O CANTADOR NORDESTINO
Tocando meu violão
Crio canções pro luar
Visto meu gibão de couro
Ando por todo lugar
Sou cantador nordestino
De verve bem popular.
Na viola quis tocar
Botei fogo na fornalha
Nos versos da cantoria
A rima nunca me falha
Bebi mel feito garapa
De rapadura na palha.
Os trovadores de gralha
Nunca batem melodia
Na bagaceira vivi
Entoando nostalgia
Meu cantar foi vencedor
Mas, perdeu pra poesia.
Numa linda cantoria
Tampo tudo pra não ver
Centenas se despedindo
Fiz a viola tremer
Vencer grande desafio
Pro mundo me conhecer.
Sertanejo é saber
De largo conhecimento
Na peleja deste tempo
Me vejo num movimento
Na fumaça dos engenhos
Eu vou versando momento.
Cantando não me lamento
Meu gostar pela sanfona
Esbarro na minha terra
Que é a senhora dona
Nas estrofes de saudade
Meu poema tem carona.
Cantei nos circos sem lona
Palhaço das multidões
Plantei milho pra colheita
Fiz as multiplicações
Botei dinheiro na porca
Pra ter lucro meus tostões.
Lá no topo dos sertões
Me banhei nas ribanceiras
Revirei nas águas claras
Mergulhando nas cachoeiras
Fiz sextilhas pros amores
Nas cenas das bagaceiras.
Sabiá nas laranjeiras
Lindos graves nos intriga
Nestes troncos sem espinhos
Aprumo nesta cantiga
Na mansidão dessa voz
A tristeza não faz figa.
Meu matulão me castiga
Ouvindo boa modinha
Sabiá canta comigo
Nas árvores da pracinha
Eu de cá com a viola
Ela lá faz a gracinha.
Eu lembro sempre Madrinha
Que singela criatura
Nem sei se sucumbiu
Fostes mel que tem doçura?
Vou poetizando sonhos
Deus sabe destas loucuras.
Cambiteiros nas alturas
Põem no seu cavalo, cela
Arregaçando camisas
Foto pintada na tela
Chicoteiam inocentes
Agradando clientela.
Quase vi nas esparrela
Naquele baile junino
Toquei pra todos presentes
Pro querido velho Tino
Tipo trio pé de serra
Naquele gentil ensino.
Um tocador faz destino
Belo pássaro que canta
Montado no burro brabo
Cambiteiro se levanta
O viver dum arigó
É ladainha feito santa.
Escrever jamais espanta
Vou botando meus desejos
Tocando nas parcerias
Visitando vãs cortejos
Me benzendo nas capelas
Sou devoto, me protejo.
Gosto de soltar gracejo
Em pelejas arretadas
Sertanejo quando bom
Se dá bem em invernadas
Toca nos bailes noturnos
Riscando nas chuvaradas.
Contemplo mundo de fada
Unindo à natureza
Olhares das esperanças
Nos sons que nos dão grandeza
Os riachos dos engenhos
Fazem luzes pra beleza.
Fui cantar, dei leveza
De repente me calei
Viola quis ficar triste
Acreditem que sonhei
No licor de jenipapo
Em copos embriaguei.
Eu só sei que nada sei
Diz aquele bom freguês
Daquelas bandas brejeiras
Tanto fole pra vocês
Bueiro que saem fumaças
Nordeste tem altivez.
Só quero que desta vez
Parem, ouçam um forró
Estes dedos que dão notas
Faz o som ficar melhor
Jackson com o seu pandeiro
Gonzaga não vive só.
Nordeste terra de sol
A lua é mais secreta
Nosso céu tem mais estrelas
Na noite mais predileta
O sertão na claridade
Atingindo toda meta.
Tem a fórmula correta
Pra se saber universo?
Havendo falta dizer
Tema frágil interesso
Nas pegadas deste bem
Faça-o, sempre te peço.
Este lugar tem progresso
Mas, precisa de respeito
Cantando metrificado
É mais que nosso direito
Viajante cantador
Causador que faz efeito.
O nordestino tem jeito
É bom improvisador
Nas terras esturricadas
Faz poema que restou
Sertanejo bem entende
Tantos causos lhe bastou.
A caneta do doutor
Contém muitos segredos
Decifrando só mistérios
Escrevendo bons enredos
O seu tocar narra fatos
Nas promessas dos aêdos.
Sertanejo não tem medos
Vencendo seca faz anos
Dedilhando na viola
Vive pensando nos planos
Engenhos colhem a safra
Cantata dos desenganos.
Os fulanos, os sicranos
Cantando para plateias
Nas matas, enfileirados
Os lobos das alcateias
Finalizar um Cordel
É criar bem mais ideias.
Toda Grécia das Medeias
Nas odes dos trovadores
Os bravos das guerras santas
Cantavam os tocadores
Nas lutas do povo grego
Solfejam os cantadores.
Viola nos corredores
Alegrando terminal
Versos de lampejos bons
Faz o fim neste varal
O Cordel é brasileiro
Vou dançar no pedestal.
Cantar é dom divinal
Batuque dum estribilho
Avançando no galope
É trem vindo neste trilho
Cantoria tem encanto
Repentista faz o brilho.
No respeito com o filho
Riscam as cordas vocais
A poesia provoca
No som bravo dos pardais
O cordel faz recital
Pros povos ocidentais.
Na sede dos castiçais
Me tornaram seresteiro
Cantador e trovador
Do Nordeste brasileiro
Na viola dos repentes
Improviso verdadeiro.