CORDEL – Mote – Não guardo nenhum rancor – Mas não perdi a memória – 26.06.2022 (PRL)
CORDEL – Mote – Não guardo nenhum rancor – Mas não perdi a memória – 26.06.2022 (PRL)
Oitavas de sete sílabas poéticas
Rimas em ABABCDCD
Interações à vontade
01
Meu cabelo tem alvor
Que respeita minha idade
Do mundo sou sofredor
Porém só falo a verdade
Minha vida posso expor
Conto até minha história
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
02
Nunca fui cabra safado
E nem roubei de ninguém
Tenho pouco, foi suado
Isso que grande porém
Não preciso de censor
Tudo na vida tem glória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
03
Muita gente tem inveja
O grande mal dessa vida
O humilde se apedreja
Não lhe dão qualquer guarida
Prefiro a paz com amor
Nessa vida transitória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
04
Trabalhei por muitas luas
Mas dei tudo o que podia
Não vadiei pelas ruas
Como gente que queria
O difícil quis transpor
Uma vontade notória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
05
Minhas batalhas ferrenhas
A todas elas venci
Trabalhei até nas brenhas
Da luta nunca esqueci
Ligeiro como o condor
Tinha vontade assessória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
06
No primário tive a sorte
Da classe ser o primeiro
Mas registro num recorte
Pensava muito ligeiro
Passava feito trator
Para alcançar a vitória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
07
Na base da decoreba
Guardava tudo na mente
Com meu vinho jurubeba
Bem assim, casualmente
Ligeiro, tinha o fervor
Não fiz parte dessa escória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
08
Mas para o ginasial
Foi um pulo bem difícil
Com nossa renda anormal
Pagar era sacrifício
Fui servir de monitor
Aqui vai minha vanglória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
09
Terminei então fazendo
Na escola industrial
Um curso inteiro, só vendo
Equivalente, ou igual
Quatro anos com louvor
No tempo da palmatória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
10
Mas me fiz de marceneiro
Magrelo como palito
De lustrador a torneiro
Mas nessa arte, que apito
Na educação dou valor
Essa luta não inglória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
11
Dali para a frente engrossou
Colegial...desafio!
Tinha o tal pagou... passou
Chega me causa arrepio
Digo isso sem humor
Estava em vista...notória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
12
Não tinha como pagar
Mensalidade tão cara!
Teria de trabalhar
Essa doença não sara
A carestia é tumor
Não tem essa de irrisória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
13
Fui trabalhar no colégio
Sem precisar de dinheiro
Para mim um privilégio
De sorte para um guerreiro
Nunca tentei ser cantor
Que profissão meritória!
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
14
Quando no final do ano
Uma notícia repente
Para mudar todo o meu plano
De triste, fiquei contente
Para mim foi um primor
Fiquei mudo na oratória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
15
É que passei num concurso
Que muita gente perdeu
Era grande o meu percurso
Tem rico que se lambeu
Fiz exames tal vapor
A saúde vexatória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
16
Tinha tido catapora
A magreza era visível
Pois a saúde deplora
O Sangue fica terrível
Mas me deu um amargor!
Tal doença provisória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
17
Mas resolvida a pendência
Para frente a bola sobe
Resolvi minha carência
Pois nunca quis ser esnobe
O Senhor é meu Pastor
Com a sua precatória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
18
Tomei posse nesse emprego
Que perdurou por trinta anos
Nunca perdi meu sossego
Nunca causei quaisquer danos
Procure no bastidor
Dessa gente aleatória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
19
Conheci o meu Brasil
Viajei tal qual caixeiro
Nosso céu de branco e anil
É bem próprio para obreiro
Queria ser construtor
Nessa vida tão simplória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
20
E por fim aposentei
Pendurei minha chuteira
Ao patrão me dediquei
Foi uma linda carreira
Afastei tanto invasor
Dou a mão à palmatória
Não guardo nenhum rancor
Mas não perdi a memória
SilvaGusmão
Foto: Óleo s/tela de minha autoria...casa antiga de morador de fazenda (vendido).