LÍDIA - A MAIS BELA CANGACEIRA
Venho estudando o cangaço
Desde quando comecei
A escrever poesia
E sempre me deparei
Com histórias inusitadas
Verdadeiras, inventadas
E a todas versejei.
O primeiro que citei
Era um paraibano
Severino Sapiranga
Que assassinou um tirano
Pois sua irmã desonrou
Por isso ele a matou
E caiu no desengano.
Outro sujeito tirano
Que versei foi Cabeleira
Por causa de uma mulher
Foi morto na bagaceira
E outro que perdeu o crivo
Por esse mesmo motivo
O negro Lucas da Feira.
Meia Noite fez besteira
Por causa de uma parente
Apanhou tanto do tio
Que ficou de couro quente
E em casa só pôde entrar
Depois de assassinar
O coronel prepotente.
Corisco, muito valente,
Mas de mulher apanhou
Também por Maria Bonita
Lampião se apaixonou
Como dizia «os macaco»
O cangaço ficou fraco
Depois que mulher entrou.
Zé Baiano, o ferrador
Cabra da peste tirano
Depois que conheceu Lídia
Ficou fraco como pano
Abobalhado fazia
Tudo que ela queria
Pois ela era o seu plano.
Por falar em Zé Baiano
Neste cordel vou citar
A trajetória de Lídia
Uma beleza sem par
Que enveredou no cangaço
Arrastada pelo braço
Depois de se apaixonar.
Lídia, baiana exemplar
Alegre, dentes perfeitos
Cabelos pretos retintos
E corpo muito bem feito
Com apenas dezoito anos
Impressionou Zé Baiano
E entrou com ele no eito.
Zé Baiano satisfeito
Lhe dava o que ela pedia
E ela lhe respeitava
Pois ele a satisfazia
Por ser fiel companheira
Logo tornou-se parceira
De Dadá e de Maria.
O bando se surpreendia
Vendo o casal se amando
Pois Zé Baiano era um monstro
Feio de acordar chorando
E ela uma princesa
Bonita por natureza
Era a mais linda do bando.
Mesmo assim feio e nefando
Parece que ela gostava
Preto, de cara chupada
A fealdade compensava
Com presentes valiosos
Pulseiras, vestidos novos
E isso a ela interessava.
Os outros a respeitava
Mesmo bela e elegante
Pois Zé Baiano era bravo
Valente e ignorante
E matava sem piedade
Quem tirasse liberdade
Com a sua bela amante.
Zé Baiano, comandante
De uma corporação
Chamada de sub grupo
No bando de Lampião
Vez em quando viajava
Pois era quem transportava
As armas e munição.
Todos sabem que a traição
Nem Jesus Cristo livrou
Pois tinha um judas no bando
Que muito e muito tramou
Tal a serpente com Adão.
Foi tanta bolinação
Que a Lídia conquistou.
Zé Baiano viajou
Para outra região
Ao mesmo tempo Corisco
Se uniu com Lampião
Maria Bonita e Dadá
Felizes em se encontrar
Fazem comemoração.
Corisco mais Lampião
Eram os chefes principais
De todos os sub grupos
Por aqueles carrascais
Corisco tinha liberdade
De exercer autoridade
Mas Lampião tinha mais.
No cangaço um rapaz
Galego, alto, bonito
No bando recém-chegado
Por nome de Benedito
Por Ben-te-vi alcunhado
Alegre e muito educado
Mas era um tanto esquisito.
Ben-te-vi ou Benedito
Era muito interesseiro
Vez em quando dava em cima
Da mulher de um cangaceiro
Formando um terém tem tem
E sempre se dava bem
Pois era muito ligeiro.
A ausência do cangaceiro
Zé Baiano no pedaço
Ben-te-vi quando viu Lídia
Fez logo um estardalhaço
E terminou conquistando
A cangaceira e chifrando
Um dos chefes do cangaço.
Foi grande o estardalhaço
Dos dois pela capoeira
Todos alí comentavam
Que Lídia «furou fileira»
E fizera estrepolia
Mas ninguém se atreveria
Falar mal da cangaceira.
Numa dessas «saideiras»
Coqueiro presenciou
Quando Ben-te-vi e Lídia
Juntos no mato embicou
Seguiu os dois sorrateiro
Numa moita de pereiro
Viu quando o casal entrou.
Coqueiro se apresentou
E já foi logo dizendo
Que também queria fazer
O que eles tavam fazendo
Se num aceitasse seu plano
Contava pra Zé Baiano
O que estava acontecendo.
Lídia de raiva tremendo
Mandou que ele saísse
Que não deitava com ele
Por mais que ele insistisse
Nada ia acontecer
Pois preferia morrer
A fazer o que ele disse.
Coqueiro fez a tolice
De cumprir o que falou
Só esperou o momento
Que Zé Baiano chegou
Para em tom galhofeiro
Contar tudo ao cangaceiro
O que ele presenciou.
Zé Baiano se enfezou
Entrou logo em desespero
Lampião sabendo tudo
Matou o cabra Coqueiro
Pois ele não aceitava
No bando que comandava
Dedo duro cangaceiro.
No meio desse foveiro
Ben-te-vi se escafedeu
Lampião não o matou
Que o cabra que se envolveu
A Corisco pertencia
E somente ele podia
Julgá-lo do modo seu.
Zé Baiano entristeceu
Sofrendo em desespero
Pegou Lídia e amarrou
No tronco de um umbuzeiro
Passou a noite amarrada
Chorando desesperada
Sob chuva e nevoeiro.
Sabia que o companheiro
Nunca a perdoaria
Chorando pedia ajuda
De Dadá e de Maria
Mas elas não ajudavam
Pois também não concordavam
Com o que ela fazia.
Quando amanheceu o dia
Zé Baiano atormentado
Matou Lídia a pauladas
Deixou-lhe o corpo quebrado
Sofreu com sua desdita
Vendo a mulher tão bonita
Com o corpo desfigurado.
Cavou uma cova ao lado
De onde ele a matou
Diante dos companheiros
Ali mesmo a sepultou
Pois uma cruz com amargura
E sobre a sepultura
Uma semana chorou.
Só então se conformou
Seguindo o destino seu
Saiu batendo a poeira
E de Lídia se esqueceu
No seu infortúnio incréu
Continuou mais cruel
Do que quando a conheceu.
Foi assim que aconteceu
Com aquela mulher tão bela
Não soube valorizar-se
E caiu na esparrela
Essa era a lei do cangaço
Outras tiveram fracasso
Como aconteceu com ela.
Quanto ao amante dela
O bonitão Ben-te-vi
Aprontou a confusão
E se escafedeu dali
Pois cangaceiro vivido
Quando era perseguido
Também sabia fugir.
Anos depois Ben-te-vi
Surgiu como sapateiro
Chamado de Benedito
Deixou de ser cangaceiro
E o cangaço do passado
Também já tinha acabado
No Nordeste Brasileiro.
Aquele seu entrevero
Foi lá pelo Pernambuco
Quando ele escapuliu
No meio do vuco vuco
Viveu sem estripulia
E em Carinhanha, Bahia
Morreu já velho e caduco.
Bahia e Pernambuco
Onde houve muita zueira
Por causa de cangaceiros
Que só fizeram besteira
Mas não tiveram vitória
E aqui termina a história
Da mais bela cangaceira.