O DIA QUE MARIA BONITA FOI FERIDA EM COMBATE
O cangaço fez história
Nas quebradas do sertão
Mais caracterizado
Na era de Lampião
Pois de tudo se fazia
E subgrupos geria
Uma organização.
Os modos de Lampião
Condenava covardia
Quando queria assaltar
Sempre avisava que ia
Dessa forma os mais sensatos
Esperavam pelo assalto
E os mais fracos fugia.;
Foi num desses que Maria
Andou perto de morrer
Quando alguns comerciantes
Atiraram pra valer
Quando foram avisados
Que iam ser assaltados
E foram se defender.
Lampião mandou dizer
por um pobre capiau
Ao povo do povoado
Serrinha do Capiau
Se não mandasse dinheiro
Juntaria os cangaceiros
E iam tomar no pau.
Serrinha do Catimbau
Não tinha um grupamento
De polícia que o guardasse
Só tinha um velho sargento
Comissário aposentado
E um rifle enferrujado
Era todo o armamento.
No assombro do momento
Moradores se armaram
Para esperar os bandidos
Que invadir ameaçaram
Na entrada do povoado
Um pequeno grupo armado
Por Lampião esperaram.
Os cangaceiros chegaram
No meio da escuridão
Tocaiados pressentiram
Miraram na direção
E dispararam aflitos
Em seguida ouviram gritos
E o som de um baque no chão.
Correram na escuridão
Tentando salvar a vida
Os cangaceiros também
Abriram fogo em seguida
De atirar só pararam
Quando por fim encontraram
Maria Bonita ferida.
Cangaceiro não revida
Quando um é baleado
Não morreu no tiroteio
E precisa ser cuidado
Agora o imprecindível
Era fazer o possível
Pra não ser mais alvejado.
Na casa de João Cacheado
Os valentes se esconderam
Bem próximo ao tiroteio
Que antes aconteceram
Noite escura os cangaceiros
Estavam ali sorrateiros
E outros não perceberam.
Alguns do bando correram
Em outro arraial que havia
A procura de uma rede
Para transportar maria
Pano e flocos de algodão
No meio da escuridão
Enquanto ela padecia.
Lampião viu que Maria
Foi ferida gravemente
E perdia muito sangue
Precisava urgentemente
Salvar a situação
Vencer a escuridão
Sair daquele ambiente.
Quatro matutos potentes
Vieram pra conduzir
Maria bonita na rede
Com o sangue a se esvair
Enquanto ela sofria
Sufocada não gemia
Para ninguém descobrir.
Também veio a se ferir
Com um tiro de raspão
Maria de Ema, outra moça
Mas aguentou o rojão
E pôde seguir andando
Em companhia do bando
No meio da escuridão.
Com chumaço de algodão
A ferida foi tapada
Enquanto eles carregavam
No escuro da madrugada
Com o bando prevenido
Lampião entristecido
E Maria desacordada.
Já quase noite findada
Mas longe ainda vinha o dia
Para o Riacho do Saco
Eles levaram Maria
Para curar seu flagelo
Perto do Serrote Belo
Onde casa não havia.
Acomodaram Maria
Embaixo de um umbuzeiro
E começaram a tratá-la
Com remédio cangaceiro
Remédio no mato tinha
E no bando sempre vinha
Um curador raizeiro.
Remédio de cangaceiro
Curaria Maria Déia
Pois o cangaço dispunha
De intensa farmacopéia
Pra curar homem e mulher
Com benzedura, com fé
Com opinião e idéia.
Para Maria de Déia
Prepararam uma bedida
Com raspa de quixabeira
Pra tirar dor em seguida
E um emplastro porreta
De pimenta malagueta
Para tapar a ferida.
Se continuasse doída
E não mostrasse melhora
Tinha que ser chá de pinto
Pra resolver sem demora
Chá de pinto decidia,
Ou o paciente morria
Ou melhorava na hora.
Chá de pinto é outra história
Resolve a situação
Pega-se um pintinho vivo
Coloca-se num pilão
Dentro de um recipiente
E esmaga-se inclemente
Sem dó e sem compaixão.
Amassado num pilão
Até se liquefazer
E folha de quixabeira
Colocada pra ferver
Coa-se aquela mistura
Depois de uma fervura
dá pra o doente beber.
O que pode acontecer
Depende da reação
Se o doente vomitar
É que houve circulação
Do sangue pelas artérias
Eliminando bactérias
E o doente fica são.
Mas se houver reação
Diferente do esperado
Se o baleado não vomita
O caso está complicado
Instaura-se preocupação
De encomendar o caixão
Que o baleado é finado.
Também deixa preocupado
Com o intestino atingido
Se houver cheiro de fezes
Se o doente está fedido
Já se pode preparar
A mortalha e encomendar
A alma do falecido.
Há um dito bem sabido
Pra não fugir do assunto
Se houver um baleado
O cangaço chega junto
No que sempre se falou:
Baleado fede a cocô
Também já fede a defunto.
Pra cidade de pé junto
Maria não viajou
Jovem, forte e saudável
Ela se recuperou
Em quatro dias somente
Estava forte o suficiente
E a ferida fechou.
Em seguida viajou
Com o bando de cangaceiros
Pela Serra do Tará
Desceu o despenhadeiro
E subiu com todo pique
Pela Serra do Baíque
Uma noite e um dia inteiro.
Um pequeno paradeiro
Para se recuperar
Porque setenta quilômetros
Teriam que cavalgar
Até chegar ao destino
Na casa de Zé Ausino
Onde ela ia ficar.
Zé Ausino, é bom falar
Um coiteiro camarada
Amigo de Lampião
Maria estaria guardada
E dali só sairia
Quando estivesse sadia
E totalmente curada.