O GATO DE BOTAS

Escrevo nos meus cordéis

Histórias bem variadas

Da escravidão, do cangaço,

Adivinhações, piadas,

Poesias e pensamentos

Estórias de encantamentos,

Lendas e Contos de fadas.

As histórias de caçadas

Narradas por caçador,

Em parcerias com amigos,

Desafio com cantador,

Pra transformas em poesia

Toda história tem valia,

Depende de quem contou.

Cordelista, cantador

Também gostam de anedotas

Mas chega de vender peixe

E dizer tantas lorotas;

Vou mostrar pra criançada

Mais uma fábula encantada

Chamada O GATO DE BOTAS.

Já existem outras notas

Em cordel, pra ser sensato,

Sobre esse gato de botas

Não sei o número exato

Nem o autor da criação,

Mas faço a minha versão

Da sua história, de fato.

Era uma vez um gato

Que tinha um belo porte

Travesso como ele só

Porém era muito forte

Seu dono era um homem pobre

Mas sua atitude nobre

Ao amo deu muita sorte.

Estando à beira da morte

Chamou sua família ordeira

Pra dividir o que tinha

Conseguido a vida inteira,

Coisa pouca, empobrecida,

Porque pobre nessa vida

Vive sem eira nem beira.

A sua herança inteira

Era um gato, um jumento,

Também um velho moinho

De onde tirava o sustento

Com o jumento, de fato,

Mas quem ficasse com o gato

Não teria rendimento.

Ainda não era o momento

Pra ninguém se lamentar

Todos sabem que nas fábulas

Animais podem falar

Então não foi diferente

Com o tal gato inteligente,

Veja o que foi aprontar!

Os irmãos a combinar

Como sobreviveriam

Um fabricava farinha

Outro a entregaria

Transportando no jumento

Assim ganhavam o sustento

E todos escapariam.

O gato, sem serventia

Ficou com o mais novo irmão

Aquele gato travesso

Pra nada tinha função

Só se fosse pra morrer,

Com o couro um tambor fazer

E com a carne uma refeição.

«Tenha calma, meu patrão,

- Disse o gato com alegria -

Me empreste suas botas

E uma sacola vazia

Que eu lhe trarei conforto,

Pra nada lhe sirvo morto,

Vivo eu tenho serventia.

Quando o destino nos guia

Ninguém mais pode mudar,

Eu nasci pra te dar sorte,

Tudo vai se acomodar,

Tenha fé e esperança,

Só lhe peço confiança

Porque um jeito eu vou dar.»

O irmão caçula a pensar

Não teve outra opção

Tinha que atender ao gato

Em sua solicitação

Pois ali ele era o fraco,

Pegou chapéu, bota e saco

E entregou em sua mão.

O gato feliz, então,

Tinha o que era preciso

Agradeceu ao seu dono

Expressando um sorriso

Saiu cheio de aparato.

Vendo a astúcia do gato

Seu dono fez ar de riso.

O gato, muito conciso,

Adiante entrou num pomar

Encheu o saco com cenoura

Pra poder trapacear

Com um ardil já traçado,

Um coelho desavisado

No saco iria entrar.

Um grande coelho ao passar

Cheio de curiosidade

Viu as cenouras no saco

Foi ver sera verdade

Nessa mesma ocasião

O gato puxou o cordão.

Achei isso uma crueldade!

O gato diz com vaidade:

«Primeiro passo eu já dei.

Agora devo levá-lo

De presente para o rei,

Chego e digo, Vossa Alteza,

Trago-lhe uma surpresa!

Ele gostará que eu sei.»

Foi dizendo: «Senhor Rei,

Meu honorável senhor,

O Marquês de Carabás,

Que é um homem de valor,

Mandou-lhe honradamente

Este coelho de presente.

É graúdo e tem sabor!!

O rei muito se encantou

E mandou agradecer.

«Que ele venha conhecer-me,

Eu terei muito prazer

E me traga outra surpresa.

Com tamanha gentileza

A amizade vai crescer.

O gato fez com prazer

Armadilhas de caçar

Capturou duas perdizes

E ao rei foi presentear.

Como da primeira vez

Foi em nome do marquês

Para a amizade durar.

O rei iria passear

Ao longo do seu reinado

E andava até pelas terras

Do outro reino encostado

Pois isso sempre fazia,

E toda vez que saía

Levava a filha de um lado.

O gato foi informado

E agiu com sangue frio

Sabia que o rei passeava

Lá pelas margens do rio

Sorriu de satisfação,

Era a vez do seu patrão

Demonstrar seu grande brio.

Chamou seu dono e saiu

Dizendo: «Mestre, é agora

Faça tudo que eu disser,

Aja logo, sem demora,

Pobreza não tem mais vez,

Incorpore o marquês

Que é chegada a sua hora!»

E saíram estrada a fora

Até as margens do rio

O gato com sua astúcia

O dono com o seu brio

Escabriado, de fato

Mas confiante no gato

Aceitou o desafio.

