LUISA MAHIN - TAMBOR DE CRIOULA
Escrevi vários folhetos
Falando de escravidão
Citei, narrei, dissertei
Sobre essa aberração
De escravo a aventureiros
Desde os navios negreiros
Até a abolição.
Muitas torturas em vão
Sofreu o povo africano
Trazido para o Brasil
Em regime desumano
Depois de tanta euforia
Hoje é grande maioria
Neste país soberano.
E desse povo africano
Eu falei sobre Zumbi
De uns que vieram da África
Outros nascidos aqui
De quilombo, de escrava
De uma gente forte e brava
Sem motivo pra sorrir.
De Dandara, de Zumbi
Do início até o fim
Outros que se destacaram
Porém hoje volto enfim
Aos velhos tempos de outrora
E o nome que falo agora
É o de Luisa Mahin.
Mahin foi descrita assin:
Era uma negra vistosa
A cor de um preto retinto
Dentes brancos, generosa
Sofrida e vingativa
Mas era uma pessoa altiva
Quitandeira e laboriosa.
Decantada em verso e prosa
Muito escorregadia
Em Costa Mina na África
Ou no Estado da Bahia
Não se prova em documento
Onde foi seu nascimento,
Ainda existe essa porfia.
Nagô-jeje lhe regia
Vinda da tribo Mahin
Daí o seu sobrenome
Lá do Golfo do Benim
Nagô-jeje uma nação
Nativa religião
Lutaram por esse fim.
Quem foi Luisa Mahin
Eu deixo aqui pra vocês:
Em Rebelião Escrava
Segundo João José Reis
Jornalista e escritor
Que ela participou
Do Levante do Malês
Segundo João José Reis
Ela não foi encontrada
Entre os mortos no Levante
Nem tinha seu nome em nada
Por isso que se dizia
Que ela era arredia
Sumia como encantada.
Porém fora registrada
A presença na batalha
De mulheres bem armadas
De foice, faca e navalha
Daí a suposição,
Ou ela era ficção
Ou sumiu na maravalha.
Também em outra batalha
Revolta da Sabinada
Luisa participou
De maneira disfarçada;
Como era quituteira
Servia de mensageira
Sem ninguém saber de nada.
Também ficou registrada:
Luisa Mahin deixou
Um filho muito famoso
Foi poeta e escritor
Como fora derrotada
Na Guerra da Sabinada
Com o pai o filho deixou.
No Malês se evaporou
Sem deixar rastro sumiu
Mas não teve muita sorte
Na Sabinada caiu
Mas saiu do cerco viva
Sem ter outra alternativa
Deixou o filho e fugiu.
Luisa partiu pra o Rio
O filho com o pai ficou
Mas aos dez anos de idade
O pai, grande jogador
Pra pagar conta vendeu
Como escravo o filho seu
Criado com tanto amor.
Para o Rio ela migrou
Dentro da mata fechada
Seguida por outros negros
Fugidos da Sabinada
Quando no Rio chegou
Lá Luisa não gostou
E seguiu outra jornada.
Sempre na mata fechada
Seguiu para Salvador
Onde se deu muito bem
E logo se destacou
Por ser muito destemida
E onde ficou conhecida
Quituteira de valor.
Um bom dinheiro ganhou
E comprou sua liberdade
Assim podia ser livre
Andar por toda cidade
No ofício de quituteira
E às vezes mensageira
Da sua sociedade.
Como livre, na verdade
Da nação nagô pagã
Recusou os sacramentos
E a doutrina cristã
Como o branco exigia
Mas o que ela queria
Era formar o seu clã.
Como uma negra pagã
A sua obstinação
Era entrar nas senzalas
Provocar destruição
Incentivar os escravos
A lutarem como bravos
Em prol da aboliçao.
Há muita opinião
Sobre Luisa Mahin
Se ela era brasileira
Se era africana, enfim
Mas nunca se descobriu
De onde ela surgiu
E como foi o seu fim.
Só se sabe que Mahin
Fez muita revoluçao
No Estado da Bahia
Do litoral ao sertão
De tanto estar envolvida
Passou a ser perseguida
E fugiu pra o Maranhão.
Existe outra versão
Também muito comentada:
Na Capital do Império
Ela foi capturada
Em uma insurreição
E foi por essa razão
Para a África deportada.
Fato ou conversa fiada
É só mais uma versão
Na Capital do Império
Ela fez insurreição
Mas não foi capturada,
Em fuga desenfreada
Foi parar no Maranhão.
Continuou na função
De quitute com cebola
Quituteira de mão cheia
E como não era tola
Ninguém conseguiu achá-la,
E com as negras da senzala
Criou o tambor de crioula.
Do Benim ou de Angola
Na Bahia criou fama
No Maranhão criou dança
Por isso os negros a ama
Porém nunca se esqueceu
Do filho que o pai vendeu
Que chamou-se Luis Gama.
Sendo poeta de fama
Nos tempos da escravidão
Luis Gama alforriado
Continuou a missão
Que sua mãe desejava
E cada dia sonhava
Em chegar a abolição.
De Gama a obstinação
Era um dia encontrar
Sua mãe desconhecida
Mas nunca pôde encontrar
Porém a imaginava
Livre e que sempre lutava
Para os negros libertar.
Continuava a narrar
Sobre Mahin com proeza
Foi uma escrava africana
Na África foi princesa
No Brasil uma guerreira
Na cozinha quituteira
Sempre com muita destreza.
Soube também com tristeza
Por negros alforriados
Luisa teve outro filho
De destino ignorado
Lhe partiu o coração
Saber ter mãe e irmão
E viver deles separado.
Este foi mais um recado
Que versei em narração
Sobre outra negra famosa
Do tempo da escravidão
Que pelos irmãos lutavam
Com eles sempre sonhavam
Conseguir a abolição.
Safadeza e corrupção
Desde esse tempo existiu
Mas isso é público e notório
Que o preconceito insistiu
Em querer continuar
E eu acabei de narrar
Mais um «Coisas do Brasil.»
Brasília, 13 de Janeiro de 2021
SÉRIE ESCRAVIDÃO - VOLUME 14