SOMOS O VENENO E O ANTÍDOTO (Por onde anda Tupã?)
Peço licença a Tupã
Para narrar essa saga
A destruição que chega
Como se fosse uma praga
Matando bichos e rios
Formando um grande vazio
Deixando aqui essa chaga.
No coração da Amazônia
Lamenta a onça pintada,
Pois teve seus ancestrais
Pelo garimpo dragada
Com a queda da floresta
Entre os bichos não há festas
Só fumaça das queimadas.
A rainha da Amazônia
Ver sua coroa caída
Seus filhos desesperados
Caem um a um sem vida,
Pois um caçador malvado
Mantém seu rifle apontado
Causando dor e ferida.
Quando isso acontece
Toda a Amazônia chora
Por saber que ali caiu
Um pouco de sua glória
E a floresta entristece
Porque a tristeza cresce
Somente a saudade aflora.
A pobre onça pintada
Vivia ali numa boa
Ver sua mata despida
Motor em vez de canoa
Olha o ipê destroçado
E o sangue derramado
Matam mais uma pessoa.
E aquele que morreu
Era um grande protetor
Acabou ficando órfã
Tem seu momento de dor
Mesmo assim ela procria
E cuida da sua cria
Com alegria e amor.
Dias desse uma zangou
Com toda aquela matança
Sem pensar ela entrou
No meio daquela dança
Com a raiva que ficou
Triturou um caçador
Porém sofreu a vingança.
Numa caçada cruel
Pra vingar o caçador
Uma cambada de homem
Armados e sem pudor
Andaram dias a fio
Com espingarda e fuzil
E nos olhos muito furor.
Encontraram a coitada
E mataram sem piedade
Metralharam a pobrezinha
Sem a menor piedade
Em uma enorme covardia
Disseram que merecia
Ainda mais atrocidades.
A carne ninguém comeu
E o couro todo furado
Não serviu nem pra tapete
Ô homenzinho malvado!
Mataram sem ter perdão
A onça em extinção
E o IBAMA ficou calado.
Não pensaram um momento
Porque ela se revoltou
Estava em seu habitat
Invadido por caçador
Mataram pai, mãe e filho
Por isso saiu do trilho
Desesperada atacou.
Logo a turba enfurecida
Deram a sentença de morte
Sem direito a defesa
Com seus armamentos fortes
Fez-se a onça encurralada
E sem pena metralhada
Em uma mata no Norte.
Deixemos a pobre onça
Que foi morar com Tupã
Para falar do passado
E lógico, do amanhã
Se é que podemos ter
Outro belo amanhecer
Sem mordida na maçã.
Quem defende o ambiente
Tem seu destino traçado
Igual a onça que foi
Sem perdão sentenciado
Por sumária execução
Morre mesmo com razão
E sem sequer ser julgado.
Eis o grande Chico Mendes
Um dos primeiros da lista
Executado ainda foi
Chamado de comunista
O velho discurso antigo
Para eleger como inimigo
O grande ambientalista.
Irmã Dorothy assassinada
Mataram-na covardemente
A Amazônia de luto
Vendo os dentes da serpente
É morte todos os dias
Enquanto na letargia
Do vereador ao presidente
De lá pra cá tantos outros
Perderam a vida lutando
E o estado brasileiro
Apenas observando,
Pois quem está no poder
Parece até que nada ver
E vai seus panos passando.
Não vamos aqui falar
Nem vamos trazer à tona
De todos que aqui morreram
Defendendo a nossa “zona”
Tanto sangue em desvario
Que dá pra encher um rio
Maior do que o Amazonas.
A nossa Amazônia chora
Tanto sangue derramado
E o moto serra roncando
Outro angelim é sangrado
E o madeireiro com orgulho
Comemora a queda, o barulho
Porém Tupã tem chorado.
Noutro espaço o garimpeiro
Com seus monstros fulminantes
Vai arrebentando tudo
E outro angelim gigante
Abre uma grande clareira
Criando lama e poeira
Matando tudo em instante.
A guariba atordoada
Grita: corre macacada!
O mundo está se acabando
E não podemos fazer nada
Aos poucos ficam ilhados
E o caçador malvado
Tem sua glória alcançada.
A pobre onça esturra
Querendo impor o medo
Mas o homem endiabrado
Já sabe qual o segredo
Se até Tupã foi embora
Não aguentou, caiu fora
Fica a onça sem enredo.
Assim a grande Amazônia
Vai ficando um campo aberto
Os rios vão lixiviando
E o caminho está certo
No ritmo que estamos indo
A natureza destruindo
Logo teremos um deserto.
Mesmo não sendo adivinho
É fácil prever a dor
Há pouco não tem mais peixe
A água muda de cor
Fome, miséria e desgraça
Sem vida não há mais graça
Somente um grande estupor.
E a onça ainda resiste,
Porém não por muito tempo
Cada dia uma cai
Nesse chão de sofrimento
Passarinhos já não cantam
As capivaras e as antas
Desaparecem ao vento.
Papagaio já não fala
Arara é raro se ver
A palavra de ordem é ouro
Sentimento, enriquecer
Nem que seja destruindo
Vendo tudo se ruindo
E toda a vida morrer.
Tupã, ó grande Tupã!
Por que desapareceu?
Quero crer que está voltando
Vem cuidar dos bichos seus
A onça pintada chora
A macacada implora
A volta do grande deus.
Do jeito que vão as coisas
Sem ver luz no amanhã
Sem uma política pública
Com a pintada no divã
Não tem quem possa ajudar
Só nos resta apelar
À força do deus Tupã.
Enquanto isso, lutemos
Nos tornemos consciente
Que nós somos solução
E o veneno da serpente
Somos veneno e antídoto
Por isso digo e repito
A Amazônia precisa da gente.
A onça e todos os bichos
Todos os microrganismos
Se não agirmos agora
Não pararmos com cinismo
Em pouco tempo não resta
Bichos, rios e florestas
Estamos à beira do abismo.
Não é luta para um só
É luta de todo o povo
Governos, população
Pra sairmos desse estorvo
E ver a onça pintada
Em festa com a macacada
Livre e “sorrindo” de novo.
Deixo um alerta aos pais
Que a esse cordel ler
Ensinem suas crianças
Qual o certo a se fazer
Se tivemos em outrora
Uma bela fauna e flora
Eles também podem ter.
Mas para isso é preciso
Dar a eles sustentação
Ensinar-lhes o bom caminho
Com muita dedicação
Tudo começa em casa
São os pais que dão as asas
De uma boa educação.
Deixo aqui o meu abraço
A quem leu esse cordel
Peço a união de todos
Para cumprir seu papel
E com a preservação
Não tenha a onça extinção
A ela eu tiro o chapéu.