O amo entrou no rio

Ao gato obedecendo

Sem roupa, desconfiado,

Com o que estava acontecendo

Mas já estava envolvido

E o gato fora, escondido,

A sua trama tecendo.

Nisto foi aparecendo

A carruagem real

O rei com a sua filha

Num passeio informal

O gato grito: «Ajuda!

Socorro! Alguém me acuda!

O meu marquês está mal!»

Da carruagem real

Ouviram o gato gritando:

«Ajudem-me, por favor!

Ele está se afogando!»

Os guardas da carruagem

Desceram até a margem

E foram logo ajudando.

O rei mais perto chegando

Ao gato reconheceu

«É o portador dos presentes

Que o marquês me remeteu!»

Lembrou-se das gentilezas

E ali, cheio de surpresas

De pronto intercedeu.

Um dos soldados desceu

Para tirá-lo do rio

O esperto gato disse:

«Ele está com muito frio

Pois por ladrão de estrada

Teve sua roupa roubada

Nesse ambiente sombrio!»

O rei, na margem do rio,

Dispôs-se a ajudar

Mandou logo seus soldados

Ir no palácio buscar

Uma roupa real quente,

Algo que fosse decente

Pra o marquês poder usar.

Depois dele se trajar

Com tamanha elegância

A princesa apaixonou-se

Ao ver tanta exuberância

Em um homem tão garboso,

Tão belo, tão venturoso

E com dinheiro em abundância.

Havia ali uma estância

De horizonte verdejante

Uma plantação de milho

De um verde muito vibrante

Em todos os arredores

O gato aos trabalhadores

Coagiu naquele instante.

Vai passar um viajante

Aqui pela redondeza

É um rei bem poderoso

Com sua filha princesa

E o Marquês de Carabás

Vem um pouco mais atrás,

Tratem bem a realeza.

Se o rei ou a princesa

Por acaso perguntar

De quem é tanta fartura

Que existe neste lugar

Digam que é do Marquês,

Assim vocês terão vez

E todos vão se salvar.»

A terra e todo lugar

Onde o povo trabalhava

Era de um ogro mau

Que a todos escravisava

Nada ali se recebia

E se houvesse rebeldia

De algum, o ogro matava.

O gato não se importava

Não ia se intimidar

Depois tratava com o ogro

Primeiro ia tratar

Com todos os seus escravos,

Tinha que ser forte e bravo,

Não podia fraquejar.

«Aqui vai se transformar

Em uma fartura de grãos

Que serão distribuídos

Com vocês e seus irmãos,

Se por acaso um negar

E a história não confirmar,

Eu cortarei suas mãos.»

Com medo de punição

Atenderam seu pedido,

O gato foi mais adiante

Repetiu o ocorrido

Desta vez ameaçando

Quem estava trabalhando

Num lindo campo florido.

Que gato mais atrevido!

Repetia no vergel:

«Digam que as terras pertencem

Ao mestre a quem sou fiel

E não façam reboliço.

Se vocês fizerem isso

Livro-os do ogro cruel.

Sou amargo como fel

Quando encontro falsidade.

Agora vou tomar posse

Da nossa propriedade.»

O gato com eloquência

Usou sua inteligência,

Não teve temeridade.

Num gesto de insanidade

Foi ao ogro visitar.

«Permita-me, senhor ogro,

Em seu castelo adentrar,

É que ouvi, por ventura,

Que em qualquer criatura

Consegues se transformar...»

Ogro, para confirmar

Transformou-se num leão

Disse o gato: «Parabéns!

Mas tenho convicção,

Isso ficou bem patente,

Que em bicho grande somente

Consegue a transformação.»

Ogro disse: «Isso não!

Pois agora eu vou mostrar.»

E logo em um ratinho

O ogro foi se transformar

Naquele momento o gato

Pulou em cima do rato

E o conseguiu devorar.

Nesse instante viu chegar

O rei que logo adentrou

Com a sua carruagem,

O gato então lhe falou:

«Pertence isso e muito mais

Ao Marquês de Carabás

Que a majestade ajudou.»

O marquês quase chorou

Quando tudo aconteceu

Um castelo tão bonito

E agora era tudo seu,

Lembrou da herança deixada

Que não valia de nada

E ao gato agradeceu.

Ele que era um plebeu

Agora era um potento,

Ali, diante do rei,

Aproveitou o momento

Para atrever-se a pedir

Se o rei lhe consentir

A princesa em casamento.

Cheio de contentamento

O rei logo consentiu

A princesa apaixonada

De alegria sorriu

Houve casamento, festa,

E ali, naquela floresta,

Pra sempre a paz existiu.

O bom marquês consentiu

Aos escravos liberdade

Ficaram todos vivendo

Na sua propriedade

Os lindos filhos nasceram

E para sempre viveram

Com amor e felicidade.

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 05/11/2021
Código do texto: T7379403
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