CHICA DA SILVA - UMA ESCRAVA PODEROSA

Escrevi muitos folhetos

Falando de escravidão

Principalmente de escravas

Devido a submissão

Que além da serventia

No eito ainda servia

Nas libidos do patrão.

No tempo da escravidão

Negro valia dinheiro

Quem tinha muitos escravos

Era um rico fazendeiro

Que atuava no cafezal

Riqueza de Portugal

E do Império Brasileiro.

Ouro no Rio de Janeiro

Brilhava nos carrascais

Em todo chão brasileiro

Se extraía minerais

Sendo os mais relevantes

A extração de diamantes

Dar ricas Minas Gerais.

Ali onde havia mais

Movimento extrativista

Maior movimentação

Do regime escravagista

Que o Brasil registrou

Também onde começou

A luta abolicionista.

Escravo a perder de vista

Tinha aquela região

Dominados por feitores

Tendo à frente um capitão

Geralmente um fazendeiro

Dono de terra e dinheiro

Título de conde ou barão.

Chegou nessa região

Vindos da terra africana

Uma leva de escravos

Para trabalhar com cana

Com mina e com cafezal

Enriquecer Portugal

E sua gente soberana.

Nessa remessa africana

Vinda da Costa da Mina

Vinha uma jovem escrava

Ainda quase menina

Que despertou a cobiça

E a cabeça enfeitiça

Daquela gente granfina.

Maria era a menina

Que tal reboliço fez

Antônio Caetano Sá

Homem branco português

Adquiriu essa escrava

E em pouco tempo ela estava

Em estado de gravidez.

De Maria e o português

Nasceu a filha Francisca

Mulata mu7ito faceira

Intempestiva e arisca

Escrava mas sem comando

Não aceitava desmando

Com seus olhos de faisca.

Logo levaram Francisca

Afim de ser batizada

Na Igreja da Candelária

Com o nome Francisca Parda

Que escrava só tinha nome

E o país o sobrenome

De onde foi retirada.

Mas Francisca foi gerada

E nascida no Brasil

O Pai nega o sobrenome

Silva era um nome vil

Em Portugal muito usado

Por sobrenome adotado

E pra Francisca serviu.

O seu registro civil

Foi lavrado na ribeira

De Arraial do Milho Verde

João Fernandes de Oliveira

Contratador de renome

Que emprestou o sobrenome

Para sua companheira.

Francisca Silva Oliveira

Assim ela foi chamada

Nas mãos do contratador

Passa a ser alforriada

Começa a se destacar

Entre as negras a brilhar

Pelas brancas invejada.

Antes de alforriada

Levava sua vidinha

Sendo mucama do médico

Manoel Pires Sardinha

Grande latifundiário

No Tijuco proprietário

Que a fazia rainha.

Com o médico Pires Sardinha

Teve seu filho primeiro

O pai nega o sobrenome

Mas faz dele seu herdeiro

E lhe concede alforria

A Portugal o envia

Pra seus estudos primeiros.

Ao Império Brasileiro

Simão Pires retornou

Sendo ele o filho de Chica

Com o médico que o educou

Até que o mesmo formou-se

E na Corte destacou-se

Em cargos de alto valor.

Depois o contratador

Explorador de diamantes

Comprou a escrava Chica

E fez dela sua amante

Frequentando os ambientes

Das mais fidalgas patentes

Carregada de brilhantes.

Mesmo sendo só amantes

Treze filhos se gerou

Todos com o sobrenome

Do pai, o contratador

Ato incomum, nada franco

Entre as leis do homem branco

E esta regra se quebrou.

Chica e o contratador

Em união consensual

Não foi um caso isolado

No Brasil Colonial

O que chamava atenção

Foi a extensa duração

O que não era normal.

O estigma social

Se sentia incomodado

Um homem de alto posto

Viver assim rebaixado

Isso o que o povo pensava

Porque o casal gostava

Vendo o povo incomodado.

João Fernandes foi chamado

De volta a Portugal

Pra receber uma herança

Do pai, uma coisa normal

E teve que ficar lá

Para administrar

O seu patrimonial.

Como era natural

Educar filho varão

Os quatro filhos com Chica

Seguiram na embarcação

Com o pai pra Portugal

Deixando a terra natal

Levando a recordação.

Lá tiveram formação

De nível superior

Ocuparam altos postos

Já sendo tudo doutor

Até títulos de nobreza

Ganharam na realeza

E nenhum mais retornou.

