Sujeito’ milindroso’
Que o seu jeito não nega
Quem não freqüenta supermecado
Freqüenta a ‘budega’
Ou a ‘venda’ do Agenor
Lá não vende fiado
Mais tem o seu valor
( 2 )
Vende todo dia
Nordestino em Brasília
Parece um ‘candango’
Substitui o almoço
Por um prato de ‘rango’
Sou matuto nato
Quando estou no mato
Caço de ‘estilingue’
E também de ‘baladeira’
Fico a noite inteira
( 3 )
Coçando a ‘muleira’
Acedendo o ‘candieiro’
Caçando veado-catingueiro
Que no soar da matina
Foi avistado
Na mira da ‘lazarina’
Ás vezes sou ‘avexado’
Com fogo de ‘lamparina’
Louco pra dançar forró
‘Arrochando o nó’
( 4 )
Fazendo o chão levantar pó
Sou cabra inteligente
No Sertão sou diferente
Pois cabra ‘desembestado’
Também é ‘boco’
Não passa de ‘abestado’
Vivendo ‘desmantelado’
Na cidade de ‘Cablobó’
Nesse’ imprensado’
Matuto não fica só
( 5 )
Pois cabra inteligente
Não paga de delinqüente
Morando no ‘xilindró’
Gosto do nosso dialeto
E da nossa culinária
Pois meu prato predileto
É moqueca-de-surubim
Do rio de Januária
Na culinária é assim
“Beijú vira tapioca’
( 6 )
Naqueles restaurantes
Feitos de ‘bambu’ ou ‘taboca’
Aqui o dialeto é constante
Desde a nascente á jusante
Do São Francisco
Onde tem peixe e marisco
Nas águas do ‘Velho Chico’
Sou de uma brava gente
Onde ‘oxe’ vira ‘oxente’
Gente’ assanhada’ é ‘pra frente’
( 7 )
Quando é’ acanhada’
Não passa dum inocente
Que ‘bicho comeu a língua’
Com vergonha de falar
Quando tem dor pra ‘daná’
Chega dá ‘íngua’
E quando a dor é na patela
Dói a ‘batata da perna’
Se o seu cabelo queimar no sol
Vai virá um ‘sarará’
( 8 )
Só aplicando uma tinta
Pra poder consertar
O ‘desmantelo’ que tu fez
Quem não come primeiro
Come por ‘derradeiro’
Mostrando pra vocês
Que ‘rapariga’ não é xingamento
Só é uma bela moça
Que nasceu no Sertão
Saudades dos momentos
( 9 )
Que brincava de ‘cata-vento’
Que até confundia
Vivia ‘papando o vento’
Sem saber o que queria
Onde todo mundo ria
Das traquinagens de criança
De uma velha infância
Que o tempo levou
Ainda dou valor
Aos carinhos de ‘mainha’
( 10 )
Botando eu na linha
Me tratando com amor
Nesse tempo que passou
Nosso dialeto é assim
Parece não ter fim
Como uma bela flor
Transformada em ‘fulô’
No apelido de gente
Que alguém botou
A vida nos ensina
( 11 )
No soar da ‘matina’
Ser um bom poeta
Que na rima completa
Português rima e métrica
Faz tudo na linha reta
Se solta e dialeta
Falando do Sertão
Como um vaqueiro
Fazendo apartação
Um homem guerreiro
( 12 )
Que honra seu gibão
Quando pega boi no mato
Pega boi na ‘catinga’
Um ofício nato
Que o suor respinga
Na face
Escrevendo o enlace
Do vaqueiro do Sertão
Da relação com sua terra
Caso contrário
( 13 )
Tudo ‘emperra’
Vira conto do vigário
Durando a noite inteira
Pois vaqueiro bom
Pega boi na ‘madeira’
Nunca perde o tom
Passa a vida inteira
No fórro, xote e baião
‘Xaxar’’ milho e feijão
Dança xaxado no Sertão
( 14 )
Sonhando com o amor
Uma mulher de valor
Que vire sua paixão
O cabra quando é bom
É um cabra da ‘peste’
Um cabra de respeito
Que passou no teste
Cabra ‘arrochado’
Que não é ‘avexado’
Também não ‘arrenga’
( 15 )
Não se mistura com ‘quenga’
É cabra de respeito
Caso contrário
É cabra com defeito
Tipo ‘salafario’
Homem que não peito
Não passa no teste
Do cabra do Nordeste
Quando faço uma coisa boa
Que me agrade
( 16 )
Solto um ‘arrie égua’
É a poesia que entoa
No verso que invade
O coração da ‘patroa’
Se o cordel é bom
O folheto é ‘pai d’egua’
Vai seguindo o tom
Correndo ‘pra mais de légua’
Quando o sol ta quente
Faz muito calor
( 17 )
Não há quem agüente
Esse calor da ‘bixiga’
É tanto odor
Quem ninguém suporta
Esse ‘calor da peste’
Só um ventilador na porta
Suporta o calor do Nordeste
Desculpe meu povo
Vou ter que terminar
Avisando esse povo
( 18 )
Que sotaque mais dengoso
Que esse não há
Mais não se ‘avexe’ não ‘visse’
É como o poeta disse
Quem tem cultura
Tem história pra contar
Tem poesia pura
E cordel a declamar
Pois esse dialeto popular
É difícil de acabar
( 19 )
Moisés Aboiador - Poeta de Literatura de Cordel de Jequitaí no Norte de Minas.