CHIFRE NÃO MATA NINGUÉM (cordel)

Fui à praça da cidade

Sentei na mesa do bar

Lá encontrei um amigo

Começamos conversar

E ele com muita mágoa

Começou a relatar

– Existe corno no mundo

Desde o tempo de Adão

Num certo tempo passado

Dalila traiu Sanção

Até Maria Bonita

Também traiu Lampião

Dizem que chifre não dói

Só deixa de sangue quente

Mas o corno conformado

Não esquenta sua mente

Fala, então, que chifre é

“Coisa botada na gente”.

Ponta de corno não cresce

Só maltrata e faz sofrer

O corno desiludido

Só leva o tempo a beber

Intriga-se dos amigos

Finge de nada saber

Chifre também não mata

Vi o amigo falar

O que mata é faca e bala

E acidente vascular

Chifre é igual diabetes

Basta apenas controlar

Corno tem muitas histórias

O amigo me contou

São relatos verdadeiros

Ou que nunca se passou

Tem corno que foi embora

Pra casa nunca voltou

Um corno surgiu num jogo

Com a cara de frajola

Com jeito muito esquisito

Cabeça de boi Marola

Subiu pra cabecear

E o chifre furou a bola

Não foi a primeira vez

Que caiu nessa enrascada

Outro dia aconteceu

Numa disputa acirrada

Ao testar pra lateral

A bola voltou furada

Um amigo levou chifre

Presenciou o cenário

Viu sua mulher deitada

Na cama com Zé Hilário

O chifre não doeu nada

Ruim foi o comentário

Um cara saiu de casa

Deu uma de “Jão sem braço”

Inventou de ir ao circo

Estando meio bebaço

Avistou sua mulher

Abraçada com o palhaço

O desmantelo foi feio

Foi a maior confusão

Botou a mulher pra casa

Dizendo não ter perdão

Levar chifre do palhaço

Foi grande a decepção

Bem distante daqui

Tem um corno conformado

Viveu com quinze mulheres

De todas foi corneado

De tanto chifre que leva

Tá com pescoço empenado

Onofre de Marinalva

Casou com uma novinha

Mas ele só a beijava

E chamava de fofinha

Um dia ela foi embora

Fugindo pela cozinha

Rafaé de Jaconias

Pra seu mau não tem perdão

Depois de ser corneado

Armou uma confusão

Ameaçou a mulher

Foi parar no camburão

Vi um senhor reclamar

Sentado a beira da pista

Que sua mulher é linda

Feito capa de revista

Mas falando em traição

Sempre foi um recordista

Ribamar de Valentina

Dos vizinhos se intrigou

Sua mulher botou chifre

E a conversa vasou

Foi embora pra São Paulo

Até hoje não voltou

Um cara trouxe pra casa

Um amigo paulistano

Sua mulher caridosa

Com ela não teve engano

Mandou o marido embora

Ficou com o pé de pano

Quando o corno é conformado

Não vive falando asneira

Pra ele tá tudo bem

Tem que ser dessa maneira

Se a mulher manda ele embora

Ele leva em brincadeira

Me falaram que existe

Seiscentos tipos de corno

Com manias diferentes

Cada um com seu transtorno

Para o corno garanhão

Existe a lei do retorno

Nesse mundo de meu Deus

Também tem o contrapô

Um bota chifre no outro

Cada um a seu dispô

O corno que bota chifre

É chamado de ioiô

Já o corno bateria

Não gosta de confusão

Sabendo que é chifrado

Coça a testa com a mão

Avisa para o amigo

– Vou tomar a solução!...

Tem até o corno elétrico

Fica ali sempre calado

O amigo lhe avisa

– Tu tá sendo corneado

Ele responde baixinho

– Fique frio. Tô ligado!...

Tem também o corno abelha

Sem ter asas pra voar

Pois se ele está em casa

E o pé de pano chegar

Ele sai pra fazer cera

Não tem pressa de voltar

Tem o corno aventureiro

De vez em quando acontece

Mas quando o chifre enraíza

Até a alma padece

Leva chifre pelo dia

E também quando anoitece

Existe o corno churrasco

Vive sem pedir arrogo

Diz que sua companheira

Não tem manobra no jogo

E pela sua mulher

Ele põe a mão no fogo

Diz que tem o corno sapo

Outros chamam cururu

A mulher o manda embora

Ele fica jururu

Implora pra sua amada

– “Não posso viver sem tu!...”

Vi falar no corno Xuxa

Trata os filhos como anjinhos

Quando sai com a mulher

Fica ouvindo murmurinhos

Diz que já não foi embora

Só por causa dos baixinhos

Tem até corno malhado

Nunca vi tanto castigo

Tá sempre na academia

Jura não correr perigo

Vacilou com a mulher

Levou chifre do mendigo

O corno de prostituta

É um sujeito sortudo

É igual à folha seca

Parece ter um escudo

Quando vem a tempestade

O vento carrega tudo

Vou parando por aqui

De falar tanto em cornagem

O que o cortês falou

Só quem tem muita coragem

Pode ser pesquisador

Ou no ramo ter bagagem

Por isso é bom ter cuidado

Não dar sopa pro azar

Tratar sempre com respeito

E sempre valorizar

Mulher gosta de carinho

Não custa nada lembrar

Eu peço a Deus que me livre

De cair na traição

Eu não tenho preconceito

Mas pra mim não quero não

Quem for corno que assuma

Siga a sua tradição.