DURVINA - SOBREVIVENTE DO CANGAÇO

No cangaço nordestino

Muitas mulheres sofreram

Umas por vontade própria

Na caatinga se perderam

Algumas seviciadas

Outras foram baleadas

E muitas delas morreram.

Houve as que sobreviveram

Para contar a história

Com o tempo foram morrendo

Perpetuando a memória

Praticou carnificina

Sobreviveu da chacina

Como a que descrevo agora.

Segundo conta a história

Uma bonita menina

Nascida em Arrasta-pé

Com o nome de Jovina

Maria da Conceição

Se agregou a Lampião

Na caatinga nordestina.

A sua história termina

No século vinte e um

Mas pelo século vinte

Houve muito zum, zum, zum

Com ela estando envolvida

Sabendo que aquela vida

Não leva a lugar nenhum.

Era o seu lugar comum

O interior da Bahia

Povoado Arrasta-pé

Distrito que pertencia

A vila Curral dos Bois

Que Paulo Afonso depois

Assim se emanciparia.

No ano quinze nascia

E viveu naquele chão

Bonita que parecia

Uma deusa do sertão

Com apenas catorze anos

Iludiu-se com os enganos

De um cabra de Lampião.

O cangaço no sertão

Praticava desatino

Com um grupo fora da lei

Chefiado por Virgulino

Jovina deixou os pais

Chorando e correu atrás

Do cangaceiro Virgínio.

Na caatinga, sol a pino

Cumpriu a sua missão

Com o cangaceiro Virgínio

Cunhado de Lampião

Com ele teve dois filhos

Que deixava pelos trilhos

Nas quebradas do sertão.

Pra cangaceira a missão

Era parir e deixar

Os filhos abandonados

Para coiteiros criar

Assim uns sobreviviam

E muitos deles morriam

Sem os pais os procurar.

Na caatinga a guerrear

Ninguém tinha liberdade

Assim Virgínio morreu

Lutando em desigualdade

Com uma volante que vinha

Deixou Jovina sozinha

Aos dezesseis de idade.

A lei da severidade

No cangaço imperava

Mulher só permanecia

Se a um homem acompanhava

Porém se acontecesse

Que o cangaceiro morresse

Logo os outros a matava.

Assim Jovina estava

Já condenada a morrer

Ainda na flor da idade

Sem ninguém pra lhe valer

Mas Lampião ofertou

Moreno se interessou

Disse: - Eu fico com você.

Aí começa a viver

Novamente outra rotina

Perseguida das volantes

Na caatinga nordestina

Driblando a fome e a secura

Com farinha e rapadura

Numa vida severina.

O seu nome de Jovina

Pouco a pouco foi perdendo

Com o nome Durvalina

Passou a viver correndo

Pra Moreno era Durvina

E o nome de menina

Ela findou esquecendo.

Filhos continuou tendo

Com Moreno foram seis

Uns nascidos na caatinga

Como se fosse uma rês

Que se criasse perdida

Somente no fim da vida

Os viu a primeira vez.

Entrava e saía mês

E ela sempre lutando

Com saudade da família

Na caatinga vagueando

Sempre com Moreno ao lado

Mas com a mente no passado

De Virgínio relembrando.

Certa vez se confrontando

Numa batalha sangrenta

Sofreu um tiro na coxa

Que ela quase se arrebenta

Os cangaceiros tiraram

A bala e lhe curaram

Com emplastro de pimenta.

Nessa jornada cruenta

Com Moreno no sertão

Ainda viveu dois anos

De susto, perseguição

Fanatismo e fantasia

Até que chegou o dia

Da morte de Lampião.

Se arrastando pelo chão

Com Moreno e outros mais

Se espetando nos espinhos

Rolando nos carrascais

Da polícia perseguida

Conseguiu sair com vida

Fugiu pra Minas Gerais.

Não quiseram saber mais

Do circuito cangaceiro

Caminharam muitos dias

Enfrentando o tabuleiro

Até encontrar estima

Na vila de Augusto Lima

Sendo no norte mineiro.

Trabalhando de vaqueiro

Moreno se fixou

Durvina na vizinhança

Amizades conquistou

Os filhos foram nascendo

Tudo se desenvolvendo

Assim o tempo passou.

Nunca ninguém questionou

A respeito do passado

Quem era aquele casal

Por ali tão estimado

Ela passa a se chamar

Durvalina Gomes Sá

Tá nos livros registrado.

Meio século passado

Mudam para a capital

A família já criada

Leva uma vida normal

Sem saber que no passado

Os pais foram procurados

Em escala nacional.

Dois mil e cinco afinal

Eles resolvem contar

Sua verdadeira história

E a razão de ocultar

A família precisava

Pois o fim se aproximava

Sem nada eles suspeitar.

Começaram lhes contar

Desde o tempo de Virgínio

Dos filhos que ela tivera

No cangaço nordestino

Por ela nunca esquecidos

E por fim foram perdidos

Em busca do seu destino.

Da morte de Virgulino

O temível Lampião

Enfim foram perdoados

Não há mais perseguição

Viveram muito queridos

E em vez de perseguidos

Eles viraram atração.

Cumpriram sua missão

Lá mesmo em Minas Gerais

Cidade Belo Horizonte

Estão seus restos mortais

Fica aqui esta memória

Do cangaço, cuja história

Grande lembrança nos traz.

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 07/11/2021
Código do texto: T7380769
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