Chica no Brasil ficou

Com as nove filhas somente

E o patrimônio deixado

Vivendo uma vida decente

No Arraial do Tijuco

E ninguém era maluco

De mexer com aquela gente.

Uma negra independente

Conhecida na região

Deu às suas nove filhas

Uma boa educação

Igual às que recebia

A alta aristocracia

Do tempo da escravidão.

Além de boa formação

Aprenderam a tricotar

Num convento religioso

E só sairam de lá

Depois de bem educadas

Religiosas, recatadas

E em idade de casar.

Algumas ficaram lá

Sentindo necessidade

De ser freira e continuar

Sua religiosidade

Pois mesmo filhas bastardas

De escrava alforriada

Tinham total liberdade.

Ninguém naquela cidade

Ousavam desrespeitar

Filhos de Chica da Silva

Sem um castigo pegar

E o povo sabendo disso

Não provocavam enguiço.

Pra não se prejudicar.

Qualquer coisa peculiar

Ao branco também servia

A Chica e sua família

Toda e qualquer regalia

Fosse na sociedade

Ou na religiosidade

Também Chica usufruía.

A igreja que servia

Somente a gente branca

Chica da Silva e as filhas

Também tinha entrada franca

Se uma porta se fechava

Ela abria e entrava

E ninguém botava banca.

Chica tinha entrada franca

Porque também ajudava

Dando altos donativos

A todos que a procurava

Tanto a Ordem da Mercês

E também de outras três

Onde ela frequentava.

As ordens que ela ajudava

Com afeto e com louvor

Do Carmo e de São Francisco

Dos brancos que a respeitou

Dos pardos era as Mercês

E do Rosário era a vez

Do povo de sua cor.

Quatorze filhos gerou

Simão Pires, o primeiro

Joaquim, Antônio Caetano

João Fernandes o terceiro

Por fim José Agostinho

Por todos tinha carinho

Mesmo estando no estrangeiro.

E no solo brasileiro

Nove em sua companhia

Eram Francisca de Paula

Rita, Ana, Helena, Luzia

Antônia Quitéria Rita

Que era a filha mais bonita

Por fim Mariana e Maria.

Chica da Silva possuía

Padrão de vida elevado

Tinha cento e quatro escravos

Pra fazer os seus mandados

Uns pretos como a mãe dela

Outros mulatos como ela

Todos muito bem tratados.

Alguns viviam alugados

Para cuidar de rebanho

Nas minas, na agricultura

Ou eram escravos de ganho

Ninguém os maltrataria

E a nenhum dava alforria

Do mais pacato ao mais zanho.

Se aumentava seus ganhos

Vivendo entre ouro e brilhos

Com nove filhas mulatas

Sem ter notícias dos filhos

A origem negra e escrava

Na sociedade lhe trava

E lhe coloca impecilhos.

Filhas casaram com filhos

De brancos de posição

Algumas não conseguiram

Legitimar a união

E outras nem casar puderam

E só paz obtiveram

Entrando pra religião.

Era grande a rejeição

Difícil branco aceitar

Nessa época o mulatismo

Os impedia de ocupar

Cargos de alto prestígio

Daí o grande litígio

Pra se notabilizar.

Até hoje ainda há

No povo esse preconceito

Criando cotas em tudo

Sendo isso um grave defeito.

Pois se o negro é capaz

De fazer o que branco faz

Tem que ser do mesmo jeito.

Enfim esse preconceito

É orgulho ressentido

Depois que Chica morreu

Seu nome foi esquecido

Ou tentaram apagar

Pra deixar de incomodar

Aos mais favorecidos.

Mas nada foi esquecido

Em sua biografia

Escritores se empenharam

Em contar tudo hoje em dia

E eu como amigo da arte

Também faço a minha parte

Contando tudo em poesia.

Chica da Silva hoje em dia

É decantada em canção

Virou tema de novela

História de ficção

Partindo para o esquisito

Transformando o tema escrito

Para massificação.

Teve até exumação

Feita dos restos mortais

Na Igreja de São Francisco

De Assis em Minas Gerais

Pra mexer no que está certo

Provocando desafeto

E brigas judiciais.

Pois os seus restos mortais

Para o Arizona seguiu

Só com ajuda da INTERPOL

Se receber conseguiu

Em litígios controversos

E eu concluí com meus versos

Mais um COISAS DO BRASIL.

Massaroca-BA, 19 de Maio de 2021

SÉRIE ESCRAVIDÃO - VOLUME 4

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 17/11/2022
Código do texto: T7652240
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