MORENO - SOBREVIVENTE DO CANGAÇO
Um dos poucos que escaparam
Daquela carnificina
Que assassinou Lampião
E Maria numa chacina
Numa manhã de sereno
Foi o temível Moreno
O marido de Durvina.
A Providência Divina
Modificou os seus planos
Livrando-o daquele fogo
Nos carrascais sergipanos
E lhe consentiu vitória
Para contar sua história
Até completar cem anos.
Nos regimes desumanos
Da caatinga nordestina
Nascera José Antônio
Para cumprir sua sina
Perigoso igual veneno
Conhecido por Moreno
O marido de Durvina.
Segundo o historiador Lima
Moreno se destacou
Na história do cangaço
Por ser um que escapou
Daquela perseguição
Que vitimou Lampião
Quando a polícia o matou.
Numa vila do interior
José Antônio nasceu
De origem pernambucana
Segundo alguém escreveu
Viu muito cedo o fracasso
E adentrou no cangaço
Seguindo o destino seu.
Na caatinga apareceu
Com o bando de Virgínio
Cunhado de Lampião
Que era um chefe ferino
Mas era um bom companheiro
E as tramas de cangaceiro
Ensinou tudo ao menino.
Moreno que era mofino
Tornou-se um homem valente
Brigando no corpo a corpo
Não temia oponente
Atirador de primeira
E correndo na capoeira
Enfrentava a terra quente.
E sendo um homem valente
Conquista a compreensão
De Virgínio, de outros chefes
E até de Lampião
Que muito nele confiava
E às vezes o mandava
Em uma ou outra missão.
Numa certa ocasião
Houve intenso tiroteio
Com cangaceiro e macaco
O espernegue foi feio
Muitos na terra tombaram
E entre os mortos que ficaram
Virgínio estava no meio.
O troço ali ficou feio
Pra cangaceira Jovina
Companheira de Virgínio
Na caatinga nordestina
Que mesmo sem ter morrido
Com a morte do marido
Encerrava sua sina.
Pois a lei era ferina
E não ia ser mudada
Se o marido morresse
A mulher era obrigada
A ter outro cangaceiro
Pois mulher sem companheiro
Era logo assassinada.
Lampião chama a cambada
Pra decidir o destino
De Jovina que perdera
O companheiro Virgínio
Que em luta com a polícia
Perdeu a sua malícia
De modo bem severino.
Já prevendo o seu destino
A mulher entristeceu
Moreno que era sozinho
Então se comprometeu
Tomá-la por companheira
O destino da cangaceira
Se unir ao destino seu.
Tudo ali se resolveu
Dentro da lei nordestina
Moreno juntou os trapos
Com os trapos de Jovina
E terminando a novela
Mudou até o nome dela,
Passou a chamá-la Durvina.
Na caatinga nordestina
Esse casal fez valer
Ela ainda foi baleada
Mas veio a sobreviver
Enquanto ele lutou
Vinte ainda matou
Sem nenhum tiro sofrer.
Por esse seu proceder
Ágil na faca ou fuzil
Atrás de capturá-lo
Na caatinga mais de mil
Soldados o procuravam
Muitos vezes o cercavam
Porém nunca conseguiu.
Quando a notícia surgiu
Da morte de Lampião
Todos pensavam encontrá-lo
Estirado pelo chão
Mas ele com a companheira
Se arrastando na capoeira
Conseguiram a salvação.
Se arrastando pelo chão
Com Durvina e outros mais
Se espetando nos espinhos
Rolando nos carrascais
Da polícia perseguido
Escapou sem ser ferido
Fugiu pra Minas Gerais
Não quiseram voltar mais
Pra continuar no cangaço
Mas antes do acontecido
Fez bastante estardalhaço
Pois era bom na peixeira
No tiro e na capoeira
Também era bom no laço.
Até chefe no cangaço
Ele teve essa alegria
Pois com a morte do cabeça
Do bando a que ele servia
Sua maneira de atuar
Fez de Virgínio herdar
A mulher e a chefia.
Sempre que seu bando agia
Nas caatingas do sertão
Ele vinha prestar contas
Ao chefe Lampião
A quem devia respeito
Mesmo assumindo a seu jeito
De um grupo a direção.
Com a morte de Lampião
Seu bando se dizimou
Muitos dos que escaparam
À Justiça se entregou
Mas Moreno com Durvina
Na caatinga nordestina
Dois anos perambulou.
Muitos vezes se ocultou
Para não ser apanhado
Formar bando não queria
Por se sentir acuado
Sua única opção
Era deixar a região
E fugir pra outro Estado.
Viajando disfarçados
Como um casal de roceiros
Caminharam muitos dias
Por serras e tabuleiros
Até encontrar estima
Na vila de Augusto Lima
Já no Estado mineiro.
Trabalhando de vaqueiro
Em uma propriedade
E a mulher de cozinheira
Fizeram boas amizades
Os filhos foram nascendo
Tudo se desenvolvendo
Pra sua felicidade.
Trocaram a identidade
Para esquecer o passado
Jovelina Conceição
Não podia ser citado
Ela passa a se chamar
Durvalina Gomes Sá
Tá nos livros registrado.
Meio século passado
Mudam para a capital
A família já criada
Vive uma vida normal
Sem saber que no passado
Os pais foram procurados
Em escala nacional.
Dois mil e cinco afinal
Eles resolvem contar
Sua verdadeira história
E a razão de ocultar
A família precisava
Pois o fim se aproximava
Sem nada eles suspeitar.
Começaram lhes contar
Desde o tempo de Virgínio
Dos filhos que eles tiveram
No cangaço nordestino
Por eles nunca esquecidos
E por fim foram perdidos
Em busca do seu destino.
Com a morte de Virgulino
O temível Lampião
Foram enfim perdoados
Não há mais perseguição
Viveram muito adorados
E em vez de condenados
Eles viraram atração.
Cumpriram sua missão
Lá mesmo em Minas Gerais
Cidade Belo Horizonte
Estão seus restos mortais
Moreno primeiro foi
E pouco tempo depois
A Durvina foi atrás.
Grande lembrança nos traz
Esse nome do passado
José Antônio de Souto
Que muito debilitado
Morre aos cem anos de idade,
Cemitério da saudade
Seu corpo foi sepultado.
Viveu com o nome trocado
Com medo de sururu
Antônio Inácio da Silva
Nascido em Tacaratu
Estado pernambucano
No vale sãofranciscano
Mas fora do pajeú.
Vendeu farinha e beiju
Vivendo como homem honrado
Na vila de Augusto Lima
Antes de ter se mudado
Para a capital mineira
Esquecendo a capoeira
Onde viveu no passado.
Deixa à família um legado
Do cangaço, cuja história
De luta por seu direitos
E justiça sem vitória
Conseguiram exterminar.
Chaga que não sairá
Nunca de nossa memória.