AI QUE SAUDADE QUE DÁ

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

De quando eu muito corria,

Quando de tudo eu sorria,

Subia em pé de cajá.

Via fugir o preá,

Na loca de pedra entrando.

Eu só vivia sonhando,

Dormindo e acordando cedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Dos meus banhos de açude,

Da cola feita com grude,

Da pescada com puçá.

Lembro o pé de trapiá,

Do canarinho estalando,

Das garças voando em bando,

Da flor macia do bredo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Do rangido da cancela,

Da jitirana tão bela,

Da flor do maracujá.

De ver o tamanduá

Seu abraço preparando,

Ouvir a voz ecoando

No vale tendo arvoredo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Tocar em planta orvalhada.

Ainda de madrugada

Cheirar flor do manacá.

Da cobra ouvir maracá

Sem que visse ela passando.

Ver vaquinha ruminando

Com o cabrito no rochedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Do lindo verde da mata,

Do luar com a cor de prata,

Do pé de jacarandá.

Do burro com caçuá,

Aqui, acolá, zurrando,

Da corujinha piando,

Também mocós no rochedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Da gente da minha terra,

Da paz no meu pé de serra,

Que me faz lembrar de lá.

Capim santo virar chá

Com minha mãe preparando.

Na chaleira, água esquentando,

Menino queimando o dedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Da pamonha e da canjica,

Das brincadeiras de tica,

Do fermentado aluá.

Do saboroso cará,

Do que é bom vou resguardando.

Milho e feijão, já plantando,

Vou desfilando no enredo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Dos coquinhos catolé,

Do cheirinho do café,

Do cuscuz do bom fubá.

Da banana em mangará,

Da borboleta voando,

Dos ossos que fui buscando

Pra meu curral de brinquedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

Lá do forró de latada,

Da boa história contada

De Camonge e Ali Babá.

Das flores do gravatá,

Com tons quase avermelhando,

Do povo ao sol trabalhando,

Do anoitecer, com folguedo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.

AI QUE SAUDADE QUE DÁ

De cada boa amizade,

De quando havia verdade,

Sem precisar ter fuá.

De não ter nenhum paxá,

De estar só comemorando,

Todo mundo bem tratando,

Só com pensamento ledo.

VIVER NUNCA FOI SEGREDO.

HOJE SÓ VIVO LEMBRANDO.