Angu quente
Quando frangote, Ailto
Um matuto lá da roça
Morava numa palhoça
Magro feito um cambito
Um dia pensou bonito
Vou me embora desse lugar
Para São Paulo trabalhar
Comprar uma roupa aprumada
E arranjar uma namorada
Na hora que eu voltar.
Em casa com sua família
Cheio de pantim e lundu
Num gostava de angu
Mas a pulso ele comia
No almoço todo dia
Ai começou a falar:
Pois quando eu vortar
Vou te contar um negóço
Num vou cumer esse troço
Quero que vá si daná.
A Mãe calada ficou
Mas a cara tava feia
Disse: tu merece uma peia
Foi assim que tu se criou
Teu pai muito trabalhou
Pra plantar milho e feijão
Sem ganhar nem um tostão
E se não fosse o angu
Num existia nem tu
Inriba desse desse sertão.
Ailto se despediu
Deu adeus e foi embora
Passou seis anos lá fora
Vendo o que nunca viu
E desde quando saiu
Comia só macarronada
Risoto, lasanha, salada
Fazendo o que queria
Até que chegou o dia
De voltar pra terra amada.
Na hora do almoço chegou
Manhã de quentura imensa
Tomou aos seus pais a bença
As coisas num canto botou
Aí, depois perguntou:
O que vai ter pra comer?
Ailto assim quis saber
Daí a mãe veio avexada
Trazendo uma pratada
E o caba fingiu esquecer.
Disse: quer isso, gente?
Oloco! Num tô lembrado
Aí a mãe pegou um bocado
E sacudiu nos seus dentes
Ailto: Oxe! Que angu quente!
Sua mãe: Ah! Tu te lembra?
Marminino, te emenda
Que num sou tua pariceira
Num venha cum brincadeira
Que quebro teu pau da venta.
Ailto comeu sem reclamar
Sem pantim e sem muído
Pra livrar o pé do ouvido
Que a mãe ia quebrar
Num adianta reclamar
A mãe sempre tem razão
Se voltou pro teu torrão
Deixe o orgulho de lado
Se não gostar, fica calado
Mas num invente besteira não.
Quem me dera eu voltar
Pro lugar que fui criado
Ganhar da mãe um agrado
E ela me abençoar
Aí, eu valorizar
Tudo que mãe disse pra mim
Pai também falou assim:
- Não se iluda cum amigo
Que na hora do perigo
Só nós ficamos até o fim.