Diga quem não tem saudade Do quilombo Livramento?
Um lugarzinho pra morar
Formou-se nosso quilombo
Muita gente tinha assombro
Só vinha aqui pra mangar.
Ou ver o povo pisar
O nosso tradicional côco
Nossas casas sem reboco
De pedra sem acabamento
Ganhava divertimento
E também grande amizade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Gente de todo canto
Andava nesse lugar
Na casa de Zé Piá
Na bodega dava espanto.
Nas rezas de todo Santo
Só ia pra comer bolacha
Depois tomava cachaça
Cuspia lá no cimento
No domingo o movimento
Nos dava felicidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Carro para ir às feiras
Zé Pial que tinha então
S-dez depois caminhão
Sem dó naquelas ladeiras.
Não tolerava besteiras
Não negava carona a ninguém
Que não tivesse um vintém
No bolso naquele momento
Ganhou um faturamento
Com garra e honestidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
E meu avô me contava
Que no tempo dipatrás
O povo pedia paz
Nas rezas que eles rezava.
De sol a sol trabalhava
Ganhava somente a palha
Era grande a batalha
Que enfrentava sol e vento
Aguentava xingamento
Sem perder a dignidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Zé Gago era liderança
O povo tinha respeito
Todo mundo satisfeito
Quando fazia festança.
Era gente grande e criança
Na roda pisando côco
Cantava de ficar rouco
Embolada no complemento
Às mulheres em cumprimento
Da diversão sem maldade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Quando menino ia nascer
Mãe Preta era a Parteira
Passava noites inteiras
Até a mãe conceber.
Quem precisasse benzer
Dona Maria Massal
Com reza especial
Mau olhado e passamento
Espinhela, quebramento
Benzia de boa vontade
Diga quem não tem saudades
Das coisas no Livramento
Era bonito escutar
O badalo daquele sino
Luizão dando catecismo
Os meninos a decorar.
O credo e sem faltar
Um domingo de lição
Até a primeira comunhão
E aprender o mandamento
Ou ter discernimento
Pra ser cristão de verdade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Uma terça-feira por mês
Tinha missa com o vigário
E antes de chegar o horário
Ele já era até freguês.
Almoçava o padre e mais três
Lá em Zé de Felismino
Tudo isso era divino
E dava contentamento
Receber o sacramento
Pedir a Deus prosperidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
E as novenas de março
Luizão era quem tirava
Dona Auta celebrava
Era dela aquele espaço.
O povo sem embaraço
Cantava a São José Divino
Na sanfona Zé de Vino
Fazia o fechamento
E os outros no segmento
Tocavam a liberdade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
A celebração terminava
Era gente pra lá e pra cá
E aquele patamar
De juventude lotava
Ali a turma namorava.
Brincava de Cair no poço
Botava o braço no pescoço
Sem nenhum agarramento
O pai no monitoramento
Pra honrar a castidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Quem que não tá lembrado
Dos torneios e do jogo
O domingo pegando fogo
No campo ninguém faltava.
Os rapazes tudo jogava
O dono era João Pial
O povo vinha de animal
De carro ou de jumento
Era grande o entretenimento
Ainda tinha civilidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Saudades da incelença
Os cantos de sentinela
Os candeeiros, a vela
Os curadores de nascença.
Aquelas ilustres presenças
Ditinha, Dora, Geralda
Bio andando na estrada
Tangia os moleques nojento
E no seu desentendimento
Pedra voava à vontade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Saudades tenho da lagoa
Do finado Joaquim Jovino
No inverno os meninos
Fazem uma farra boa.
Nadam muito, até enjoa
E é pertinho da escola
No verão se joga bola
Sem nenhum alagamento
No bar bom atendimento
Que o cabra não é covarde
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
João Jovino gostava
Era mesmo de zoar
De Zé Preto, de Guiá
Era de quem mais mangava.
Quando Laia se embebedava
Ficava um bebo engraçado
Dançava , era atentado
Causava constrangimento
Era um bom elemento
Que alegrou minha mocidade
Diga quem não tem saudade
Das coisas no Livramento.
Mas o tempo se passou
Muita coisa foi mudando
Uns indo, outros ficando
O povo se renovou
Uma associação formou
Chicola e dona Rosinha
Maria, Liô, Mulherzinha
E a juventude do momento
Paula no planejamento
Desenvolve a comunidade
Diga quem não tem saudade
Do quilombo Livramento.