Como surge um defensor
Diferente de Ismália
Que foi na torre sonhar,
Aquela que enlouqueceu
Viu a lua no céu e no mar,
Pego na minha caneta
Pra um dejavu narrar.
Se aconteceu com Raul,
Naquela alucinação,
Sonhar com bando de números
Invadindo o seu sertão,
Que será de quem causar
De animais a extinção?
Sem delongas narrarei
Um encontro especial
De São Francisco de Assis,
Num salão celestial,
Pra julgar um sertanejo
Por extinguir animal.
Foi no Espaço Chico Mendes
Que essa cena sucedeu
E lá estavam São Lázaro,
Que os doentes defendeu,
Santo Antão e Santa Gertrudes.
Tinha até santo judeu.
São Francisco, bem ligeiro,
Encerrou sua oração,
Disse: “Aqui é a Assembleia,
Eu fiz tua convocação.
Vai pagar pelo que fez
Com meus bichos no sertão”.
O cabra olhou de lado
Quis até embrabecer,
E disse: “Não é possível!
Assim vou enlouquecer!
Se querem me condenar,
A verdade vou dizer
Meu querido São Francisco,
Não sei porque fui chamado.
Sei que por todo o sertão
De caatingas fiz roçados,
Saiba que em compensação
Fundei fazendas de gado”.
Nisso gritou São Francisco:
“Cale essa boca, infeliz!
Nunca ouviste falar
De São Francisco de Assis?
Sou o protetor de animais
Tu não sabes o que diz.
Saiba que toda a queimada
Deixou o sertão muito triste
Só pode ser um milagre
Que alguma espécie resiste.
Enfrenta o seu matador,
É a vida com o dedo em riste.
Numa gaiola cativo,
Como dói ver um canário
Humilhado, preso, triste,
Num cantar bem solitário
Receber mesquinho alpiste
Como forma de salário.
Eram uns bandos de canários
Por todo aquele sertão,
Cenário já devastado
Por essa maldita ação.
Hoje só uns canarinhos
Que vivem na solidão”.
O cabra lhe interrompeu
Sem querer lhe escutar:
“Reclame de seu IBAMA,
Faça se mobilizar,
Use monitoramento,
Procurando se alinhar”.
Bem paciente, São Francisco
Rebateu suas duas piadas:
“Com previstas punições,
Muitas leis foram criadas,
Mas lá no teu Brasil
Essas leis são deturpadas.
Sei que não agiu sozinho
Pra causar tanta ruína,
Como exemplo, vou citar
Proprietários de usinas,
Caçadores, pescadores
E explorador de minas”.
Ao som de uma bicharada,
Um grupo se aproximou.
Grande salva de palmas
São Francisco desejou.
Ao mirar e ver quem eram,
O cabra se avermelhou.
Do Assaré, tava Antônio,
Falando de sua oitiva
Que fez para defender
A pequena patativa,
Que foi presa pra cantar
Numa gaiola cativa.
Bem calmo, veio falar
Sorridente o Gonzagão,
Que de tudo que já fez
A maior compensação
Foi querer ver Assum-Preto
Voar livre no sertão.
Foi visto Gonçalves Dias
Ao lado do sabiá.
Por chorar o pardalzinho,
Bandeira tava por lá.
Baleiro, com beija-flor,
Cantando num manacá.
Ouviu um ritmo animado,
Que sentiu um frenesi,
Era só o Trio Nordestino
Festejando por ali.
E cantando junto deles,
Estava o pitiguari.
Como em filme de terror,
Uma cortina se abriu,
Teve queima de enxofre
E a fumaça se expandiu.
O salão ficou tenebroso,
Teve gente que sumiu.
Passado tal nevoeiro,
Uma cena desgastante:
Muitos conhecidos seus,
Aqueles mais arrogantes,
Lutando pra se livrar
De um calor tão escaldante.
E para ele acenavam,
Como quem diz venha aqui!
Este lugar também é teu,
Vem pagar pelo sagui,
Pelo tatu e a onça-pintada,
Pelo preá e a juriti.
Escutou uma explosão,
Foi eco pra todo lado.
Sua cama estremeceu,
O lençol tava molhado,
De uma poça de suor,
Viu um gato no telhado.
Levantou-se, saiu fora.
Viu aves e a vegetação,
E pensando em defendê-los,
Criou uma associação,
Intuindo preservar
Animais em extinção.
Fundação Chico de Assis,
Decidiu assim nomear.
Encontrou pessoas dispostas
Em tudo lhe ajudar.
Animais em extinção
Começou a pesquisar.
Começou pelo sertão,
Do Maranhão até Sergipe,
Descobriu em extinção:
Soldadinho-do-araripe.
Iniciou uma campanha
Por meio de videoclipe.
Em situação parecida,
Encontrou abelha e coruja,
Jacuaca, que é o jacu,
Periquito-cara-suja,
Que tem a cara riscada
Parecendo garatuja.